Antes de completar uma semana no cargo, o prefeito Gean Loureiro (PMDB) gerencia a tentativa de pagamento de duas folhas de servidores – dezembro e janeiro -, elabora textos de projetos de lei para encaminhar à Câmara de Vereadores, vive a ameaça de greve do funcionalismo, busca reduzir custos e ampliar a arrecadação municipal, além de se inteirar da real situação da máquina pública e do que pode ser feito para tirar Florianópolis da “calamidade” financeira em que se encontra.
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Devido aos desafios imediatos de sua gestão, o pemedebista ainda não se debruçou como gostaria sobre assuntos importantes da cidade, tal qual a elaboração do Plano Diretor e a cobrança da dívida ativa do município – que tem a receber cerca de 1,5 bilhão em impostos.
Ele informa que não terá condições de quitar até a próxima quarta-feira o restante dos salários, pensões e aposentadorias dos servidores, que podem entrar em greve a partir de 11 de janeiro.
Gean afirma que o período de transição foi marcado por informações desencontradas e contraditórias da administração anterior de Cesar Souza Junior (PSD). Isso justificaria o espanto da nova administração, com dívidas que seriam superiores a R$ 1 bilhão, mais de metade dela em compromissos que têm de ser pagos ainda em 2017. O prefeito prometeu mostrar as planilhas detalhando os débitos até a próxima semana.
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Ainda em recesso parlamentar na Câmara, Gean garante que solicitará uma sessão extraordinária ainda em janeiro para discutir os pontos da reforma administrativa. Ele pede compreensão da oposição no Legislativo para a aprovação de projetos polêmicos, que, segundo ele, vão “destravar” a economia, e avisa que a partir delas virá o retorno do crescimento na Capital. A seguir, trechos da entrevista concedida no programa Palavras Cruzadas, da CBN Diário.
Salários dos servidores
“Depositamos para os aposentados até o limite R$ 3,5 mil nesta sexta-feira (6). Tínhamos uma dificuldade porque a empresa que roda a folha parou de prestar o serviço por falta de pagamento de muitos meses. Conseguimos encaminhar para o banco e criamos uma equivalência dos salários pagos aos ativos e inativos. Para completar o restante dos salários, nós provavelmente vamos estudar um parcelamento, pagando inicialmente os menores salários e depois os maiores. No final de janeiro vamos pagar até R$ 5 mil, por exemplo. Em fevereiro, R$ 7 ou R$ 8 mil, depois até R$ 12 mil. Depois vai sobrar um número menor para daqui um período poder quitar totalmente a dívida do governo anterior. Vamos ter uma meta de arrecadação mensal de cerca de R$ 12 milhões nesse duodécimo da cota única do IPTU e trabalhar o pagamento de quase duas folhas em apenas um mês”.
Possibilidade de greve
“O sindicato se reuniu na última quinta-feira (5) para discutir uma possível greve. No meu ponto de vista, deixei muito claro, o momento é completamente inoportuno, porque com apenas três dias de administração, no quarto dia o sindicato se reúne para discutir uma greve, conhecendo a realidade financeira. Na verdade, isso deveria ter sido discutido na administração anterior, que não tomou medidas de responsabilidade fiscal para evitar a chegada até esse momento. Se o sindicato paralisar, nós não conversamos com o sindicato em greve. Nós só conversamos com o sindicato oferecendo e prestando o serviço a toda a sociedade. A sociedade não pode ser penalizada. Se isso acontecer, de maneira clara, nós vamos responsabilizar cortando a folha de quem parar. Até o dia 11, não temos condições de pagar os salários dos servidores”.
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Dívida a ser paga
“Os números da dívida na transição já eram contraditórios, até mesmo para vocês da imprensa. O ex-secretário da Fazenda falava uma coisa, e o ex-prefeito falava outra coisa. Acabou se concretizando muita coisa diferente, até mesmo entre o que os dois falavam. Eu confesso que eu não estou aqui para buscar a responsabilização da administração anterior. Isso aí os órgãos de controle vão fazer no momento adequado. Quando nós falamos de uma dívida de R$ 1,078 bilhão – e olha que ainda não conseguimos levantar serviços prestados que não foram empenhados -, ela é composta por dívidas de curto prazo e dívidas de longo prazo. As de curto prazo precisam ser pagas em 2017, por exemplo, o salário dos servidores, dos fornecedores – milhares que não são pagos há cinco, seis meses -, e a previdência – em 2016 nenhum mês foi pago. Essas dívidas giram em mais de R$ 500 milhões. O restante são dívidas de longo prazo, como o parcelamento da previdência que não foi pago nos anos de 2013, 2014 e 2015. Precatórias e financiamentos, que fazem a dívida chegar ao total de R$ 1,078 bilhão. Hoje, para botar a conta em dia, com uma folha salarial de cerca de R$ 70 milhões, eu teria que ter mais de sete folhas de pagamento para dizer ‘estamos começando do zero, só temos a dívida de longo prazo’. Não estou trazendo isso para dizer que não vou cumprir os compromissos de campanha, mas para mostra a gravidade da situação”.
Dívida a receber
“Cada secretaria tem um rol de projetos que busca dar eficiência, agilidade, redução de custeio e ampliação da arrecadação. A procuradoria é a responsável pela dívida ativa, que é uma dívida considerável, que gira em torno de R$ 1,5 bilhão. Uma parte dessa dívida é podre, sem condições de cobrar. Mas uma grande parcela dela tem condições de cobrar. Já estamos estudando um projeto que prevê inclusive o credenciamento de instituições financeiras que possam financiar essas dívidas de longo prazo para o devedor. Porque, às vezes, ele chega lá e a prefeitura só parcela em seis vezes. Ele não suporta, mas se é um financiamento de longo prazo… O importante é que a prefeitura receba o dinheiro e o contribuinte mantém vínculo com o banco, que tem esse controle. Também estamos estudando a hipótese de securitização da dívida, para que possamos receber um recurso imediato. Afinal de contas, o município hoje tem que estancar toda essa dívida estabelecida. E estamos até buscando agendar uma reunião com bancos internacionais, um banco francês, que financiam até a rolagem da dívida. Eu poderia daí financiar o pagamento dos fornecedores da prefeitura. Eu até confesso que tentei uma linha de financiamento para pagar os servidores, só que não existe uma única linha de financiamento para pagar pessoal”.
Possibilidade de passivo judicial com cortes
“As gratificações são designadas pelo prefeito municipal. A hora que eu exonero não tem o que questionar. Os supersalários, alguns têm o salário acima do subsídio do prefeito em razão de pareceres internos institucionais. Nós fizemos uma análise, consultando inclusive decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), e não se tem uma decisão final, porque isso das remunerações acima do teto ocorreu em vários municípios. As outras ações que vamos tomar serão com base em alterações legislativas. E vou adiantar algumas: em Florianópolis, uma hora extra realizada no período do final de semana ou à noite, o trabalhador comum ganha 50%, o servidor da prefeitura ganha 200%. São ações como essa que no momento atual temos que reavaliar”.
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Pacote de medidas na Câmara
“Os vereadores têm consciência da situação que o município vive. Não podemos mais pensar partidariamente, ‘eu sou situação, eu sou oposição’. Tem que pensar em resguardar a situação da cidade. Algumas sugestões são a redução da alíquota do ITBI, que pode ampliar a arrecadação. A identificação de uma conta única da prefeitura, para não ter uma conta com superávit e outra com déficit, e ter um controle maior de todos os fundos e da conta própria da prefeitura. Demos a sugestão da possibilidade de desapropriação por outorga, para viabilizar algumas obras importantes – elevado do Rio Tavares e duplicação da Edu Vieira. A extinção de gratificações de autoridade especial, que o município chegou ater 880 servidores recebendo isso como uma possibilidade de custeio. São projetos que a administração anterior resolveu encaminhar em um único projeto de lei. Houve um questionamento da Câmara, mas nós não tivemos intervenção para aprovar ou não aprovar, até porque era uma Câmara que já estava de saída. Nós já estamos conversando com os vereadores, e a nossa ideia durante a semana é discutir isso, apresentar durante uma coletiva com os vereadores esse pacote de salvação do município. Vai ser uma série de medidas, às vezes simples, mas que dão impacto à arrecadação. Vamos convocar uma sessão extraordinária agora em janeiro, isso é atribuição minha. A Câmara pode decidir a favou ou contra o meu pedido. A decisão é dela. Cabe ao Executivo e à sociedade mostrar à Câmara a importância dessa aprovação. Ou Florianópolis aprova o pacote de contenção de despesas, o pacote de busca de ampliação de recursos, ou a cidade não vai ter mais capacidade de investir e nem de manter. Hoje, a previsão do ano é ter uma arrecadação de R$ 1,3 bilhão, só que apenas a folha de pagamento chega próximo a R$ 1 bilhão. Se eu fechar a porta da prefeitura, nenhum servidor entrar na prefeitura, eu não consigo manter a prefeitura. Na reforma, também vamos reduzir os cargos comissionados de mais de 700 para cerca de 400, mas não vamos nomear todos num primeiro momento. Nosso pacote de reformas para a Câmara terá várias pautas, não sei se serão 40, 20 ou 10. Mas vamos enviar”.
Previdência dos servidores
“Vou reencaminhar para a Câmara o projeto de parcelamento do pagamento da parte patronal da previdência. Como eu não vou mandar? Como eu vou pagar de imediato R$ 68 milhões, se eu não tenho nem a garantia de pagar o salário do servidor no ano. Eu não tenho culpa se a administração anterior não pagou durante todo o ano a parte patronal, mas eu não quero perder em março o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), proibindo qualquer tipo de recurso federal de vir para Florianópolis. É óbvio que a minha política não era de parcelamento, mas como é que eu não vou encaminhar? Os vereadores vão votar contra? Ótimo, então eu vou pagar a previdência e não vou pagar o salário do servidor. É melhor fazer uma rolagem dessa dívida que já existe de maneira parcelada ou é melhor não pagar o salário do servidor?”.
Unificação dos fundos da previdência
“A nossa equipe está estudando isso, porque obviamente vem se discutindo nacionalmente uma nova política. A estratégia de fundos de previdência nos municípios está quebrada em todo o Brasil. Hoje nós temos um fundo completamente superavitário, que foi aprovado no início de 2009, e um totalmente deficitário, por falta de pagamento desde 2013. Porque até 2012 ele estava funcionado com recursos aplicados, e os juros desses recursos pagavam a parte patronal. Isso parou de acontecer. O formato que pretendemos fazer não está concluso ainda, mas vai permitir que a previdência do município sobreviva. Se eu não fizer isso, seguiremos não pagando a parte patronal e parcelando por mais 10 anos a previdência, criando assim uma falsa expectativa”.
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Arrecadação em cota única do IPTU
“A arrecadação em cota única do IPTU deu um duodécimo próximo a R$ 12 milhões e pouco por mês. Deu pouco mais de R$ 144 milhões no total. A partir de agora temos outros tributos que incidem para entrar no caixa do município, o IPVA, ISS, e outros que formam um bolo de arrecadação mensal. Com base nisso que vou pagar as folhas. Eu poderia pegar o dinheiro do IPTU e pagar toda a folha de dezembro, mas seu fizesse isso eu inviabilizaria o município nos próximos 12 meses.
Folha de janeiro
“Eu tenho que garantir primeiro a folha de dezembro. A folha de janeiro vai ser comigo, e esse é o desafio. Tenho poucas informações boas, mas tenho: a gente está discutindo uma série de financiamentos, e a prefeitura ainda tem uma capacidade de endividamento, então não estamos em terra arrasada, vamos virar o jogo”.