Florianópolis se orgulha de ter uma das maiores rendas per capita do Brasil — em 2016, era de R$ 4.136, segundo o IBGE —, mas enquanto uma parte da população vive uma vida de conforto, podendo escolher o cardápio das refeições, tem muita gente querendo saber onde recolhe sua parte do PIB. Se o dinheiro ganho com o suor do trabalho não dura até o final do mês, o jeito é contar com a solidariedade para botar comida na mesa.

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Esse é o caso da aposentada Maria Eva Marca, de 76 anos, que recebe por mês R$ 760 da Previdência Social (já com os descontos) e paga R$ 800 só de aluguel. Ela mora em Potecas, São José, e, assim como dezenas de moradores da Grande Florianópolis fazem aos sábados, vai até um sacolão próximo à Avenida Beira-Mar Norte engrossar a fila para recolher frutas e verduras que seriam retiradas das bancas de venda.

— Meus filhos me ajudam um pouco, mas eu não gosto de pedir. Então, pensei em vir aqui ver se tinha umas frutas sobrando, aí me disseram que faziam essa distribuição aos sábados. Eu achei muito bom, porque ajuda muito — conta Maria Eva.

Não é que a vida tenha ficado mais difícil para os trabalhadores nos últimos anos. Sempre foi. Ao menos é assim que a moradora da Serrinha, Josélia Cardoso da Silva, de 46 anos, vê a situação financeira daqueles cidadãos que não fazem parte das classes média e alta.

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— Nunca entrou crise (econômica) na minha casa, sempre foi difícil mesmo. Esse negócio de crise é coisa de gente rica — comenta Josélia, em referência à queda na margem de lucro das empresas e indústrias brasileiras nos últimos anos.

— Tenho cinco filhos e o marido em casa, mas só eu trabalho. Os meninos estudam e meu marido passou por uma cirurgia e não pode pegar peso. Assim, só com um salário mínimo é difícil fazer compras na feira — completa a profissional de limpeza.

Josélia conta que, com a doação de frutas, legumes e verduras do sacolão, consegue economizar R$ 280 no mês (R$ 70 por semana), o que representa quase um terço da renda de sua família. Caso semelhante ao da cunhada Silvani Alves, de 35 anos, que trabalha como chefe de cozinha e recebe R$ 1,3 mil por mês. Ela também é a única assalariada de sua casa — o marido está procurando emprego há um ano e três meses e o filho Juan tem apenas oito anos.

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No último sábado, 17, o que chamou a atenção é que, embora as duas sejam as únicas assalariadas de suas casas, também são elas que vão ao sacolão recolher as doações de alimentos. Aliás, a esmagadora maioria das pessoas na fila é de mulheres. Para Silvani, esse é um reflexo do instinto materno.

— Os homens dizem que têm vergonha de vir aqui, mas nós, mães, pensamos nos nossos filhos. Nessa hora, não tem vergonha — afirma Silvani.

Fila de três horas que vale a pena

A distribuição do sacolão começa depois do fechamento das portas do estabelecimento, às 19h, mas desde as 16h dezenas de pessoas se enfileiram para garantir frutas e verduras. De acordo com um funcionário do sacolão, todos os sábados é distribuída quase uma tonelada de alimentos.

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As doações acontecem há oito anos e variam de acordo com a época. No último sábado, 17, foram distribuídas batata, batata-doce, cenoura, cebola, vagem, beterraba, chuchu, tomate, alface, rúcula, couve-flor, milho, maçã, laranja, banana, limão, ameixa e pêssego.

— É complicado pro pessoal, né? Se a gente não ajudar, fica ainda mais difícil pra eles. O que tiver ali, aquilo que o cliente que está pagando não levaria, a gente dá — afirma o funcionário do sacolão Márcio Oliveira, de 38 anos.

Não é que os alimentos estejam passados ou estragados. Pelo contrário, são de boa qualidade. Não só pelo visual, como pudemos testemunhar no último sábado, mas também pelo relato da própria gente que recebe essas frutas e verduras.

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— As que eu vejo que estão um pouco machucadas, eu faço suco. O que dá eu cozinho, também faço doces e geladinho… Esses dias fiz um geladinho de goiaba, meu Deus do céu, tava tão bom! Aproveito tudo, até as cascas eu boto no fundo do terreno pra fazer adubo. Não perco nada — conta, com o sorriso no rosto, a aposentada Maria Eva Marca.

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