Não basta ter vontade. Fazer trilha exige planejamento e segurança para garantir que a experiência não se torne um perigo. Entre as duas últimas temporadas de verão, o número de salvamentos, resgates e buscas em áreas de mata, trilhas e costões teve aumento em Santa Catarina. De outubro de 2018 até o início de março de 2019, foram registradas 2.639 ocorrências em território catarinense, 36% a mais em comparação com a temporada anterior, quando ocorreram 1.940 casos, conforme o Corpo de Bombeiros Militar do Estado.
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Por isso, é preciso se programar. A primeira coisa a ser observada antes de fazer uma trilha é o grau de dificuldade. Algumas delas requerem certo nível de condicionamento físico, que deve ser levado em conta na hora de escolher o trajeto, sobretudo quando a região é desconhecida.
O guia de turismo Geovane Altair da Silva organiza excursões em trilhas e cânions em diferentes regiões do Estado. Ele conta que muitos interessados em fazer a atividade não têm experiência.
— Muitas pessoas que não são acostumadas sequer a fazer caminhadas mais extensas às vezes querem fazer a trilha, mas é preciso ter atenção. Muitos vêm sem ter noção da dificuldade do trajeto, e a gente sempre tem que estar orientando — explica.
Silva acrescenta que é preciso conhecer e respeitar o preparo físico e técnico exigido no percurso, sobretudo para evitar acidentes. Ele costuma categorizar o nível de dificuldade das trilhas em uma escala de 1 a 10, em ordem crescente.
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— Costumo classificar de acordo com a dificuldade técnica e o esforço físico. Há trilhas como a da Lagoinha do Leste (no Sul da Ilha, em Florianópolis) em que há dificuldade de esforço físico porque há morros para subir. É uma das mais procuradas, por causa do Morro da Coroa, mas como tem que fazer escalada nas pedras, tem uma dificuldade acentuada. Por isso, a gente coloca ela como nível seis — exemplifica.
Por essa razão, Silva ressalta que é importante respeitar a recomendação do guia em relação ao que cada trilha exige.
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Necessidade de preparo prévio
A trilha do Rio do Boi, na Praia Grande, no Litoral Sul do Estado, e a Rota das Cachoeiras, em Corupá, no Norte, estão entre os locais que a arquiteta Maynara Mariano, de 30 anos, teve a oportunidade de conhecer. Para ela, quem decide fazer uma trilha precisa ter consciência do que poderá enfrentar.
— Não é um passeio, não é algo tranquilo, só para apreciar. É uma experiência que exige preparação prévia e toda uma estrutura para garantir a segurança de todos — afirma.
Ela planeja conhecer outros lugares, mas diz que, se dependesse da primeira experiência, possivelmente a vivência como trilheira acabaria ali. Maynara conta que, quando tinha 15 anos, foi fazer uma trilha no Cambirela, em Palhoça, com outras 20 pessoas, com idade entre 18 e 19 anos.
Em determinado ponto do trajeto, metade delas acabou se perdendo após o grupo ter que fazer um desvio. O trajeto era orientado por uma pessoa que já tinha feito a trilha, mas que não era guia de turismo, segundo Maynara.
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— Nenhum dos participantes tinha experiência. Fomos andando para procurar o caminho correto e em um momento ficou difícil de subir. Um garoto escorregou e, ao se pendurar em um bambu, acabou derrubando uma menina, que ficou desacordada. Ela desmaiava e voltava. Na época, não tinha celular, por isso não conseguimos pedir ajuda — lembra.
A trilha começou no início da manhã e terminou no fim da tarde, quando o grupo encontrou um caminho de volta. Só então a colega de Maynara foi levada ao hospital.
Para ela, a falta de preparo resultou na experiência ruim, já que o grupo não tinha levado mantimentos nem água suficiente para concluir o trajeto.
— Hoje em dia eu não faço mais trilha sem que tenha um guia experiente junto, porque é muito importante ter conhecimento e equipamentos adequados. A gente nunca sabe o que pode acontecer.
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Atenção ao uso do celular
O capitão Bruno Lisboa, comandante do Grupamento de Busca e Salvamento (GBS) de Florianópolis, afirma que a comunicação é fundamental na hora de fazer uma trilha. Além de ser um meio de pedir ajuda, também é útil para evitar preocupações.
— É bom sempre levar um celular, avisar alguém a que horas vai sair e retornar. Se for mudar o itinerário, é importante também avisar quem está esperando — orienta.
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Para isso, conservar a bateria do celular, mantendo o aparelho desligado durante o trajeto, é muito importante para garantir que ele funcione quando for necessário, como lembra o major do Corpo de Bombeiros Militar e comandante de Aeronave do Batalhão de Operações Aéreas (BOA) de Florianópolis, Túlio Tartari Zanin.
Ele salienta que locais com pouco sinal de internet, como as regiões de trilha, fazem com que esse processo de busca pela rede consuma a bateria rapidamente.
— Se possível, tenha um equipamento somente para fotos e filmagens e outro apenas para ligações e contatos com a emergência — sugere.
É preciso usar o celular com atenção na hora das selfies, sobretudo em áreas de costões.
— Deve-se evitar tirar selfies em locais que apresentem perigo, principalmente onde a água bate ou pode bater, pois essas pedras geralmente são mais escorregadias, por conter limo — ressalta Zanin.
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A primeira atitude é fazer uma pesquisa sobre a trilha. Procurar mapas, imagens de satélite e fóruns para saber o que as pessoas têm falado sobre ela. Depois, é necessário buscar uma pessoa que realmente conheça o local para que o trajeto seja guiado com segurança.
É importante também procurar trilhas bem sinalizadas e com trajeto conhecido para evitar se perder em meio à mata. Zanin acrescenta que a luz do dia é fundamental para quem vai fazer trilha.
Trilha também pode ser passeio em família
Fazer trilha é um ótimo meio de manter as crianças em contato com o meio ambiente, além de ser uma atividade física divertida. Mas é importante conhecer o local antes de se aventurar com os pequenos.
Mesmo no caso de trilhas de praias mais voltadas à caminhada, que exigem menos esforço físico, o guia de turismo Geovane Altair da Silva orienta que sejam feitas pesquisas sobre o local em pelo menos três fontes de informação diferentes.
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Dica dada também pelo auditor agropecuário André Barbosa da Silva que, desde 2012, costuma fazer trilhas junto com a família e registrar os passeios em um blog. Desde criança, ele acampava com os pais, já foi escoteiro e praticou montanhismo e alpinismo na Serra do Mar, no Paraná.
Mesmo com toda experiência e vivência, em maio de 2018 acabou se perdendo na trilha Caminho do Engenho, no Norte da Ilha, em Florianópolis, enquanto fazia o trajeto com a esposa e os três filhos de 10, 11 e três anos de idade.
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André conta que resolveu fazer o trajeto após ler sobre ele em um livro que falava das trilhas de Santa Catarina. Entretanto, quando chegou ao local, o caminho previsto tinha mudado.
— O livro estava desatualizado e acabamos nos perdendo. Além disso, o caminho não estava bem demarcado, o que acabou dificultando — recorda.
A família demorou uma hora a mais que o previsto até conseguir encontrar um caminho de volta à praia. Desde então, sempre que decide se aventurar em locais desconhecidos, conta com o auxílio de um profissional.
— Eu e minha esposa fazemos o trajeto com o guia e só depois, quando a gente tem certeza de que o caminho é seguro, é que levamos as crianças — afirma.
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Se mesmo com todas as recomendações de segurança algo sair do planejado, a primeira orientação é manter a calma.
— Nós sempre usamos a sigla ESAON: estacione, sente-se, alimente-se, oriente-se e, só depois, navegue — sugere o comandante Zanin.
Confira as orientações para fazer trilhas
• Não é recomendável entrar no mar próximo a costões, pois é nesses locais, junto às pedras, que se formam correntes de retorno. Se for subir no costão ou em uma trilha próxima, é preciso evitar ao máximo chegar perto da água.
• Mantenha-se sempre atento ao mar, à ondulação, e fique distante dela. Nunca pule de costões em direção à água, pois não há como saber o que tem embaixo.
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não esqueça de levar:
• Isqueiro, fósforos e, se for possível, uma pederneira — ferramenta utilizada para fazer fogo;
• Faca multiuso;
• Casaco e uma capa de chuva descartável, independentemente da condição climática. Eles serão muito importantes em caso de mudança no tempo;
• Comida, água, protetor solar,
repelente, boné ou chapéu.
• Roupas leves e de cores vibrantes, pois cores neutras se camuflam na mata;
• Medicamentos básicos;
• Lanterna, GPS e relógio com pilhas extras;
• Calçado adequado e confortável. Nunca faça trilha com um sapato novo, sandálias ou chinelos, pois certamente dificultarão a locomoção em meio à mata.
Saiba que fazer se tiver problemas ou se perder:
• Não saia andando desesperado, pois isso deixará você ainda mais desorientado.
• Procure uma área com sinal de celular para acionar o socorro. Ligue para o 193. Se for possível usar o 3G ou o 4G, envie a localização aos bombeiros por meio de aplicativo de mensagem. Isso ajudará na hora da busca.
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• Após conseguir contato com os bombeiros, mantenha-se atento ao telefone, pois é por meio dele que as equipes de resgate estabelecerão um canal de comunicação para adiantar os trabalhos de busca.
• Caso seja necessário o resgate com helicóptero, procure um local aberto onde seja possível avistar o céu.
• Acene com algum pertence de cor vibrante, gere fumaça (só tome cuidado para não causar um incêndio florestal) e aguarde o bombeiro que fará o resgate. Ele provavelmente irá ao seu encontro descendo de rapel do helicóptero.