Uma das praias mais intocadas e selvagens da Ilha de Santa Catarina, a Praia do Moçambique vai ter o seu principal acesso fechado diariamente das 22h às 6h por motivos de segurança. A reivindicação para que isso ocorra partiu de moradores da região, em especial do bairro vizinho Rio Vermelho, e também de integrantes da Polícia Militar Ambiental e da administração do Parque Estadual do Rio Vermelho, unidade de conservação administrada pele Instituto do Meio Ambiente (Ima) – antiga Fatma –, que engloba também o Moçambique.
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Isolada, a praia e extensa vegetação que a cerca, já foi cenário de furtos, assaltos, estupros, homicídios e ponto de desova de corpos. Na quinta-feira (12) de manhã mais um cadáver foi encontrado no local, carbonizado, sendo o terceiro corpo achado na praia neste ano. A maioria dos casos acontece à noite. Segundo o subtenente Marcelo Duarte, da Polícia Militar Ambiental, o trabalho agora, mais do que buscar recursos para instalar o portão, é fazer um trabalho de conscientização das pessoas que circulam pelo caminho sobre a importância da medida para a segurança.
O mesmo, aponta Duarte, foi feito no Terminal Lacustre do Rio Vermelho, que leva e traz pessoas para a Costa da Lagoa. Antes da instalação do portão na localidade, o local era palco de festas raves, ponto de uso de drogas e pequenos crimes. Com a situação piorando, lembra o policial, no final de 2016 começaram as conversas para fechar o acesso ao terminal à noite com um portão. A simples presença física do equipamento no terminal lacustre, destaca, já diminuiu as ocorrências na região, mesmo que em muitos casos o portão estivesse sem cadeado.
— Vamos fazer no principal acesso ao Moçambique o mesmo que no terminal da Costa da Lagoa, por etapas. Primeiro, em conversas com a comunidade, depois colocando o portão, mas deixando aberto no início, em seguida sem cadeado, até que todos se acostumem — explica.
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Encontrar notícias de crimes com a Praia do Moçambique como cenário é fácil, as ocorrências se repetem há anos, favorecidas pelo pouco movimento noturno às margens da rodovia João Gualberto Soares, da longa estrada de chão que leva do asfalto à beira do mar, e a orla de 12,5 quilômetros de extensão, rodeada de grandes eucaliptos. Por isso também oito do total de 10 acessos à praia já foram fechadas ao longo dos anos.
Audiência pública foi o pontapé inicial da medida
Para que o mesmo aconteça no principal acesso à orla, o primeiro passo foi dado em uma audiência pública realizada pela comunidade em 22 de junho. No encontro, a maioria decidiu por buscar recursos para a colocação do portão, que ficaria fechado das 22h às 6h, e no qual alguns pescadores e/ou moradores poderiam ter uma chave para acessar o local, desde que comprovada a finalidade de acessar o espaço por sua principal entrada nos horários de fechamento.
— Temos agora a necessidade de buscar recursos para a colocação do portão. Tanto o Ima, como a Polícia Ambiental e a comunidade estão trabalhando pela segurança. Enquanto o plano de manejo do parque não fica pronto, buscamos tomar algumas medidas, como essa do portão. A expectativa é instalá-lo antes do verão — afirma a bióloga Adriana Nunes, coordenadora do Parque Estadual do Rio Vermelho, que lembra o número de corpos encontrados no Moçambique no ano passado: “Seis corpos encontrados em 2017 na restinga da Praia do Moçambique”.
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Um deles foi o corpo de um turista paulista, Jadson Andrade, de 30 anos, assassinado por engano por membros de uma facção criminosa e cujo corpo foi encontrado na Praia do Moçambique em setembro do ano passado.
Participação da comunidade e autoridades
Presidente da Associação de Moradores do Rio Vermelho, João Bericó diz que a audiência pública foi positiva e a maioria dos moradores – de um total de 120 pessoas – optou pela colocação do portão no principal acesso à praia. Segundo ele, a deliberação apontou que o fechamento da estrada, como ocorreu recentemente no terminal lacustre do Rio Vermelho, é a medida que mais agrada todos os atores da localidade, como moradores, administração do parque, Ima e Polícia Militar Ambiental.
— Vai ser muito parecido com o que fizeram na Costa, fechando das 22h às 6h, e a chave do portão ficando com a Polícia Ambiental. Pescadores e moradores que demonstrarem necessidade de acessar a praia nesse horário poderão fazer um cadastro e entrar quando precisar. A chave do portão vai ficar na base da Polícia Ambiental ali perto — explica Bericó, para dizer que em outros momentos essa ideia de fechar o acesso era rechaçada por parte da comunidade.
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Com a realização da audiência pública, porém, isso mudou. Para Bericó, embora um portão no principal acesso não seja garantia do fim dos crimes na região, a “intenção é mostrar para o bandido que agora está mais difícil desovar um corpo ali, porque ninguém desova um corpo de a pé ou de bicicleta”.
— Claro que pode desovar em outros lugares, mas vai ser mais difícil, e isso traz uma sensação de tranquilidade para a comunidade — aponta Bericó.