No Brasil, apenas um em cada dez recém-formados nos cursos mais populares do país consegue uma vaga formal equivalente ao seu nível de capacitação. É o que diz um estudo realizado este ano pela solução de análise de dados Geofusion, da empresa Córtex.
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É o caso de Nathália de Menezes, de 25 anos, que se formou em Direito em 2022. Após se formar, procurou emprego na área jurídica por cinco meses, mas não conseguiu encontrar. Em junho de 2023, começou a trabalhar de recepcionista em um órgão público de Florianópolis, por meio de uma empresa prestadora de serviços de setores público e privado.
Nathália está no emprego porque precisava ter uma renda após a faculdade, mas continua estudando para concursos públicos para a área de Direito.
— Já tive mais esperança. Hoje em dia, eu me pergunto “será que consigo”? — diz.
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Mas Nathália não presta concursos públicos somente para sua área de formação . Alguns deles exigem apenas nível médio e são para funções administrativas, e outros, da segurança pública, por exemplo, exigem formação em qualquer curso superior.
Por que é difícil trabalhar na área de formação
É isso que pode explicar o dado de que apenas um em cada dez recém-formados dos cursos mais populares do país está em um emprego na área de formação, segundo o professor do Departamento de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), lúri Novaes Luna, que também é especialista em Psicologia Organizacional do Trabalho. O Direito está entre as quatro graduações mais procuradas do Brasil, seguido por Pedagogia, Administração e Enfermagem.
— Tem vários concursos públicos que não necessariamente envolvem a área jurídica. Por isso, os dados não necessariamente significam que a pessoa esteja trabalhando com algo que não exija curso superior — explica o especialista.
O estudo da Geofusion também aponta que, entre os cursos mais procurados do país, o percentual dos graduados que conseguem um emprego no modelo CLT correspondente à formação fica entre 3,4% e 15,5%. A pesquisa avaliou dados de 400 mil recém-formados.
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É o caso de Bruna Tessaro, de 22 anos, que é estudante de Pedagogia na Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), em Erechim, Rio Grande do Sul. Ela irá se formar em agosto deste ano, mas não irá atuar na área.
— Conforme eu fui aprofundando os estudos durante o curso e conhecendo melhor área da Pedagogia, como ela trabalhava e quais eram as possíveis áreas, eu percebi que realmente não era algo que eu gostaria de atuar — explica.
Ela também afirma que, ao entrar no curso, já sabia que não pretendia trabalhar em escolas, mas que tinha interesse nas áreas da saúde. Mas isso mudou.
— Tive algumas matérias durante a graduação, porém, foi algo que não despertou tanto o meu interesse quanto eu achei que despertaria, aí eu decidi por não seguir nessas áreas — relata.
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Assim que se formar, Bruna continuará trabalhando no RH e departamento pessoal de um escritório contábil, no qual já trabalha desde o ensino médio. Para Iúri, esse comportamento é cada vez mais comum.
— Ter uma formação te ajuda a se comportar no mercado, que está cada vez mais flexível e amplo. Não atuar na área em que você se formou é bastante comum e não significa que a pessoa está necessariamente num emprego precário ou abaixo da sua capacidade — diz.
Para ele, a universidade forma o sujeito para que ele tenha a capacidade de se adaptar às mudanças do mercado de trabalho, ao desenvolver as “soft skills“, que é como o profissional lida com o outro e consigo mesmo em diferentes situações e como ele desenvolve as habilidades de comunicação, resolução de problemas, trabalho em equipe e liderança.
— Depois de formada, a pessoa pode seguir aquilo que ela se identifica mais. Muitas vezes, a pessoa faz um curso e, ao longo do tempo, desenvolve outros interesses. Se ela tem uma boa formação, isso vai abrir muitos caminhos — explica.
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É o que se assemelha à situação de Lucas Sant’Ana Moysés Khoury, de 27 anos, que se formou em Engenharia de Produção Elétrica na UFSC, em 2021, e atualmente trabalha numa agência de marketing em Florianópolis.
Lucas conta que escolheu o curso de engenharia principalmente por influência do pai, que também é engenheiro.
— Em um primeiro momento, eu realmente me identificava e queria cursar engenharia. Mas ao longo do curso, apesar de achar muito interessante a parte da elétrica, foi ficando muito difícil, e eu já não estava gostando tanto. Era um esforço muito grande para algo que eu não estava me imaginando fazer futuramente. Eu terminei, mas realmente não aconteceu — explica.
Lucas conta que entrou em contato com a área do marketing ainda durante a faculdade, devido ao “empurrãozinho” de um amigo, que o incentivou a começar a estudar a área.
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— Eu tinha esse amigo que já trabalhava com marketing digital. Na época, ele fazia o que a gente chama de drop shipping, e eu achei super interessante e resolvi perguntar. Comecei a estudar por fora e estava criando esse conhecimento paralelo ao curso — relata.
Ele explica que, durante a faculdade, era comum ter colegas da engenharia que já trabalhavam em outras áreas, como o marketing, por não se identificarem tanto com o curso.
Migração para outras áreas é comum
O especialista em psicologia organizacional do trabalho, Iúri Novaes, explica que isto é muito comum na área “das engenharias”.
— Hoje, você vê muitos engenheiros contratados na área da administração como gestores de empresas, gerentes, diretores, líderes, e não necessariamente na área da engenharia — diz.
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Lucas teve o primeiro contato com o marketing por meio de um estágio na área de vendas, enquanto ainda estava na faculdade. Ele conta que, neste estágio, criou mais proximidade com a área. Após se formar, conseguiu uma oportunidade de gestor de tráfego pago em uma agência de marketing, e exerce esta função até hoje.
Os estágios têm uma função importante na vinculação do aluno com o mercado de trabalho, segundo Iúri.
— Se o aluno tem experiências de trabalho práticas fora da aula, durante o curso, ele acaba tendo uma formação mais ampla — explica.
Para ele, é por isso que é importante que o aluno se envolva com todas as oportunidades que a universidade oferece, porque o diploma não é o suficiente para o desenvolvimento no mercado de trabalho, ainda mais com a flexibilidade atual que ele apresenta.
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Aumento de brasileiros nas universidades
O número de estudantes que chegaram às universidades em 2022 apresenta um recorde: foram 9,4 milhões de pessoas, de acordo com dados mais recentes do Censo da Educação Superior do Inep. Já de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 19,7% dos brasileiros têm formação universitária, o que representa o dobro do percentual do início da década passada, que era de 7,9%.
O que explica este dado, segundo Iúri, não é necessariamente o aumento do interesse dos jovens pela formação superior, e sim a expansão das instituições.
— Hoje, as universidades possuem alunos que jamais teriam a oportunidade de estar nelas há 25 anos. Houve uma expansão muito grande tanto das particulares quanto das públicas — diz.
Ele também diz que a ampliação de vagas para cursos de ensino a distância (EaD) e as políticas afirmativas, como as cotas, têm impacto neste dado.
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Mesmo com os dados positivos, o índice de jovens nas universidades ainda é baixo, de acordo com o Censo da Educação Superior 2022: menos de 25% dos jovens de 18 a 24 anos acessam o ensino superior no país.
*Sob supervisão de Andréa da Luz
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