A recente decisão de remover as tradicionais lanternas japonesas da Rua dos Aflitos, na Liberdade, reacendeu debates sobre as complexas raízes históricas do bairro. Embora amplamente reconhecido como um centro da cultura japonesa, a Liberdade possui uma herança profundamente conectada às histórias negra e indígena de São Paulo, frequentemente ofuscada por essa associação mais contemporânea.
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Entenda a história “esquecida” da Liberdade
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O Cemitério dos Aflitos e a Capela dos Aflitos
A Rua dos Aflitos abriga a Capela dos Aflitos, um marco histórico que do final do século XVIII. O local foi parte do Cemitério dos Aflitos, onde eram enterrados escravizados, indigentes e condenados à forca. Entre os sepultados está Francisco José das Chagas, o Chaguinhas, um soldado negro executado em 1821, cuja história se tornou símbolo de resistência. A capela, hoje tombada, é uma das poucas estruturas remanescentes desse período e luta por maior reconhecimento e preservação, enquanto projetos de memória, como o Memorial dos Aflitos, ainda enfrentam dificuldades para sair do papel.
A presença negra na Liberdade
A Liberdade foi palco de execuções públicas, como as que ocorriam no Largo da Forca, hoje Praça da Liberdade. Além disso, a área serviu como moradia para comunidades negras libertas e escravizadas. O nome do bairro pode estar relacionado ao clamor popular por “liberdade” durante a execução de Chaguinhas, cujas cordas arrebentaram três vezes antes de ele ser morto. Hoje, iniciativas culturais buscam destacar essa história, como a estátua de Madrinha Eunice, sambista e ativista negra, instalada na Praça da Liberdade.
A chegada da cultura japonesa e o apagamento histórico
No século XX, a chegada de imigrantes japoneses trouxe uma nova identidade ao bairro. O simbolismo das lanternas e a arquitetura oriental ganharam destaque, ajudando a moldar a imagem atual da Liberdade. Contudo, esse processo também contribuiu para o apagamento de outras histórias. A decisão de retirar as lanternas da Rua dos Aflitos reflete uma tentativa de valorizar a memória negra e indígena e mediar as diferentes narrativas do bairro.
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Disputa por espaço e memória
Grupos como o Movimento Negro e representantes da cultura japonesa têm debatido o equilíbrio entre as histórias do bairro. A retirada das lanternas é parte de um esforço maior para destacar a importância do sítio histórico e da memória coletiva. A criação de um memorial na Capela dos Aflitos ainda depende de recursos e apoio governamental, mas carrega o potencial de resgatar as histórias silenciadas do bairro.
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