Sem que os analistas tenham conseguido identificar de forma clara a razão para um movimento tão brusco, o mercado acionário chinês teve nesta segunda-feira novo pregão de forte queda, espalhando aversão ao risco para as demais grandes bolsas de Ásia, Europa e Américas. Com o gatilho do indicador que mostrou, sem surpresas, retração da atividade industrial do país pelo décimo mês consecutivo, Xangai encerrou a segunda-feira com retração de 6,86%. A curiosidade é que a forte baixa levou ao acionamento do circuit breaker, mecanismo que interrompe os negócios quando há grande variação dos índices de ações, logo em seu dia de estreia.

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A reboque do derretimento do mercado chinês e das incertezas quanto à aterrissagem da economia do gigante asiático, a bolsa de Tóquio, no Japão, caiu 3%, Frankfurt, na Alemanha, recuou 4,28% e o índice Dow Jones, da Bolsa de Nova York, teve queda de 1,58%.

Em situação ainda mais frágil, o Brasil não escapou do contágio. O índice Ibovespa teve perda de 2,79%, fechando a 42.189 pontos, o menor nível desde abril de 2009, e o dólar subiu 2,18% e voltou a superar a barreira de R$ 4. A moeda americana encerrou o dia a R$ 4,039, o maior valor desde 29 de setembro.

– O que se pode ver são vários indicadores ruins, com a economia chinesa crescendo em ritmo menor, o que impacta o preço das commodities, principalmente minério de ferro e petróleo, que ano passado já caíram bastante. E isso no Brasil impacta tanto a bolsa quanto a economia real – avalia Wagner Salaverry, sócio-diretor da Quantitas.

Para André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos, apesar de parecer que os resultados fracos da indústria chinesa dispararam as ordens de venda mundo afora, por trás do movimento está a percepção de que 2016 será mais um ano ruim para os emergentes.

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– E também nada favorável às bolsas por causa da alta do juro nos Estados Unidos – entende Perfeito.

Outro motivo especulado como motivador foi a aproximação do fim do período de proibição de grandes investidores, com participação superior a 5% no capital de empresas, de se desfazerem de papéis. Imposta em julho de 2015 pelo governo chinês, a norma expira neste mês e pode ter levado pequenos investidores a se anteciparem ao fim da restrição e venderem ações, protegendo-se da queda prevista.

Roberto Dumas Damas, especialista em economia chinesa do Insper, sustenta que não há surpresa nem nos dados ruins da indústria chinesa ou na queda brusca da bolsa local. O quadro, afirma Damas, faz parte da ação planejada de transição da economia do país asiático para um modelo baseado no investimento para o consumo interno. Com isso, a taxa de crescimento da China, de 10% na última década, será reduzida para algo entre 4,5% e 5,5% nos próximos 10 anos.

– O estopim da queda da bolsa teve o investidor desavisado, que acha que a economia chinesa iria continuar a crescer no mesmo ritmo, e o especulador que quer deixar despencar para depois comprar com os preços lá embaixo – diz Damas.

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Nos próximos meses, provavelmente o mundo voltará a ser sacudido por uma retração brusca das bolsas chinesas causadas por dados que mostram a economia perdendo ritmo, avalia Damas. O especialista observa que hoje, enquanto no Brasil o consumo responde por 66% do PIB, na China é apenas 35%. Para chegar a 50%, prevê, ainda deve demorar pelo menos mais oito anos.

Mercado prevê mais inflação e queda maior do PIB em 2016

Um dia de bolsas no vermelho

Xangai/Shenzhen*: -7,02%

Tóquio: -3,06%

Hong Kong: -2,68%

Taiwan: -2,68%

Frankfurt: -4,28%

Londres: -2,39%

Paris: -2,47%

Milão: -3,20%

São Paulo: -2,79%

Cidade do México: -1,92%

Buenos Airs: -1,34%

Nova York/Dow Jones: -1,58%

Nova York/Nasdaq: -2,08%

Nova York/SP500: -1,53%

*Índice composto das bolsas chinesas de Xangai e de Shenzhen

O que é circuit breaker

É um mecanismo de controle da variação brusca dos índices de ações utilizados pelas bolsas.

São acionados, com a interrupção dos negócios, quando a alta ou baixa supera um limite anteriormente estabelecido.

É uma proteção à volatilidade excessiva em momentos atípicos do mercado.

No caso da Bovespa, é usado quando a variação chega a 10%. Na China, a tolerância é de 5%, e o mecanismo foi usado no primeiro dia em que começou a valer – ontem.

A Bolsa de Xangai teve outras quedas significativas no ano passado

8 de julho

-5,90%

Forte recuo decorreu das preocupações dos investidores chineses com a existência de uma bolha no mercado de ações. Ou seja, preços inflados sem sustentação na economia.

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27 de julho

-8,48%

Foi a maior queda diária desde 2007, em meio ao recuo dos lucros das grandes empresas e da atividade manufatureira em geral no país asiático, ampliando o receio de que a desaceleração econômica se mostrasse maior do que a esperada.

24 de agosto

-8,49%

A segunda-feira negra foi gerada porque fracos indicadores econômicos divulgados pelo governo chinês na sexta criaram a expectativa de medidas de estímulo que não vieram neste dia.