Uma lista de reivindicações de presos da penitenciária da Canhanduba, uma facção que ganha força no Estado e a má gestão de vagas no sistema prisional em Santa Catarina resultaram em uma noite de terça-feira violenta em Itajaí e Balneário Camboriú. A BR-101 foi fechada com barricadas, veículos foram incendiados, a casa de um policial foi atingida por tiros e três homens morreram em um confronto com a Polícia Militar. Embora a unidade prisional tenha amanhecido tranquila, a PM teme que novos ataques ocorram nas ruas nesta quarta-feira e pediu reforço de policiamento para áreas vulneráveis em toda a região.
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A movimentação dos presos começou na segunda-feira, quando, por ordem do Primeiro Grupo da Capital (PGC), detentos da penitenciária foram impedidos de trabalhar e receber visitas. Mulheres organizaram um protesto no lado de fora da unidade e uma carta de reivindicações foi expedida, em que os presos reclamam das revistas íntimas aos familiares, de falta de medicamentos, de irregularidades no cumprimento das penas do regime semiaberto e de violência.
Na terça-feira à tarde os protestos se transformaram em motim, agravado com a decisão do Departamento Estadual de Administração Prisional (Deap) de transferir para outras unidades 15 presos que estariam comandando as manifestações. Os detentos batiam contra as grades das celas e lançavam objetos.
O Deap, então, pediu apoio da PM, que enviou 30 policiais das equipes de Pelotão de Policiamento Tático (PPT) de Itajaí, Balneário Camboriú, Navegantes, Itapema e Camboriú para conter os presos. A polícia usou granadas de luz e som para dispersar o motim.
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— Tínhamos receio de que a situação pudesse se espalhar para o presídio — diz o comandante da 3ª Região da PM, coronel Cláudio Koglin.
A preocupação é justificada: o presídio da Canhanduba está superlotado, e um motim ali seria mais difícil de controlar do que na penitenciária, onde ainda há um controle mais rígido de vagas.
O comandante acredita que o “salve”, termo usado pela facção para ordenar os ataques, no início da noite, tenha sido motivado pela crença de que os policiais ainda estavam dentro da penitenciária contendo a movimentação. De acordo com o coronel, a intenção era tirar a atenção de dentro da prisão e obrigar os policiais a irem para as ruas.
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Ataques nas ruas
Pneus incendiados formaram uma barricada na BR-101 no início da noite na altura do quilômetro 119, próximo à entrada para o Complexo Prisional da Canhanduba. De acordo com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), carros que passavam foram atingidos por pedradas. O protesto dispersou por volta das 20h. Mas a rodovia seria fechada ainda duas vezes durante a noite, em Itajaí e em Balneário Camboriú.
Um ônibus da prefeitura de Balneário, que estava estacionado na Marginal Oeste, foi incendiado por volta da meia-noite. Quatro adolescentes, apontados como os responsáveis pelo fogo, foram apreendidos e levados à delegacia.
Mais tarde, durante a madrugada, a casa de um policial militar da reserva foi atingida por tiros no bairro dos Municípios.
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Em Itajaí, um caminhão foi incendiado na Rua Rosa Orsi Dalçoquio, no bairro Cordeiros. Homens apontaram uma arma para o motorista e o obrigaram a descer antes de atearem fogo no veículo.
No bairro Cidade Nova, uma equipe de policiais que fazia ronda entrou em confronto com três homens. A troca de tiros ocorreu na Rua Aldo Silva, e os três suspeitos morreram. Embora a identidade deles ainda não tenha sido divulgada oficialmente, a polícia informou que pelo menos um deles seria líder do PGC na região. Os celulares foram apreendidos e passarão por perícia, que indicará se partiu de algum dos homens mortos em confronto a ordem para os ataques.
O comando regional reuniu durante a tarde desta quarta equipes para reforçar o policiamento. Participarão do reforço o PPT de Balneário Camboriú, Itapema, Camboriú, Itajaí e Navegantes, além de duas guarnições do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) de Florianópolis.
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Denúncias serão investigadas, diz juiz
A lista de reivindicações dos presos da penitenciária será avaliada pela Justiça. O juiz Pedro Walicoski Carvalho, responsável pela Vara de Execuções Penais de Itajaí, disse que encaminhou ao Ministério Público as informações sobre falta de medicamentos e que a promotoria já apura em inquérito a falta de vagas para o regime semiaberto — situação que deve ser resolvida com a inauguração de uma nova ala, no fim do mês.
Mas, segundo ele, não há indicativos de violência na unidade, conforme relataram os detentos.
— Essas coisas têm que ser apuradas de forma pontual, não generalizada. Não podemos acusar alguém de agressão se não for algo pontual — afirma.
No fim da tarde de terça-feira o juiz recebeu em seu gabinete mulheres de alguns dos presos, que relataram preocupação. Ele mostrou a elas o sistema de monitoramento por câmeras, que permite que toda a movimentação da penitenciária seja acompanhada em tempo real pela Justiça, e diz que elas se tranquilizaram.
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— Lá dentro está mais tranquilo do que aqui fora — garante o juiz.
Penitenciária modelo
Concebida para ser modelo para o país, a penitenciária da Canhanduba era a “menina dos olhos” do Deap. Passou até por inspeção internacional no ano passado, quando foi cotada para receber Henrique Pizzolato, condenado do Mensalão que foi extraditado da Itália.
De fato, os números da Canhanduba ainda estão muito além de boa parte das unidades prisionais no Estado. São mais de 600 presos trabalhando e outros 200 matriculados em cursos — inclusive na universidade. Na avaliação das autoridades, o cenário não é favorável à facção criminosa que comanda cadeias em Santa Catarina — o que teria motivado a revolta.
Alie-se a isso o fato de que o Complexo tem recebido presos de todo o Estado, resultado de ações judiciais que fecharam unidades, e da parcimônia do Estado em relação a municípios que se recusam a abrir espaço para novas prisões.
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Pelo menos uma das queixas dos presos, em relação ao regime semiaberto, é resultado dessa ingerência que deixa Itajaí refém da falta de vagas em Santa Catarina. De fato, falta espaço.
Esta é a segunda vez em menos de um mês que a penitenciária da Canhanduba chega aos noticiários com problemas — há duas semanas foi a fuga de sete presos, o que nunca antes havia ocorrido. A entrada da PM para conter motim na penitenciária, desta vez, também foi a primeira.
A festa oferecida pela unidade prisional às crianças do bairro foi cancelada, mas as visitas foram mantidas nesta quarta.
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A Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania (SJC), à qual o Deap é subordinado, enviou uma nota oficial, via assessoria de imprensa, no início da noite. Confira na íntegra:
A Secretaria de Estado da Justiça e Cidadania (SJC) informa que está acompanhando as manifestações ocorridas no presídio do Complexo Penitenciário do Vale do Itajaí e garante que, dentro das limitações judiciais, vem cumprindo com todas as obrigações legais e garantindo todos os direitos constitucionais aos reeducandos daquela unidade, a exemplo do que ocorre em todas as penitenciárias e presídios de Santa Catarina.
A rotina operacional do presídio segue normalizada e todas as medidas legais estão sendo tomadas a fim de garantir a segurança e tranquilidade da sociedade catarinense.
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