Se o sucesso no esporte depende de competência e uma pitada de sorte, a jovem atleta Camila Flach está no caminho certo. Treinando no campo de uma escola no interior de Itapiranga, município de 16 mil habitantes localizado no Extremo Oeste de Santa Catarina, a adolescente de 14 anos soube o momento de trocar de categoria e treinou muito ao longo de 2019. Quando a oportunidade surgiu, teve talento para conquistar duas medalhas nos Jogos Escolares da Juventude, maior competição nacional da categoria, que tem Blumenau como sede principal neste ano e encerra neste sábado (30).

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A história de Camila com o atletismo começou há pouco mais de dois anos, na E.E.B. Humberto Machado, quando optou por disputar provas de velocidade. Insatisfeita com os resultados, ela decidiu com o treinador em apostar no arremesso de peso como segunda prova nas competições. A escolha foi acertada e a adolescente tornou-se campeã estadual da categoria alguns meses depois. As disputas de 75 metros rasos ficaram para trás, enquanto o lançamento de disco foi incluído no programa de treinamento.

Representando Santa Catarina após o título estadual, Camila chegou à disputa dos Jogos Escolares da Juventude com expectativa de alcançar a final, mas ciente das dificuldades. Afinal, ela ainda não estava sequer no ranking nacional por não ter cadastro na Confederação Brasileira de Atletismo (CBA), já que o custo para criar uma federação no Oeste é alto e não há viabilidade para ela treinar em Florianópolis. Além disso, iria competir com atletas mais experientes em disputas na categoria.

O semblante sempre empolgado da adolescente mudou no último domingo (24), durante a eliminatória para a final da disputa de arremesso de peso nos Jogos Escolares. Ela não "encaixou os arremessos" e terminou a disputa em 13º lugar, fora do grupo de doze atletas que se classificaram para a final no Complexo Esportivo de Timbó, município próximo a Blumenau onde ocorreram as provas de atletismo.

Quando já estava conformada com a eliminação e preparando-se para a disputa do lançamento de disco, Camila teve aquela pitada de sorte que todo bom atleta precisa. Ela soube que uma menina havia sido desclassificada da disputa do arremesso de peso e, por conta disso, a atleta catarinense competiria na final.

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— Eu digo que era pra ser. Na final eu entrei mais focada, mais confiante e pensando que iria dar tudo certo. Eu esqueci o dia anterior e foquei naquele dia para dar o meu melhor. Tentei entrar nas provas com o pé no chão e pensar que toda marca, por mais difícil que seja, pode ser batida — relembra a jovem.

A marca de 10 metros nunca havia sido superada pela adolescente, tanto que na fase eliminatória havia atingido 9,46m. Como em um roteiro típico de filmes esportivos de superação, Camila bateu o recorde pessoal e surpreendeu ao alcançar 12,06m no último dos seis lançamentos para garantir a medalha de ouro na competição. O arremesso da jovem de 14 anos representa a quarta melhor marca do ano no país na categoria sub-16.

No dia seguinte, Camila subiu novamente ao pódio na prova de lançamento do disco e conquistou a medalha de prata. Voltando do Vale do Itajaí com duas medalhas na principal competição da faixa etária, a adolescente espera ter o apoio necessário para conseguir verba para montar uma federação em Itapiranga e disputar as competições organizadas pela CBA a partir de 2020.

— Não esperava ganhar a medalha do peso e é um sonho pra qualquer um estar aqui. Após conseguir uma confederação pra competir, vou continuar no atletismo e cada vez crescer mais e buscar mais vitórias, quero ir para o nacional e dar o meu melhor — ressalta.

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Camila Flach na disputa do lançamento de disco, modalidade em que foi medalha de prata
Camila Flach na disputa do lançamento de disco, modalidade em que foi medalha de prata (Foto: William Lucas / COB)

Legado esportivo e social para os jovens

A experiência de competir com os melhores do país e a chance de conhecer atletas de diversos estados fazem parte do legado que Camila e outros cinco mil adolescentes levam dos Jogos Escolares da Juventude. Para muitos, também foi a oportunidade de ter o primeiro passo em direção ao sonho de integrar a seleção brasileira ou participar dos Jogos Olímpicos.

O crescimento da competição reflete nos atletas que disputaram competições internacionais pelo Time Brasil. Conforme o Comitê Olímpico Brasileiro, a delegação que disputou os Jogos Olímpicos de 2016 tinha 46 atletas, 10% do total, com os Jogos Escolares no currículo. Entre brasileiros que estiveram nos Jogos Pan-Americanos deste ano, em Lima, quase 60% dos atletas que participaram das 14 modalidades dos Jogos Escolares da Juventude também disputaram a competição de base nacional.

Para Kenji Saito, gerente de desenvolvimento esportivo do COB, a contribuição dos Jogos Escolares para a sociedade é ainda maior do que formar e revelar atletas de alto rendimento. O dirigente destaca que o evento tem caráter educativo, por conta da faixa etária dos competidores, com a necessidade de incentivar o estudo e a formação do cidadão. O COB também oferece um processo de capacitação para os treinadores se aperfeiçoarem, levando esse conhecimento para os colégios de todo o país.

— Nós temos diversos atletas olímpicos que passaram pelos Jogos, mas a grande maioria dos competidores não se tornarão atletas de alto rendimento. Por isso oferecemos a eles, por exemplo, o nosso programa de carreira do Jovem Atleta, que lançamos aqui. Assim eles podem ter conhecimento sobre educação, gestão financeira e gestão do tempo entre os compromissos escolares e esportivos — destaca.

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Kenji Saito ressalta que o caminho para quem sonha com a seleção brasileira é longo, mas que os Jogos Escolares da Juventude são um bom parâmetro para que os jovens atletas aprendam mais sobre o esporte e sobre a vida. Quem sabe alguns possam seguir os passos, por exemplo, das judocas Mayra Aguiar e Sarah Menezes, ambas medalhistas olímpicas, ou do jogador de basquete Raulzinho, que faz parte da seleção brasileira e atua na NBA, principal competição mundial da modalidade.

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