Uma mulher de 50+, nascida e criada na Barra da Lagoa, em Florianópolis, sai para nadar e quando volta para casa, encontra o espaço praticamente vazio — restam apenas cinco livros na prateleira. São obras com dedicatórias antigas, que Ana Catarina não consegue doar. É ali, diante do que sobrou, que ela decide reencontrar pessoas do passado para devolver a cada uma delas o livro que recebeu anos antes.
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Essa é uma das primeiras cenas de Livros Restantes, estrelado por Denise Fraga e dirigido por Marcia Paraiso, que chega aos cinemas no dia 11 de dezembro. Gravado em Florianópolis e com elenco que reúne artistas catarinenses como Vanderleia Will e Renato Turnes, o filme fala sobre reinvenção, afetos e o impulso de retomar sonhos interrompidos.
Em entrevista ao NSC Total durante a pré-estreia no Beiramar Shopping, no dia 10 de novembro, Denise contou que o convite para o longa chegou enquanto ela estava em Portugal. Ela sentiu a sensibilidade do roteiro e teve identificação imediata com a história. Entre o vai e vem de ensaios entre São Paulo e Santa Catarina, a atriz admite ter chorado ao ver o resultado final:
— É um filme sobre alguém que acha que ainda dá tempo de ser quem quer ser — resume.
Confira a entrevista com Denise Fraga
Denise, como chegou o convite para fazer esse filme?
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Quando a Marcia me ligou, eu tava em Portugal. Era o segundo filme que eu fazia lá, o Sonhar com Leões, que lançou esse ano também. Ela tava me chamando para fazer um filme sobre uma mulher da Barra da Lagoa que sempre viveu ali, nunca tinha saído de perto da mãe e da filha. E ela ia para Portugal, largava tudo aqui, vendia a casa… Na hora de desfazer as coisas, sobravam cinco livros com dedicatórias que ela não conseguia doar, e através desses livros ela ia atrás dessas pessoas, para montar um quebra-cabeça de entender quem ela é para poder partir.
Só esse storyline já me pegou. E o fato de eu estar em Portugal e chegar um convite do Brasil sobre uma mulher que vai para Portugal se reinaugurar… Eu falei: “Marcia, eu preciso fazer seu filme”.
Quando li o roteiro…. O roteiro é de uma sensibilidade! A Marcia entende de gente. Ela fez muito documentário, então ela é uma pessoa que ouve. As falas dos personagens, parecia que os personagens pulavam do roteiro. Muito vivos, muito gente “de verdade”.
E aí eu falei: “a gente tem que fazer caber [na agenda]”. Eu não podia, mas dei um jeito. Eu tava fazendo peça em São Paulo, vinha gravar de segunda a quinta, às vezes até quarta. Tem uma foto minha atirada no trapiche da Barra da Lagoa, dormindo, entre uma cena e outra. Mas super valeu [a pena]. A gente pegou todas as brechas de agenda e fez como deu. E foi lindo. Eu vi o filme e chorei que nem uma bezerra, porque é muito emocionante. É sobre uma mulher que acha que ainda dá tempo de ser quem ela quer ser. Uma pessoa que se reinaugura.
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O filme é muito inspirador. Não só para mulheres. Ele é muito feminino… Sempre lembro da frase do Tolstói: “fale de sua aldeia e falará do universo”. A Marcia sabe fazer isso como ninguém. Ela pega essa comunidade pesqueira da Barra da Lagoa, ainda do jeito que é, que ela quer mostrar, documentarista que é, em vez de ela fazer um documentário, escreve uma ficção para dizer tudo o que quer dizer. E toca em assuntos importantes, inclusive preconceitos que a gente precisa rever. A própria Ana Catarina descobre um preconceito que ela ainda não imaginava ter, que fizeram a sua trajetória ser o que é. É muito bonito o filme. E eu acho que vai inspirar muita gente a ir atrás do seu sonho.
Veja fotos do filme
E como foi construir uma personagem manezinha?
A Marcia falou: “esse sotaque manezinho é um sotaque incrível, mas que a gente tem pouca referência dele no Brasil”. É um sotaque que aparece pouco nas novelas e tal. E hoje em dia nem se usa tanto sotaque, graças a Deus — não tem mais aquela coisa de “tem que ter sotaque do Sul”, “tem que perder o sotaque”. O Brasil é um país continental.
Então eu faço um ritmo. Não é exatamente um manezinho. Também tem uma coisa dela ser casada com um carioca no filme, então é uma mulher que perdeu um pouco o sotaque. Mas eu faço um ritmo. Que eu tento um manezinho.
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Tu estavas fazendo duas peças, Eu de Você e O Que Só Sabemos Juntos na época da gravação de Livros Restantes. Como é a tua preparação para o teatro e para o cinema? E qual é a diferença?
Hoje eu tenho feito muito as duas coisas: teatro e cinema. Mas no teatro eu sou meio obcecada. Eu chego três horas e meia antes do espetáculo. É que eu inventei de fazer duas peças que são maratonas físicas pra mim. Então tenho que me aquecer como bailarina, aquecer a voz e tal… Tô até rouca agora.
No cinema, a gente vai aprendendo essa diferença de descer um pouco o tom. Mas uma coisa foi linda do filme é que eu vim antes ensaiar. Tivemos ensaios. Me encontrei com a Marcia na minha casa em São Paulo, fizemos algumas coisas por Zoom, depois vim ensaiar aqui. Fiquei dez dias aqui. Faz uma diferença danada, ensaiar como no teatro.
Em Eu de Você, você atua com uma banda só de mulheres, e Livros Restantes também tem uma equipe feminina bem grande. Qual é a importância de trabalhar com outras mulheres?
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Isso é uma coisa que a gente precisa urgentemente. Ter uma banda só de mulheres, por exemplo, é uma consciência que a gente precisa ter. O meio da música ainda é muito machista. A gente quis ter em cena uma banda só de mulheres. Agora, no O Que Só Sabemos Juntos, são cinco musicistas, mais dois de sopro. É difícil encontrar uma trompetista mulher. Mas a gente vai atrás. Essas ações são políticas, melhores do que qualquer discurso.
Meu produtor, o Zé Maria, é muito consciente disso. Por exemplo, a gente tem acessibilidade em todas as sessões: audiodescrição, Libras, monitoria de pessoas neurodivergentes. E só conseguimos isso porque temos lei de incentivo. O que vemos é que cada vez mais as pessoas pessoas vindo para o teatro que precisam dessa inclusão. Porque se você faz um dia só, isso ainda é exclusão — o “dia especial para surdos”, o “dia especial para deficientes visuais”. Então, a gente precisa entender essas ações políticas no nosso trabalho. A oportunidade tá na nossa mão.
E qual a expectativa com o filme?
Tô muito feliz. O filme é lindo. Mais do que um filme feminino, é um filme sobre a Barra da Lagoa, de Florianópolis. A Marcia Paraiso, que é essa diretora incrível, ela conseguiu falar tantas coisas, e ela não fala só para a mulher, ela fala para qualquer pessoa que ainda acha que dá tempo de reinaugurar a vida.
A Ana Catarina é um fenômeno que pode acontecer com qualquer um de nós, que entende que mesmo sendo 60+ eu posso ir atrás daquela Denise que eu quero ser, daquela Ana que quero ser, daquele Roberto que eu quero ser.
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Veja o trailer de Livros Restantes
Antonietas
Antonietas é um projeto da NSC que tem como objetivo dar visibilidade a força da mulher catarinense, independente da área de atuação, por meio de conteúdos multiplataforma, em todos os veículos do grupo. Saiba mais acessando o link.











