O dia começava a clarear quando Lucimara Ferreira da Silva, 26 anos, sentiu as primeiras contrações. A jovem acreditava que estaria sozinha na hora do parto, já que o companheiro, Gabriel Felipe Sacht, 21 anos, cumpria pena na Penitenciária Industrial de Joinville. Entretanto, dias antes do nascimento – registrado em 15 de outubro –, o reeducando recebeu o beneficio de saída temporária de sete dias. Depois de quase dois anos foi a primeira vez que pisou fora dos pavilhões da unidade prisional. O que ele não sabia é que a saída teria outra primeira vez: a de realizar o parto do próprio filho.
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— A primeira pessoa que ele viu e que segurou ele no colo neste mundo fui eu. Foi o momento mais emocionante da minha vida e me fez acreditar ainda mais na minha mudança — conta o jovem, segurando firme na mão do filho.
A saída temporária assinada por João Marcos Buch, juiz da Vara de Execuções Penais, aconteceu no período em que Lucimara estava quase ganhando a criança. Com o sorriso largo, o apenado conta que estava esperançoso em acompanhar o nascimento do filho, mas não imaginava que seria ele quem auxiliaria a esposa a trazer Gabriel Junior a este mundo.
Como não conseguiu acompanhar o crescimento do primeiro filho, porque já estava cumprindo pena por tráfico de drogas e roubo, a situação se tornou motivação para nutrir a chance de uma nova vida.
Trabalho de parto foi rápido
No dia do nascimento, Lucimara começou a sentir as primeiras dores do parto quando o relógio marcava 5h15. Ela foi tomar um banho para se preparar, enquanto o marido arrumava a bolsa dela e do bebê para ir à maternidade. Como a família mora há cerca de 12 quilômetros da unidade, no bairro Paranaguamirim, na Zona Sul, o jovem ligou para o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para auxiliá-los.
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Os médicos informaram que demoraria cerca de três horas para o bebê nascer e começaram a repassar informações iniciais para ajudar o casal com as primeiras contrações. Mais tranquilo com as instruções, Gabriel continuou arrumando a mala, mas Lucimara saiu do banho com dores mais intensas do que antes. Minutos depois, a bolsa estourou e o nervosismo recomeçou porque a mãe só conseguiu dizer “ajuda, porque acho que o nosso filho está nascendo”.
— Ela se sentou na cama porque estava com muita dor. Quando eu olhei, já vi a cabeça do bebê saindo e os cabelinhos. Eu disse que não sabia o que fazer, mas que iria me doar ao máximo porque ele é meu filho. Foi quando fiz o parto, com o maior cuidado do mundo — conta o jovem.
Desde as primeiras contrações até o primeiro choro do bebezinho foram cerca de 50 minutos. Por volta das 6h15min, os médicos do Samu chegaram até a casa do casal, cortaram o cordão umbilical do recém-nascido e levaram mãe e filho para a maternidade. Já Gabriel, depois de cumprir os sete dias do benefício e de ajudar no parto, voltou ao cárcere.
Uma nova chance
Durante o tempo em que esteve na Penitenciária, Gabriel conta que adoeceu e via poucas esperanças na vida fora da prisão. A luz no fim do túnel veio quando soube da gravidez e começou a acompanhar crescimento do bebê na barriga de Lucimara durante as visitas semanais à unidade prisional. Segundo ele, a cada dia era possível perceber o desenvolvimento do filho.
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— Eu vi a luta diária dela durante a gravidez, de às vezes não ter dinheiro para comer e ainda assim não me abandonou na cadeia. Agora quero fazer o melhor por ela e pelo meu filho.
Enquanto cumpria a condenação, o reeducando costumava comparar o tamanho do bebê com coisas palpáveis para se sentir mais próximo da família e manter o foco no futuro – nos primeiros meses imaginava um grão de areia, passando pelo tamanho de um limão até a fase final que equiparava com uma melancia. Dias depois da saída temporária em que ajudou no parto, Gabriel recebeu a notícia de que sairia em prisão domiciliar.
Em 13 de novembro, recebeu o benefício. A decisão se baseou em artigos do Estatuto da Primeira Infância, da Lei de Execuções Penais e do Código de Processo Penal que preveem a concessão de prisão domiciliar quando o reeducando é imprescindível aos cuidados especiais de menores de seis anos ou com deficiência.
A determinação estipula que o jovem fique recolhido em domicílio em período integral, podendo sair somente para acompanhamento e tratamento de saúde dele e do filho.
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Agora, o pai aguarda decisão do processo sobre a progressão de regime para o aberto que pode acontecer em janeiro. Caso a progressão seja favorável, Gabriel já faz planos de começar a trabalhar.
— Eu queria que a sociedade desse uma oportunidade, uma chance para os ex-presidiários. Eu acredito em mim e quero mostrar para todos que uma pessoa que passou pela prisão pode, sim, mudar — conclui.