Em que outro Estado do Brasil se poderia avistar obra de tão superior arquitetura, que combina o mar e a montanha, 531 quilômetros de praias, dunas, lagoas, remansos, promontórios, enseadas – tudo sob a benção da Serra do Mar, cujos degraus se erguem a apenas um sopro das franjas do litoral? Só mesmo em Santa Catarina. Do mar heroico da Laguna, a São Joaquim, estação alpina, são apenas 150 quilômetros de uma estrada íngreme e entalhada na rocha – 1.450 metros escalados em vertiginosos 12 quilômetros, meandros da Serra do Rio do Rastro, espécie de oratório coleante, pelo qual alcançamos o mirante da “Grande Criação”.

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Homem de grande cultura, e de prosa luxuosa, o governador Jorge Lacerda “fotografou”, certa vez, o Estado catarinense para uma ilustre platéia de brasileiros – que desconhecia completamente aquela sua comovente “aquarela”.

O texto dessa inspirada composição, publicada pela revista “Manchete” em 1957, um ano antes de sua morte, trazia a assinatura do intelectual que se tornara governador do Estado de adoção – um político raro, gentleman admirado por correligionários e adversários.

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Primeiro, Jorge Lacerda advertiu, já no título de seu exaltado hino: “Santa Catarina é diferente”.

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– O que surpreende o viajante, quando percorre o território catarinense, são os acidentes geográficos. Quem vive na Capital da República, e ouve falar em Santa Catarina, tem a impressão de que, aqui, a natureza é aquela “fêmea mansa” de que nos fala Gilberto Freire, a respeito de outras regiões do país, que se agachavam sem resistência às botas petulantes do colonizador.

Feita a advertência, convidou os brasileiros a conhecer aquele Estado do Sul, tão belo e tão esquecido. Falar-se em Santa Catarina, nos impérios culturais do centro do país, era como falar de um “país de ficção”, mais do que uma paisagem, uma “visagem”.

Por contraste, o vizinho Rio Grande era “o Continente”, como se o território de Santa Catarina se resumisse à Ilha onde se deita uma mulher langorosa – a descansada Floripa, onde nada acontecia. Mas Santa Catarina e sua nervosa geografia, decididamente, não era uma “fêmea mansa”:

“Ao contrário. A natureza, aqui, parece ter convocado as montanhas, numa verdadeira insurreição telúrica, para conter a marcha do homem. O chão catarinense foi sacudido por uma convulsão de serras. Para dominá-lo, foi mister a obstinação heroica daquelas raças que trouxeram do Velho Continente a decisão da luta e a paixão da conquista.”

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