O técnico de judô Bruno Venâncio tem uma rotina pesada no tatame do Instituto Estadual de Educação, onde treina dezenas de judocas da equipe de Florianópolis. Mesmo esperando há quase dois anos o pagamento de uma dívida que beira R$ 10 mil por um convênio do bolsa atleta, o professor mantém o foco e veste a camisa, ou melhor o quimono de Floripa. O treinador lamenta, no entanto, que esportistas de alto rendimento da Capital não tenham a mesma esperança.

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— A gente tem uma equipe. Formamos um atleta, damos toda a estrutura para eles e aí, depois que o cara está pronto, vem outro município e leva ele.

Muitos atletas estão desistindo de competir por Florianópolis e aceitando propostas de outras cidades. A Secretaria Municipal de Esportes deve atualmente R$ 2.491.000, sendo R$ 1,8 milhão a convênios com equipes esportivas e R$ 691 mil para 180 beneficiados pelo suspenso programa do bolsa atleta municipal.

Entre eles, está o judoca do Morro da Caixa Romário Silva, pentacampeão catarinense. Segundo o esportista, o município lhe deve R$ 3.400 desde 2015. De sete parcelas do programa, ele só recebeu três. Por isso, aceitou um convite e decidiu competir pela cidade vizinha de São José.

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— Sempre lutei por Florianópolis, mas já tinha atrasado outros anos. Então para mim, que preciso desse dinheiro para me manter, e eu já tinha recebido proposta de outras cidades, eu fui para São José.

Além do Romário, outros atletas também fizeram esse êxodo. Nathalia Parizoto, atleta da Seleção Brasileira de judô, saiu de Florianópolis para defender o Grêmio Náutico União, de Porto Alegre. Em 2016, esteve nas Olimpíadas do Rio. Ano passado foi campeã brasileira.

No esporte paralímpico, a mesma coisa. Campeã mundial de remo adaptado, Josiane Lima também tem quatro parcelas atrasadas do bolsa atleta e meio que desistiu de tentar reaver esse valor. Por conta de seu currículo e participações paralímpicas, a esportista participa do programa bolsa pódio do governo federal.

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— É uma exigência burocrática que às vezes não vale nem a pena. Eu fico imaginando os pais, os atletas com deficiência… O atleta precisa treinar e não deixar de treinar para fazer essa parte burocrática. Tem que chamar contator, e às vezes o auxílio é R$ 300 reais, não paga nem o deslocamento do atleta.

Prefeitura: “contratos serão pagos através de uma renegociação”.

Reflexo desse êxodo de atletas é o desempenho de Florianópolis nos Jogos Abertos de Santa Catarina. Octacampeã, a cidade praticamente sempre esteve no pódio. Enfileirou um tetracampeonato de 2009 a 2012, seguido de três bronzes. Já no ano passado, amargou um sexto lugar geral.

Movimento contrário fez a vizinha São José, cidade que hoje o Romário representa. No ano passado, foram concedidas 79 bolsas, um investimento de R$ 583 mil. O município ficou em 5º colocado no Jasc, sua melhor colocação na história. Neste ano, o orçamento para o programa será de R$ 618 mil.

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O secretário de Esportes de Florianópolis, coronel reservista da PM Márcio Luiz Alves, garante que todos os contratos atrasados serão pagos através de uma renegociação que atualmente está na Secretaria da Fazenda. No entanto, não há nenhuma previsão de quando isso será feito. Ele argumenta que quando assumiram a pasta, todos esses contratos estavam vencidos e ficou impedido juridicamente que quitar os débitos.

— Não podemos simplesmente ficar discutindo o débito da gestão anterior e parar o esporte. Isso teve um prejuízo grande porque muitos atletas perderam a confiança na administração, migraram para outras cidades e nós buscamos reerguer o esporte no pagamento dos compromissos que nós firmamos — argumentou.

Para o coronel Márcio Luiz, essa confiança está sendo resgatada, já que todos os contratos feitos pela atuação gestão estão sendo pagos “religiosamente”. Em 2018, o programa do bolsa atleta de Florianópolis continuará suspenso, segundo o secretário, pois os recursos disponíveis não seriam suficientes para contemplar um número considerável de atletas. Por isso, nesse ano se priorizou esportes coletivos e zonas de interesse social.

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O secretário destaca que a Fundação Municipal de Esportes irá investir R$ 1,73 milhão em projetos de esportes de representação em competições como os Jogos Abertos, e a Olimpíada Estudantil Catarinense. Também serão disponibilizados outros R$ 300 mil para eventos esportivos e R$ 700 mil para projetos de esportes comunitários, iniciativas que promovam a inclusão de crianças carentes. A prefeitura pretende reativar o programa do bolsa atleta em 2019.