— A minha melhor profissão é essa daqui.

É assim que Aristides Pedro Garcia define seu serviço voluntário como barbeiro no Hospital Regional de São José e no Instituto de Cardiologia, na Grande Florianópolis. E o aposentado de 77 anos tem propriedade para falar em trabalho. Começou na lavoura, plantando e também “puxando madeira”. Mas na carteira de trabalho, é a profissão de motorista que aparece.

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Primeiro dirigia caminhão em Angelina, município da Grande Florianópolis onde foi criado e passou boa parte dos anos. Depois foi condutor de ônibus de linha. A aposentadoria veio em 1990. Por insistência da mulher, que já era voluntária da Associação Amigos do Hospital Regional de São José ( Aamhor), Aristides começou a fazer a barba dos pacientes. A “nova profissão” já dura 10 anos.

— Enquanto Deus me der saúde e força de vontade de viver, vamos fazer — reforça.

Se depender da disposição de Aristides, esse trabalho não para tão cedo. Todas as terças- feiras de manhã, assim que chega para o serviço, pega as fichas dos pacientes que querem fazer a barba. Então parte, com a maleta azul de utensílios e passos rápidos, rumo aos quartos. Dispensa o elevador e sobe os três andares pela escada “para desenferrujar”.

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Quando chega no leito do paciente, veste as luvas e começa o serviço, com movimentos calmos e precisos. Enquanto passa o creme de barbear, a primeira pergunta para iniciar a conversa é sempre a mesma: de qual cidade o paciente vem. As respostas já lhe renderam boas surpresas. Recentemente, no bate- papo descobriu um velho conhecido, que fez primeira comunhão com ele.

— Tem coisa que acontece aqui que assusta a gente — resume o senhor, de sorriso tímido.

Mas as coincidências também emocionam. Ao aparar uma barba, Aristides reencontrou no hospital um senhor que trabalhou para seu falecido pai na serraria. A história enche de lágrimas os olhos azuis do barbeiro.

Aristides é um dos 100 voluntários da Aamhor, associação que conta com pessoal para fazer visitas aos pacientes, confeccionar chinelos, distribuir roupas e enxovais doados. O presidente da associação, Romualdo Leone Tiezerin, conta que é comum pessoas que vêm do interior do Estado apenas para fazer uma consulta e acabam precisando de internação. Assim ficam nos leitos, mas sem roupas, dinheiro ou companhia. Aí que entra o papel fundamental dos voluntários.

— Muitas vezes, a família não tem como visitar, e os voluntários acabam se tornando a família dele. Dá para dizer que 99% das pessoas que ajudamos nunca vimos e nunca mais vamos ver, mas é um ser humano debilitado, em uma situação triste e, às vezes, aquela é a última ajuda que ele vai ter na vida — afirma o presidente.

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Aristides complementa, ao responder o que é importante na hora de fazer a barba dos pacientes:

— Não pode fazer a pessoa ficar triste, tem que fazer ficar alegre. A gente conversa e, quando vê, a pessoa começa a rir.

O aposentado, que mora em São José, conta que aprendeu a fazer a barba dos outros quando era novo, aos 16 anos. Seu pai ajudava um vizinho de mais idade a realizar a função e quando ele não estava, a missão era do filho, o jovem Aristides. Mas faz questão de dizer que naquela época era bem mais difícil executar o serviço, porque usava uma navalha antiga:

— Aqui com esse aparelho é fácil, não machuca ninguém.

Além de não machucar, a lâmina de seu Aristides tem um efeito ainda maior nos pacientes: alivia a dor.

Como ajudar

Doação de roupas, sapatos, cobertas, enxovais e ser voluntário na Aamhor: ligar para 48 3271- 9014

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