Em um caminho trilhado por dificuldades e superação está Masielly Flamand, de 14 anos. Vinda do Haiti a Blumenau com a família há cinco anos, a adolescente descobriu no atletismo mais do que um passatempo: uma vocação. Campeã brasileira no ano passado, a garota se tornou uma verdadeira joia do esporte blumenauense e, radicada por aqui, já fala com orgulho de representar a cidade. Não à toa, em menos de dois anos de treinos, os desempenhos levaram Masielly ao Mundial de Atletismo Escolar, na Sérvia.
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Na quarta-feira (9), Masielly competiu em sua primeira prova no país europeu, às 9h, no horário de Brasília. A prova de atletismo foi de 1.500 metros e a jovem ficou em 6º lugar. Outra prova, esta de 800 metros, ocorreu nesta quinta-feira (10), às 14h50min no horário local, e a atleta ficou na 17º posição.
A voz da mãe da adolescente se enche de orgulho ao falar da chance única que a filha tem de competir na Europa. Para ela, a oportunidade já representa uma vitória por todo o esforço e a dedicação da filha. Ao descrever Masielly, a palavra “força” é a mais usada por Yanika Flamand, que conhece de perto a luta que a família enfrentou para chegar até este momento.
— Eu, como mãe, nem sei como explicar o que significa no meu coração e na minha mente… Nem tenho palavras para explicar como eu me sinto. Estou muito, muito orgulhosa da minha filha e da capacidade dela.
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Masielly viajou com a equipe da Confederação Brasileira do Desporto Escolar (CBDE) na quinta-feira passada (3) para São Paulo, de onde embarcou para a sede do campeonato em Zladibor, uma vila da Sérvia, no município de Čajetina. Mesmo com a felicidade pela filha, Yanika conta que fica com o coração apertado pela viagem tão longa e distante até o campeonato.
Para Masielly, a viagem representa mais um passo pelo sonho:
— Penso em dar continuidade na minha carreira como atleta e, em um futuro próximo, poder lutar em mais competições importantes para ter o prazer de dar uma casa própria para minha mãe.
A ISF U15 Gymnasiade 2025 é a maior competição escolar para atletas de até 15 anos. O Mundial começou na quarta-feira (4) e seguirá até o dia 14.
— O significado dessa competição é de total importância porque é o ápice de um atleta. Eu espero que isso abra portas, que seja uma oportunidade para ser uma virada de chave na vida da Masielly como atleta — afirma Ednilson Licinio Machado, treinador e professor.
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Veja as fotos de viagem para a Sérvia
Do Haiti para Blumenau
A mãe se emociona ao lembrar sobre como, em 2014, precisou deixar Masielly e o irmão mais velho, Alejandro, com familiares para vir sozinha ao Brasil em busca de melhores oportunidades. Foram cinco anos de luta para juntar dinheiro o suficiente e trazer os filhos ao país, o que somente aconteceu em 2020. Yanika revela que sempre sonhou em proporcionar uma vida melhor aos filhos por conta das próprias dificuldades que enfrentou quando era jovem no Haiti.
— Perdi minha mãe e meu pai muito cedo. Tive meu primeiro filho com muita batalha, criei ele e a Masielly sozinha.
Por muito tempo, o Haiti foi considerado o país mais pobre das Américas, com PIB per capita de 1.693 dólares em 2023, segundo dados do Banco Mundial. A Organização das Nações Unidas (ONU) alerta sobre a crise humanitária e de segurança que a nação enfrenta, que é resultado de décadas de instabilidade política, desastres naturais e colapso institucional. Em 2014, quatro anos após o terremoto devastador de 2010, o país ainda lutava para se reconstruir.
As dificuldades de viver no país foram a motivação de Yanika para se mudar e o primeiro plano era ir para a República Dominicana — porém, ela conta que não se adaptou e foi preciso repensar. Foi a irmã, Vanessa, que já havia emigrado e morava no Mato Grosso, quem contou sobre a vida no Brasil e a motivou a conhecer o país.
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Ao mencionar a jornada de vir para o Brasil, Yanika expressa gratidão por ter sido recebida de braços abertos. Logo conseguiu um emprego que a trouxe para Blumenau em 2016, cidade da qual relata ter sido o lugar em que melhor se adaptou. Nesta época, ela ganhou outro filho, Robenson, que hoje tem 9 anos, com o atual companheiro Moreve Petion.
A maior dificuldade para ela foi a distância dos filhos. À beira das lágrimas, a mãe lembra como foi difícil de se adaptar à rotina sem eles por perto. Porém, a dor da distância também serviu como a maior motivação para trabalhar, alcançar uma nova vida e, finalmente, conquistar o sonho de trazê-los ao Brasil. Em 2020, Yanika finalmente conseguiu reunir dinheiro o suficiente e trouxe ambos, Masielly e Alejandro, e acabar com a saudade.
— Foi uma história muito difícil mesmo. Não é fácil sua mãe estar em um país, você estar em outro, mas foi pelo bem-estar deles. Eu sabia que, vindo para trabalhar, eu poderia trazer eles para cá e dar uma vida melhor. E hoje, graças a Deus, eles estão comigo.
Hoje, trabalhando como zeladora e atuando na Igreja Batista Pioneira, a mãe reitera a felicidade de ver a filha tendo a oportunidade de seguir o sonho no meio esportivo. Com um sorriso esperançoso, ela confessa que não sabe o que esperar do futuro, mas sabe que a dedicação e o trabalho de Masielly trará recompensas e ainda mais orgulho.
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Confira algumas vitórias de Masielly
Trajetória de correr nas ruas aos pódios nacionais
— Sempre falo para a Masielly: não desiste. Se você quer mesmo treinar e chegar ao topo, o que você quiser, só vale muito esforço. E, graças a Deus, é o esforço o que não falta porque ela é muito dedicada — exalta Yanika, mãe da jovem.
Radicada em Blumenau, a jovem foi matriculada na Escola Básica Municipal General Lúcio Esteves, na qual o professor de educação física Ednilson Licinio Machado descobriu o talento e dedicação da jovem. Os treinos de atletismo começaram em setembro de 2023 de forma improvisada na rua e com o apoio incondicional da família. Desde então, a estudante do 9º ano se dedica de segunda-feira a sábado, faça chuva ou faça sol, como relatam a mãe e o treinador.
— A expectativa é de procurar ser competitiva, botar em prática todo o trabalho feito até aqui desde que comecei a treinar, esperando o melhor para este momento do ano de acordo com os treinos que estou fazendo — explica a adolescente com entusiasmo.
Masielly trilhou um caminho no esporte através da consistência e dedicação, que garantiram um espaço para si no atletismo. Mesmo com pouco tempo de experiência no esporte, a atleta da Secretaria Municipal de Esportes de Blumenau ganhou duas medalhas nos Jogos Escolares Brasileiros (Jebs). Ela foi campeã e recebeu medalha de ouro na prova de 800 metros no Sub-14, e na prova de 2.000 metros ela conquistou a prata, sendo vice-campeã. Com isso, conquistou uma vaga na seleção brasileira para o Campeonato Mundial.
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— O diferencial dela é a disciplina e o foco. A partir do momento que convidei para treinar, ela não perdeu um dia de treino desde setembro de 2023. Então, para o alto rendimento isso é fundamental: a constância, a disciplina, o foco e o comprometimento para treinar. Foi isso que fez ela chegar nessas competições grandes — elabora o treinador.
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