“Um encontro com a minha gênese”, assim o cantor e compositor Lô Borges define sua participação no Psicodália, encontro de música que acontece em Rio Negrinho, no Norte de Santa Catarina, ao longo do feriado de Carnaval (9 a 14 de fevereiro). Enquanto outros festivais de massa apostam em bandas que fazem sucesso no Spotify, o Psicodália resgata o espírito setentista para celebrar a autenticidade, o experimentalismo e o surrealismo da música brasileira. É aí que entra Lô Borges.
Continua depois da publicidade
O músico mineiro está sacramentado na história da discografia nacional com o álbum “Clube da Esquina”, em parceria com Milton Nascimento, mas é o disco solo “Lô Borges” (mais conhecido como o “Disco do Tênis”) que transpira seus devaneios cults e psicodélicos. Os dois álbuns emblemáticos foram lançados em 1972, quando tinha 20 anos, mas apenas Clube da Esquina tinha virado show. Foi só em 2017, 45 anos após seu lançamento, que o Disco do Tênis foi apresentado por Lô Borges nos palcos brasileiros. Agora, chegou a vez de Santa Catarina.
Proativo, como gosta de se definir, o mineiro trabalha em um novo disco de inéditas, com lançamento previsto para o segundo semestre de 2018, e tem feito parcerias com outros artistas, como Tom Zé, Nando Reis, Arnaldo Antunes e Samuel Rosa. Ainda assim, o repertório do show está concentrado nas 15 faixas do Disco do Tênis e em suas nove composições para o Clube da Esquina.
De sua casa em Belo Horizonte, Lô Borges nos atendeu pelo telefone para falar sobre sua terceira apresentação em solo catarinense, desta vez em uma fazenda onde pulsam o espírito estradeiro e o “estado de consciência alterado” que inspiraram a criação do Disco do Tênis.
Continua depois da publicidade
A felicidade em tocar seu primeiro álbum solo para aqueles que nem tinham nascido no ano do lançamento, mas que “vibram uma outra história durante o Carnaval”, ressoa em sua voz. Prestes a subir ao palco do Psicodália pela primeira vez em 21 edições, Lô Borges festeja o resgate do movimento hippie e o encontro com a cultura que deu origem ao seu trabalho mais autêntico.
Entrevista
“Tocar no Psicodália é uma coisa maravilhosa”
Quando foi a última vez que veio a SC?
Me apresentei duas vezes no Teatro do CIC, mas não lembro em quais anos. Fui pouquíssimas vezes à Santa Catarina, é um lugar que conheço muito pouco. Tenho alguns familiares aí, então a última vez que estive em Santa Catarina seguramente não foi profissionalmente.
Conhece o festival Psicodália? O que acha dessa molecada resgatando o espírito hippie da década de 1970?
Continua depois da publicidade
Já tinha ouvido falar no festival, agora que a gente vai se apresentar procurei conhecer mais. É uma ideia espetacular essa coisa de as pessoas estarem vibrando uma outra história durante o Carnaval, estou muito feliz com esse show. Uma das melhores coisas que aconteceu comigo é que quando eu tinha 20 anos, idade em que gravei “Clube da Esquina” e o “Disco do Tênis”, era a época dos hippies nos EUA e também no Brasil. Voltar a isso décadas depois, um festival onde as pessoas vão desprendidas de coisas negativas, querem respirar e celebrar a música…
O resgate da postura hippie, daquela visão “paz e amor”, é muito bem-vindo na minha vida porque fez parte de mim. Eu era bastante hippie, morei em comunidade alternativa, me sinto muito perto disso. Poder tocar em um festival como o Psicodália, onde isso pulsa novamente, é uma coisa maravilhosa. É um encontro meu com minha gênese.
Como foi, finalmente, se apresentar com o repertório do Disco do Tênis? É isso que podemos esperar no Psicodália?
Continua depois da publicidade
Esse disco do tênis foi lançado no mesmo ano do “Clube da Esquina”. Eu era muito jovem, quando acabei de gravar o disco não tinha nem estrutura pra fazer shows. Depois das gravações, saí pra ser hippie. Fui para Porto Alegre por um tempo, depois morei em uma comunidade hippie em Arembepe, na Bahia. Acabou que o show nunca foi lançado na época, só agora em 2017.
Em 2015 recebi um convite da Virada Cultural de São Paulo para tocar esse disco no Teatro Municipal, mas como só tinha um mês para preparar o show, declinei do convite. O disco é cheio de detalhes, timbres e texturas, não tinha como fazer em um mês. A ideia de apresentar um show do disco só veio depois de um encontro com o Pablo Castro em 2017.
Um dia convidei ele pra vir na minha casa, passamos boa parte do tempo tocando músicas do Disco do Tênis. O Pablo tem trabalhos de releituras dos Beatles e disse que tinha uma banda capaz de reconstruir o álbum. Ele conversou comigo e ensaiou alguns meses. Aí, fui em um dos ensaios e adorei o que eles estavam fazendo. Estava exatamente igual, foi um verdadeiro trabalho de arqueologia musical. Pegaram todos os timbres, os solos do Beto Guedes, do Toninho Horta, do Nelson Ângelo… Fizeram igualzinho. Aí falei: “bicho, vamos em frente”. Quarenta e cinco anos depois estamos em turnê com esse show.
Continua depois da publicidade
Aquele tênis era seu?
Era meu, estava bem surradinho. Não porque era o meu tênis favorito, mas porque era o único.
O Clube da Esquina estará no Psicodália?
Vai sim. O Disco do Tênis é curto, com canções Lado B, não poderia fazer um show de apenas 30 minutos. Aí falei com o Pablo Castro, já que tinham ensaiado o Disco do Tênis tão bem, e pedi para a gente incluir as minhas músicas do Clube da Esquina. No show, toco todas as minhas composições do Clube da Esquina – as que eu cantei e as que o Milton (Nascimento) cantou. Na apresentação, vamos privilegiar o ano de 1972, que foi um ano extremamente inspirado. Esse show, para mim, é uma viagem a 1972.
Quando você percebeu a importância do Clube da Esquina e do Disco do Tênis?
A gente não tinha a menor noção, jamais imaginava que décadas depois ia estar falando sobre o Clube da Esquina. A gente fez um disco pra curtir aquele momento, não tinha pretensão de ser um algo histórico. A gente jamais imaginou a importância que esses trabalhos tomariam com o decorrer das décadas, porque foi uma coisa feita de maneira despojada, mas com muita vontade de acertar e com muita inspiração. O Disco do Tênis tinha tudo isso e ainda tinha o estado de consciência alterado. O Clube da Esquina era um pessoal mais… O Disco do Tênis era coisa de maluco pra maluco, todo mundo que participou das gravações estava viajando, experimentando muita coisa que rolava naquela época…
Suas canções foram gravadas por intérpretes como Milton Nascimento, Nana Caymmi, Simon, Gal Costa e Elis Regina. Quem mais agrada você?
Continua depois da publicidade
Todo esse pessoal da MPB mais tradicional foi muito bacana, mas fiquei muito feliz quando o pessoal do rock nacional também começou a gravar algumas músicas. Paralamas do Sucesso, Nenhum de Nós, Skank… É muito legal perceber que fui gravado no começo da carreira pelo pessoal da MPB mais tradicional e depois pelo pessoal do rock.
O que anda ouvindo ultimamente?
Estou num processo de fazer um disco atrás do outro, então o que mais tenho escutado são as músicas que estou fazendo, inclusive porque tenho um disco para ser lançado no segundo semestre.
Onde você se reconhece na música brasileira de hoje?
A música está viva na minha cabeça, como se eu ainda tivesse 20 anos. Não parei de compor nunca, estou com 66 anos e continuo compondo. A minha viagem rumo ao desconhecido, que começou em 72, continua, ainda está muito presente a febre louca de criar. Não parei na esquina, estou voltado pra coisas novas e isso vai perdurar enquanto tiver vontade de fazer música. Pelo jeito, essa vontade não vai acabar.
Continua depois da publicidade
Da janela lateral, como você enxerga o Brasil?
O Brasil vem de confusão em confusão. A política brasileira é muito lamentável. Para qualquer lado que você olha vê corrupção e indignidade. Isso gera indignação e eu sou um cara indignado. As coisas não vão bem, assim como em 1972 não iam bem — a gente vivia uma ditadura. Politicamente, o Brasil sempre foi muito difícil. Continua assim, bem confuso e bagunçado. Não sei o que vai acontecer nessas eleições, só sei que o povo brasileiro precisa de coisa melhor.
SERVIÇO
O Psicodália acontece pelo oitavo ano consecutivo na Fazenda Evaristo, uma área verde de 500 mil m² em Rio Negrinho (SC), a 260 km de Florianópolis e 120 km de Curitiba, ao longo do feriado de Carnaval (9 a 14 de fevereiro). Em sua 21ª edição o festival tem programação voltada para a música brasileira e, além de Lô Borges, grandes nomes estão confirmados, entre eles Zé Ramalho, Jorge Ben Jor, Arrigo Barnabé e Mundo Livre S/A. O festival também terá uma série de oficinas, apresentações de teatro, sessões de cinema e atividades recreativas para crianças.
Os ingressos estão à venda em link disponibilizado diretamente no site (www.psicodalia.com.br) e na página do Facebook do evento. As entradas saem a partir de R$ 493,00 (com taxas inclusas) e garantem acesso aos shows, oficinas, apresentações culturais e 6 dias de camping.
Continua depois da publicidade
PONTOS DE VENDA
Florianópolis
Garden Perfumes
Estrada Dom João Becker, 145 sala 101 – Ingleses do Rio Vermelho
Garuva
Red Point
Av. Célso Ramos, 1
Itajaí
Farmais Centro
Rua Tijucas, 11, Centro, Itajai
Farmais São João
Avenida José Pereira Liberato, 987, São João, Itajai
ATRAÇÕES CONFIRMADAS
Abacate Contemporâneo
Aminoácido
Aninha Martins
Arrigo Barnabé
Bananeira Brass Band
Bandinha Di Dá Dó
Bixiga 70
Bloco da Laje
Boogarins
Carne Doce
Consuelo
Ema Stoned
Estrela Leminski e Téo Ruiz
Graveola
Joe Silhueta
Jorge Ben Jor
Kiai
La Banda Bandalo
Lô Borges
Mabombe
Machete Bomb
Mulamba
Mundo Livre S/A
Mustache & os Apaches
Orquestra Manancial da Alvorada
Pata de Elefante
Pedra Branca
Som Nosso de Cada Dia
Terra Celta
Trio Quintina
Tulipa Ruiz
Tutti Frutti
Ventre
Zé Ramalho