As imagens de um casal sendo torturado e morto com requinte de crueldade em Palhoça foram compartilhadas pelo WhatsApp na última semana e revelam a brutalidade da atuação de facções criminosas. As cenas não ficam atrás da violência de grupos terroristas em outras partes do globo e são compartilhadas rapidamente. O episódio mostra uma prática que ficou comum em Santa Catarina nos últimos anos: a publicidade dos crimes brutais. Para o promotor Luiz Fernando Fernandes Pacheco, da 39ª Promotoria, responsável pelas ações e procedimentos da Unidade de Apuração de Crimes Praticados por Organizações Criminosas na Região Metropolitana de Florianópolis, os vídeos passam uma “mensagem de maldade”. Confira a entrevista:
Continua depois da publicidade
Como você avalia a prática dos criminosos de divulgar imagens de execuções?
Em primeiro lugar, precisamos dizer que, assim como a tecnologia trouxe imensos benefícios para a sociedade, de igual modo está sendo utilizada para divulgação de práticas ilícitas. A utilização do Whatsapp e do Facebook para mostrar esses atos bárbaros e cruéis mostra que precisamos questionar até onde vai a crueldade do ser humano. São vídeos que demonstram a ausência de qualquer sentimento humanitário ou de piedade. São atos de violência explícita que aterrorizam não só as facções rivais, mas a população de bem.
Há algum meio de evitar a propagação dessas filmagens?
Continua depois da publicidade
A velocidade com que os vídeos são disseminados para milhares de pessoas torna esse bloqueio praticamente inviável. É algo que se tenta controlar, mas, lamentavelmente, não se consegue. Até o cumprimento de decisão judicial quanto à divulgação de determinado conteúdo é muito difícil de ser efetuado. É uma coisa que depende mais do comportamento das pessoas do que de uma ação do poder público. É importante que as pessoas não divulguem os vídeos, porque de uma forma ou de outra acabam espalhando o pânico. Se quiserem denunciar, que façam isso diretamente para as autoridades competentes, para que sejam usados apenas nas investigações.
Qual o intuito dos criminosos?
Primeiro, é a mensagem da maldade. Além de ser um recado para as facções rivais, no sentido de dizer que vão fazer isso com eles, que estão preparados para o enfrentamento e não têm limite de crueldade para manter sua hegemonia, tem o intuito de espalhar o pânico na população. Essas facções tomam conta de vários bairros, onde a maioria dos moradores é pessoa de bem. Então, essas pessoas de bem, tomando conhecimento do que eles são capazes de fazer, temem revelar para a polícia ou ao Ministério Público quem são os criminosos. Além disso, há ainda um terceiro fator, mais evidente naqueles vídeos em que é possível identificar os autores dos crimes. As pessoas que se deixam filmar fazem questão de valorizar que são os autores dos crimes, até para ter algum tipo de influência ou ascendência dentro do grupo criminoso.
O que explica o acirramento da disputa entre facções?
O que vem provocando esse acirramento do conflito é a intenção do Primeiro Comando da Capital de adentrar em território catarinense e disputar o lucrativo “mercado” do tráfico de drogas e armas. Por que Santa Catarina? É um Estado que tem vários portos, como São Francisco do Sul e Itajaí, o que ajuda muito na exportação de drogas para o mercado internacional. O aumento do número de homicídios em 2017 é fruto dessa guerra desenfreada. Em SC, a facção encontrou uma resistência que não esperava, mas já existia um grupo criminoso aqui que quer manter sua hegemonia, principalmente em Florianópolis e Joinville.
Continua depois da publicidade
Até que ponto o Estado está pronto para lidar com isso?
O Estado vem se preparando, é um dos que mais investiu em segurança pública nos últimos anos. Criamos uma unidade de crime organizado, temos promotorias e delegacias especializadas. Nos últimos anos, tivemos a condenação de centenas de criminosos, sendo o maior processo criminal da história de Santa Catarina em Blumenau. Mas as ações de combate a essa violência exigem um trabalho de inteligência e várias operações da polícia e do Ministério Público não podem ser divulgadas porque envolvem interceptação telefônica e a identificação de quem são os principais envolvidos. Só depois é que partimos para uma ação efetiva de mandados de prisão e processos pelas práticas desses crimes.
Propagação de vídeos de assassinatos aumenta no Estado e alerta autoridades