Localizada no bairro Monte Cristo, na área continental de Florianópolis e junto ao principal acesso à Capital de Santa Catarina pela BR-282, está a comunidade Chico Mendes, que carrega o nome de um dos maiores ambientalistas do Brasil e líder na luta dos seringueiros da região amazônica. Um local que, assim como o nome que o inspirou, carrega um histórico de resistência e busca de melhores condições de vida por meio da luta ambiental.

Continua depois da publicidade

Francisco Alves Mendes Filho foi um sindicalista, líder seringueiro e ambientalista morto em 1988 após receber diversas ameaças de pessoas que não concordavam com ativismo ambiental pregado por ele.

Também na década de 1980, surgiu a favela. De acordo com Cíntia Cruz, de 38 anos, nascida e criada na comunidade, foi após a morte do ativista que lideranças comunitárias decidiram pelo nome da ocupação.

— Foi uma forma de resistência que permanece até os dias de hoje — conta.

Resultante da organização de migrantes do Oeste catarinense, a comunidade Chico Mendes foi formada por pessoas que vieram do interior para a cidade grande em busca de qualidade de vida, segundo Cíntia.

Continua depois da publicidade

— [Eles] encontram um terreno ocioso, à beira da BR, e começaram a ocupá-lo. Com essa ocupação, teve a doação de um terreno, que hoje é a Escola de Educação Básica América Dutra Machado, uma das maiores escolas aqui do Complexo do Monte Cristo. Isso fortaleceu muito o movimento de ocupação — relata.

Atualmente, de acordo com a moradora, o complexo do Monte Cristo conta com 12 comunidades, sendo a Chico Mendes uma delas. Segundo dados mais recentes do Censo, são 11.219 pessoas que residem no bairro.

Enedina Rosa Stenk também é moradora da comunidade Chico Mendes desde o período de ocupação, nos anos 1980. Aos 68 anos, a aposentada considera o ambientalista um herói que lutou pelas comunidades.

— Ele foi uma pessoa que nunca disse não para ninguém, uma pessoa sincera. Um excelente homem, tinha que ser ele — diz ela, orgulhosa, sobre a homenagem.

Continua depois da publicidade

A luta ambiental na comunidade Chico Mendes

Cíntia Cruz é presidente da Associação Revolução dos Baldinhos, iniciativa que promove a compostagem de resíduos orgânicos nas comunidades urbanas, especialmente na periferia de Florianópolis.

Veja fotos das iniciativas do projeto

O movimento surgiu em 2008, em resposta a um surto de ratos causado pelo excesso de lixo, principalmente resíduos orgânicos descartados inadequadamente nas ruas na comunidade Chico Mendes. Na época, dois moradores morreram por leptospirose.

— A mobilização começou com mulheres da comunidade, junto a educadores ambientais e instituições parceiras que passaram a promover oficinas de compostagem doméstica, utilizando baldinhos plásticos como recipientes para armazenar os resíduos até que fossem levados aos pontos de compostagem. Daí surgiu o nome “Revolução dos Baldinhos” — conta Cintia.

Continua depois da publicidade

Revolução dos Baldinhos, de Florianópolis, ganha prêmio de agroecologia na Alemanha

Com o tempo, o projeto se consolidou como associação, expandiu as ações, formou lideranças comunitárias e se tornou referência nacional e internacional em gestão comunitária de resíduos sólidos e promoção da agricultura urbana, de acordo com a presidente:

— O projeto deu super certo porque essas pessoas vieram do interior. Quem tem a relação com a terra quer permanecer tendo.

Em outubro deste ano, o movimento completa 17 anos. Atualmente, a associação é composta por 11 associados, todos moradores da comunidade, além de colaboradores, voluntários e parceiros institucionais.

O projeto atende 15 ruas, onde realiza a coleta seletiva de resíduos orgânicos domiciliares, processos de compostagem comunitária, produção de adubo e o cultivo de hortas urbanas, segundo Cíntia.

Continua depois da publicidade

— A gente tem um cadastro de mais de 380 famílias, totalizando em 2.400 pessoas nos nossos atendimentos. A gente só não tem capacidade de evoluir o projeto para todo o complexo do Monte Cristo porque a gente não recebe pelo pagamento de serviço ambiental — conta.

A ação atua em duas comunidades: na Chico Mendes e na Nossa Senhora da Glória. Na primeira, são 8 mil moradores, e na segunda 3.500, de acordo com Cíntia:

— A gente tira por semana 2,5 toneladas de resíduos, totalizando em oito toneladas por mês.

Além dessas ações, a Revolução dos Baldinhos desenvolve ações educativas, como oficinas, palestras e formações sobre meio ambiente, agroecologia e segurança alimentar, tanto na comunidade como em escolas, universidades e eventos. Também participa de redes de articulação em defesa de políticas públicas de gestão de resíduos e agricultura urbana.

Para Cíntia, as ações voltadas ao meio ambiente na comunidade têm um impacto simbólico muito significativo.

Continua depois da publicidade

— Chico Mendes é um ícone da luta pela preservação ambiental e pelos direitos das populações tradicionais e periféricas. O fato de a Revolução dos Baldinhos ter surgido na comunidade Chico Mendes, em Florianópolis, reforça esse legado de resistência e defesa do meio ambiente. A iniciativa resgata e atualiza os ideais de Chico Mendes e inspira outras comunidades a perceberem que também podem ser protagonistas na construção de soluções locais para questões ambientais globais — diz ela.

Atualmente, o projeto também trabalha com outras frentes, entre eles uma cozinha comunitária:

— Como tem pessoas sem acesso à alimentação saudável, a gente trabalha essa realidade através da cozinha-mãe.

Quem foi Chico Mendes?

Chico Mendes morava na cidade de Xapuri, interior do Acre. Devido ao ativismo que ia em defesa dos seringueiros e que lutava pela conservação do meio ambiente, foi morto em 22 de dezembro de 1988, praticamente na cozinha de casa.

A investigação da morte, que tomou proporções internacionais, levou às prisões de Darci Alves Pereira, que teria cometido o crime a mando do pai, o fazendeiro Darly Alves da Silva.

Continua depois da publicidade

Em 2024, o filho assumiu a presidência do Partido Liberal (PL) em Medicilândia, município do sudoeste do Pará. Logo depois, no entanto, foi destituído. Na época, Valdemar da Costa Neto, presidente nacional do PL, disse que “não tinha conhecimento” sobre o assassino de Chico Mendes ter assumido a presidência do partido na cidade do Pará.

Mesmo após o assassinato de Chico, a figura do ambientalista seguiu influenciando pessoas e ações no combate ao desmatamento.

Chico, por exemplo, teve grande influência na vida política de Marina Silva, atual ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, de quem era amigo. Recentemente, a política foi vítima de ataques em uma sessão no Senado enquanto respondia a parlamentares sobre proteção ambiental na Amazônia.

Em 2004, Chico Mendes foi reconhecido como Herói da Pátria. Já em 2013, o ambientalista foi declarado Patrono Nacional do Meio Ambiente. Atualmente, o ativista dá nome ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), um dos principais órgãos de proteção ambiental do Brasil.

Continua depois da publicidade

*Sob supervisão de Luana Amorim

Leia também

Mergulhador e morador de SC; o que se sabe sobre o militar expulso da Marinha por participação no 8 de janeiro

Venezuelano encontra dinheiro na rua e localiza dona para entregar em SC: “Era do aluguel dela”