A cantora e apresentadora Ana Vitória, a MC Trans, denunciou ter sido vítima de transfobia em um hotel de Blumenau, na noite desta quinta-feira (13). Em vídeos publicados no Instagram da artista, que soma mais de meio milhão de seguidores, o recepcionista diz que por conta de “problemas com travestis” não poderia recebê-la. Ela pretende levar o caso à Justiça.
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Ao NSC Total, a mulher contou que um assessor fez a reserva para ela e o marido no Hotel Salto do Norte, perto da BR-470. No final da noite, depois de um compromisso de trabalho, o casal chegou ao local. Enquanto o marido fazia o check-in, ela conversava com o motorista de aplicativo, que disse ser fã dela. Minutos depois, ao entrar no hotel para concluir o cadastro, veio o “choque”, como descreve:
— Ele [recepcionista] me olhou e disse: “Eu não sabia que era isso, a gente não hospeda esse tipo de gente”. Inicialmente eu fiquei sem entender, sem reação — lembra.
O casal passou a filmar a conversa. No vídeo, o funcionário diz que o dono do hotel é uma pessoa idosa, conservadora e que por conta de problemas com travestis, que se prostituem, ele não aceita clientes transexuais. “‘Não tem um espaço separado para isso”, diz o homem na gravação.
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— Eu tenho 35 anos, sou trans desde os 15… eu nunca vi uma transfobia tão escancarada. Estou me sentindo um lixo — lamenta.
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A cantora revela que chegou a explicar que não é prostituta, que a reserva já estava feita, mas não adiantou. O tom da conversa só teria mudado no momento em que o recepcionista soube que a mulher trans é famosa.
— Aí ele disse que ia quebrar um galho e deixar a gente ficar, mas que sabia que o patrão não ia gostar de saber — relembra.
MC Trans decidiu ir embora. Com chuva e sem ter para onde ir, conseguiu ajuda de uma amiga, que a abrigou durante a noite. A artista está na cidade há cerca de um mês para consultas que tem feito na Transgender Center Brazil, clínica de Blumenau especializada em saúde de pessoas transgênero e que é referência no país.
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Neste sábado (15), ela passará por uma cirurgia na pele. Planejava ficar no hotel por mais alguns dias, até estar recuperada o suficiente para voltar a São Paulo. Ela frequenta Blumenau por conta dos tratamentos que faz na clínica e diz que nunca sofreu algo parecido na cidade. Na semana passada, desfilou na Oktoberfest e agradeceu o carinho:
“Estava nervosa, a gente tem medo da transfobia, mas a cidade inteira me abraçou e respeitou”, comentou ao publicar os vídeos do desfile.
Nesta sexta-feira (14), porém, as publicações compartilhadas são de indignação. Abalada com o ocorrido, a apresentadora pretende conversar com os advogados nas próximas horas para definir o que pode ser feito. A princípio, deve registrar um boletim de ocorrência e processar o estabelecimento.
A criminalização da homofobia e da transfobia foi permitida pelo Supremo Tribunal Federal em decisão de junho de 2019. “Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito” em razão da orientação sexual da pessoa pode ser considerado crime. A pena em casos de condenação é de um a três anos, além de multa.
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Contraponto
O NSC Total entrou em contato com o hotel às 10h14min desta sexta e recebeu a resposta de que apenas a gerente do local poderia se manifestar. Na manhã deste sábado (15), a comunicação do hotel enviou um comunicado oficial.
Confira trechos da nota abaixo:
O Hotel Salto do Norte vem, através deste expediente, esclarecer, para todos os fins de direito e a quem possa interessar, que lamenta profundamente os episódios noticiados em plataformas sociais sobre fatos supostamente ocorridos em seu estabelecimento comercial e que tiveram repercussão à nível nacional. O Hotel Salto do Norte esclarece ainda, que não coaduna nem tolera qualquer tipo de discriminação, e repudia toda e qualquer violação aos princípios fundamentais constitucionais, principalmente o da isonomia [tratamento igualitário].
[…] Quanto à “reserva” supostamente realizada pela ofendida, a verdade é que a hotelaria recebeu uma ligação 30 minutos antes da presença dos hóspedes na recepção, oportunidade em que foi questionando sobre a disponibilidade de um quarto que comportasse um casal. Em resposta foi informado que haveria disponibilidade de um quarto, com acomodação para duas pessoas, com check-out obrigatório às 12:00 horas do dia seguinte – lotação decorrente da Oktoberfest. Após a ligação, estacionou um carro no pátio externo, e então somente o assessor da ofendida desembarcou do automóvel e se dirigiu à porta do hotel para fazer o “check-in”.
Assim que adentrou ao recinto, o assessor informou que as três pessoas da reserva pelo telefone chegaram, e perguntou o valor para três pernoites. O funcionário – que até então só tinha visto o assessor, sendo impossível a ele àquela altura praticar qualquer ato racista à ofendida – informou que a casa não comportaria aquela nova condição informada – por questões de responsabilidade pelo conforto, segurança e estrutura (café da manhã, por exemplo).
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[…] Sendo assim, o hotel lamenta que o contexto inicial dos fatos tenha sido ignorado pela ofendida nas narrativas dela. Note-se, que, no primeiro vídeo gravado e divulgado a questão do gênero – como impedimento ao abrigo pelo hotel – parte da ofendida, atribuindo aquela “justificativa” ao atendente como se tivesse partido dele. A questão do gênero foi presumida pela ofendida que buscava a todo custo a confirmação do atendente. Aliás, há indícios graves de que os vídeos divulgados foram selecionados em pontos específicos, cortados e divulgados fora de ordem para desvirtuar o foco da “lotação máxima excedida” e do “excesso de hóspedes por quarto” para “transfobia” – o que, à princípio, não ocorreu
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