*Por Audra D.S. Burch

Newnan, Geórgia – Era a tarde de sábado que essa cidadezinha do sul dos Estados Unidos tentava evitar: um grupo de neonazistas prometia fazer uma passeata no centro de Newnan para comemorar o aniversário de Adolf Hitler e protestar contra a imigração ilegal e a remoção de monumentos confederados.

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Newnan tinha orgulho de seu charme tranquilo. A cidade oferecia a vida típica do interior, pouco mais de 60 quilômetros a sudoeste de Atlanta, e ganhou o apelido de "Cidade das Casas" graças à sua arquitetura típica. Agora, em um dia primaveril de 2018, um grupo de neonazistas se reunia em um parque nos arredores da prefeitura, depois que o líder do grupo afirmou que eles preferiam realizar passeatas em cidades predominantemente brancas.

Porém apenas algumas dezenas de manifestantes nacionalistas brancos participaram do evento, e a Newnan que eles imaginavam já não existia mais. A população havia dobrado em menos de 20 anos, atraindo uma coleção cada vez mais diversificada de recém-chegados. Newnan estava mudando e muitas pessoas na comunidade queriam abraçar os novos tempos.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

Um ano depois da manifestação dos nacionalistas brancos, Newnan instalou 17 retratos em grande escala – imagens de pessoas comuns que vivem na cidade – nas paredes dos prédios do centro da cidade: Helen Berry, uma mulher afro-americana que trabalhou durante anos em uma confecção; Wiley Driver, um trabalhador branco que dobrava e embalava cobertores em uma fábrica local até morrer, em 2018; Jineet Blanco, uma garçonete que chegou a Newnan trazendo seus sonhos e tradições mexicanas; e as irmãs Shah.

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Um retrato de Aatika e Zahraw Shah usando véus foi exposto na lateral de um prédio vazio no centro de Newnan. As irmãs nasceram no estado da Geórgia e vivem em Newnan desde 2012, quando vieram de Athens, na Geórgia. Elas frequentaram o ensino médio em uma escola do condado. O pai das irmãs é engenheiro e veio do Paquistão com a mãe das jovens.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

A reação ao retrato das irmãs foi rápida e intensa. James Shelnutt estava dirigindo pelo centro quando viu a imagem. "Sinto que o islamismo é uma ameaça ao estilo de vida americano. Não deveríamos permitir retratos positivos disso", afirmou. Shelnutt foi ao Facebook e encorajou os moradores da cidade a se queixar. A postagem começou a angariar ataques anti-islâmicos e xingamentos. Alguns usuários se referiam ao 11 de setembro e argumentavam que os praticantes da fé islâmica são violentos.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

Uma mulher afirmou que não havia muçulmanos em número suficiente em Newnan para justificar o retrato das irmãs Shah na instalação fotográfica. O objetivo era que os retratos fossem inclusivos, questionassem velhos preconceitos e tirassem as pessoas das bolhas representadas por suas comunidades. O objetivo foi alcançado, mas também expôs como a imigração e a mudança demográfica transformaram a dinâmica racial que costumava definir os Estados Unidos, acrescentando novas camadas de ansiedade às velhas tensões que persistem em todo o país e em cidades pequenas como Newnan.

"Não sei se Newnan já tinha olhado para si mesma antes disso", questionou Robert Hancock, advogado e consultor imobiliário que, como presidente do programa de Residência Artística de Newnan, encomendou a instalação.

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Newnan era uma cidade-hospital e tratava soldados de ambos os lados da Guerra Civil. A cidade encontrou prosperidade na indústria algodoeira e, em determinado momento, Newnan era uma das cidades com maior renda per capita dos Estados Unidos. Atualmente, é a capital do Condado de Coweta.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

Quando Hancock se mudou em 1986, a cidade contava com cerca de 12 mil habitantes. A população de hoje se aproxima dos 40 mil, e o maior crescimento se deu entre 2000 e 2010. Somente nessa década, a população duplicou.

Os brancos ainda compõem mais da metade da população, mas os recém-chegados têm outras origens. A parcela de hispânicos mais que dobrou, ao passo que a população de origem asiática, embora reduzida, cresceu mais de cinco vezes entre 2000 e 2017. No mesmo período, a população negra caiu cerca de 13 por cento.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

O simples crescimento da cidade já levou a alguns conflitos. "As pessoas têm dificuldade de lidar com os números e se perguntam se vamos ficar mais parecidos com as cidades grandes de que não gostamos ou se vamos conseguir manter a atmosfera de cidade pequena", afirmou Cynthia Jenkins, a primeira vereadora afro-americana eleita na cidade, em 2003. "A cidade ficou grande demais simplesmente porque não reconheço todo mundo na feira?"

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

A instalação, chamada "Seeing Newnan" (Um Olhar sobre Newnan), foi criada pela fotógrafa Mary Beth Meehan. Meehan chegou a Newnan em 2016 como parte do programa Artist in Residence (Residência Artística). Ela havia criado retratos similares em sua cidade natal, Brockton, em Massachusetts, e mais recentemente também no Vale do Silício. Em Newnan, ela foi recebida de braços abertos, mas também com alguma desconfiança – afinal, era uma branca liberal vinda do norte que não conhecia muito o sul dos EUA.

"As pessoas tinham medo de ser retratadas como um bando de caipiras racistas", comentou Hancock. Ele se lembra de ter até questionado se a criação do projeto era uma boa ideia. Será que os retratos celebrariam o crescimento e a diversidade de Newnan ou reforçariam suas diferenças?

Meehan esteve na cidade durante momentos simples e grandiosos. A artista ficou mais de dois anos em Newnan e testemunhou momentos que revelaram a identidade da comunidade. "Newnan estava pronta para iniciar esse diálogo e a prova disso é que, apesar das tensões e dificuldades, as pessoas não me impediram de fazer meu trabalho. Elas continuaram me convidando para cá."

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

Meehan já havia começado a editar várias fotos da série quando fez uma de suas últimas viagens a Newnan, em outubro de 2018. Zahraw e Aatika estavam entre as pessoas retratadas durante aquela viagem, e, quando ela mostrou a imagem para Hancock um dia depois, ele fez uma pausa.

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"Instintivamente, eu sabia que aquela foto causaria controvérsia", afirmou. Mas Hancock decidiu que não se entregaria a medos irracionais e que o retrato das irmãs deveria estar entre os escolhidos. "As pessoas precisam abrir os olhos e ver como vivemos em um lugar lindo e diverso", afirmou.

As irmãs Shah conviviam com olhares e perguntas insensíveis sobre sua religião e seus véus tradicionais desde que começaram a usá-los no sexto ano. "Não faço ideia de quantas vezes nos disseram que somos literalmente as primeiras muçulmanas que conheceram. Tivemos de ensinar muitas coisas", comentou Zahraw, de 20 anos. Alguns habitantes de Newnan se manifestaram contra o retrato das irmãs no post de Shelnutt, no Facebook, questionando se realmente viviam em Newnan ou se realmente eram americanas.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

A postagem atraiu mais de 1.100 comentários, em sua maioria defendendo as irmãs e acusando Shelnutt e outros de serem racistas contrários à mudança e à liberdade religiosa. Shelnutt, que cresceu em Newnan e é dono de uma pequena empreiteira, negou que seja racista. "Não acho que as duas mulheres retratadas sejam radicais ou perigosas. Apenas não acredito que Newnan deva ser forçada a abraçar o islamismo", afirmou.

A reação fez as irmãs perceberem que boa parte da Newnan não se conhece. "Vivemos aqui há sete anos e, agora, algumas pessoas que viram nosso retrato acham que não fazemos parte da cidade simplesmente porque nunca tinham nos visto na rua." Os retratos de Meehan, que ficarão expostos até junho, já tiveram um efeito duradouro na cidade: deram início a conversas profundas entre pessoas que nunca haviam se conhecido.

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

"A verdade é que essas conversas são duras e desconfortáveis, mas precisamos dialogar", afirmou o pastor David Jones II, da Igreja Presbiteriana de Newnan, que planeja usar a instalação de arte para organizar um retiro sobre raça, gênero e identidade este ano. "Precisamos conversar mais sobre quem vive em nossa comunidade, se essas pessoas são diferentes e por que isso nos deixa desconfortáveis."

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(Foto: William Widmer / The New York Times)

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