A novela das isenções fiscais em Santa Catarina avança para mais um episódio hoje. Para o alívio do setor produtivo, na semana passada o governador Carlos Moisés (PSL) enviou em regime de urgência para a Assembleia Legislativa (Alesc) dois projetos de lei que dão o pontapé na implantação da nova política fiscal do Estado. Desde dezembro, representantes de indústria e agropecuária, principalmente, perderam o sono por conta da iminente retirada de benefícios após a assinatura – por parte do então governador Eduardo Pinho Moreira (MDB) – de dois decretos que suspendem parte dos incentivos.
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A reportagem não teve acesso aos projetos originais, mas conforme o próprio governo e a Alesc, as matérias contemplam seis itens da cesta básica, que devem permanecer com a alíquota do ICMS em 7%, isentam totalmente de tributos o remédio Spinraza, usado por pacientes em tratamento contra atrofia muscular espinhal, e balizam algumas áreas do agronegócio, como comércio de suínos vivos, alho, erva-mate e madeira serrada.
Discussão sobre decretos também está na pauta
Além disso, a pauta de hoje prevê o início da tramitação, com expectativa de votação para amanhã, de outro projeto de lei sobre isenções, dessa vez de autoria da Comissão de Finanças e Tributação. A proposta da Casa suspende até a metade do ano a retirada de benefícios fiscais previstos nos decretos assinados em dezembro.
A matéria prevê a revogação da obrigatoriedade de o Executivo limitar a 16% o total da renúncia de receita para a concessão de isenções fiscais. O deputado Coronel Mocellin (PSL), líder do governo na Alesc, afirma não ver dificuldade no processo de aprovação dos projetos de lei e que, inclusive, deve haver unanimidade no plenário, pois há consenso entre os deputados para resolver a questão.
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— A ideia é tramitar com a maior brevidade possível. O presidente Julio Garcia também está imbuído na busca de uma rápida solução antes do segundo semestre para que todas as concessões sejam revisadas e concedidas de forma justa, até porque as empresas estão cobrando a gente — pondera Mocellin.
Repercussão das propostas por setor
Agropecuária
A Federação da Agricultura de SC (Faesc) afirmou ontem que está analisando os detalhes do novo projeto e ainda não classifica os impactos. Na semana passada, o presidente da entidade, José Zeferino Pedrozo, afirmou, em entrevista à colunista Estela Benetti, que é preciso tratamento igualitário ao setor frente aos Estados vizinhos.
Segundo o governo do Estado, 31 mil produtores serão favorecidos com o novo modelo fiscal, sendo 13,1 mil criadores de suínos, 1,8 mil de alho, 7,5 mil de erva-mate e outros 8,7 mil produtores de madeira.
Por nota, na semana passada, a entidade também manifestou apoio ao parlamento na iniciativa de protocolar o projeto de lei que prevê a suspensão dos efeitos dos decretos assinados em dezembro até julho deste ano, bem como a alteração de dois pontos aprovados na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) – limite de 16% concessão de benefícios fiscais e o prazo para que isso seja feito até 2022.
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Na oportunidade, Pedrozo classificou que as decisões da Alesc proporcionam segurança jurídica e estabilidade para a economia do Estado. Disse ainda que o setor da agroindústria “não tem condições de pagar essa conta”.
Varejo
Desde dezembro, quando a notícia da assinatura dos decretos veio à tona, entidades que representam o comércio catarinense demonstraram preocupação com a possibilidade de, frente ao aumento da carga tributária, empresas se evadirem do Estado, causando efeito negativo no varejo.
Ainda na semana passada, Ivan Tauffer, presidente da Federação da Câmaras de Dirigentes Lojistas (FCDL/SC), se manifestou por meio da assessoria de imprensa sobre a suspensão da vigência dos decretos que retiravam benefícios fiscais já em 1º de abril.
Na ocasião, Tauffer pontuou que houve sensatez por parte do Legislativo estadual e que a decisão foi acertada. Lembrou ainda que "a economia não pode esperar, sob pena de sofrermos desinvestimentos por insegurança jurídica". O empresário também citou a queda de arrecadação que isso geraria.
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Já a Fecomércio-SC, por nota enviada nesta terça-feira, ponderou que a insegurança jurídica, causada pela política fiscal do Estado, pode "afugentar empresas e segmentos estratégicos para competitividade da economia catarinense e diminuir o interesse do investidor em Santa Catarina". Disse ainda que a "batalha contra a majoração da carga tributária, especialmente no setor que responde pela maior fatia do PIB e da arrecadação de tributos (66% e 52,9%, respectivamente), é histórica para a Fecomércio SC".
Indústria
Ainda em fevereiro, quando o secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli, foi ao plenário da Alesc esclarecer os decretos que suspendem benefícios fiscais, a Fiesc ponderou, por meio do presidente da federação, Mario Cezar de Aguiar, que há uma guerra fiscal entre os Estados.
Com as mudanças no regime dos benefícios fiscais, a maior preocupação do industriário é o aumento dos custos de produção e a perda de competitividade perante os outros Estados. Na época, Aguiar ainda ponderou que se o impasse sobre os incentivos fiscais não fosse resolvido, outros problemas poderiam acometer o setor, como a redução das vendas e, em um efeito dominó, o fechamento de postos de trabalho.
Procurada pela reportagem na manhã de ontem para comentar os novos projetos de lei assinados pelo governador Carlos Moisés (PSL), a Fiesc afirmou, por meio de nota, que analisa os projetos e terá reunião na próxima sexta-feira com secretário da Fazenda, Paulo Eli, para aprofundar as questões técnicas. Segundo a entidade, "o diálogo e a transparência são fundamentais para uma boa solução à questão". A Fiesc avalia que os incentivos, como instrumento de proteção contra a guerra fiscal, "são imprescindíveis no caótico sistema tributário brasileiro".
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Setor madeireiro
*Por Estela Benetti
Cansado de ter que negociar anualmente decretos para garantir alíquotas de ICMS que permitam competir com outros Estados, o setor madeireiro de Santa Catarina ficou satisfeito com a decisão do governador Carlos Moisés de encaminhar um projeto de lei para a mudança de tributação ao setor. Assim, as novas alíquotas, após aprovadas, terão validade por tempo indeterminado, evitando essa necessidade de decreto anual, observa Dieter Erhard Grimm, presidente do Sindicato das Indústrias de Madeira do Médio e Alto Vale do Itajaí e da Central da Indústria da Madeira (Grupo Sindimade/Floema).
O setor madeireiro foi atendido porque foi um dos primeiros a se reunir com lideranças do governo do Estado para colocar o problema. Antes da apresentação do projeto à Assembleia, Grimm e o vice-presidente do grupo, Ricardo Rossini, se reuniram com a equipe técnica do governo do Estado e explicaram a situação.
A proposta para madeira serrada, que será ainda apreciada pelo parlamento do Estado, prevê três alíquotas a crédito presumido de ICMS para vendas a todos os Estados brasileiros. Quando o produto sai com alíquota de 17%, o crédito presumido será 6,3%, quando a saída é com alíquota de 12%, o crédito ficará em 4,5% e, no caso de alíquota de 7%, cai para 2,6%.
De acordo com o presidente do sindicato, essas alíquotas permitirão elevar o nível de atividade e a geração de empregos pelo setor em Santa Catarina, que atua com madeira renovável, especialmente pinus. O Estado também é grande exportador, mas as vendas externas são isentas de ICMS.
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O que o governo apresenta
Cesta básica
Seis itens de consumo popular na cesta básica seguirão com ICMS de 7%. São eles farinhas de trigo, de milho e de mandioca; massas alimentícias na forma seca, não cozidas ou recheadas; pão francês, de trigo ou de sal; arroz branco, parboilizado ou polido; feijão e leite esterilizado longa vida. No decreto assinado no fim do ano passado, a determinação era de que esses itens passassem a ter alíquota de 12%. Segundo estudo da Fiesc, isso poderia elevar a carga tributária da cesta básica em 71%.
Saúde
O medicamento Spinraza, consumido por pacientes com atrofia muscular espinhal (AME), teria ICMS isento. Hoje, o imposto para o remédio é de 17% – 5% em SC e 12% no Espírito Santo, onde a empresa responsável faz a importação. Segundo o governo, cada dose do remédio tem custo de R$ 355 mil (podendo variar de acordo com a cotação do dólar). A isenção geraria economia de, em média, R$ 100 mil por ano – cada paciente precisa de seis doses para completar um ano de tratamento.
Agronegócio
Quatro itens foram contemplados no projeto de lei do governador. São eles suínos vivos, alho, erva-mate e madeira serrada. Para quem vende suínos vivos fora de SC, a taxa foi mantida em 6% – os decretos de dezembro não alteravam em nada esse item que, segundo o governo, já tinha taxa de 6%, que foi mantida; alho passaria de 12% para 1,2%; erva-mate passaria de 12% para 5% para quem vende para fora de SC. Já a madeira serrada teria três bases de cálculo. A primeira, para quando a operação é interna, o ICMS que era de 17% agora passa a ser 6,3%; operações interestaduais passam de 12% para 4,5%, e nas operações para o Espírito Santo e Estados do Norte e Nordeste, a alíquota de 7% passa a ser 2,6%.
A tramitação
Os dois projetos de lei foram entregues na Alesc na semana passada. Conforme regimento interno, as matérias só começam oficialmente a tramitar depois de serem lidos em expediente. A primeira sessão após a entrada das propostas na Casa é hoje. Feito isso, por se tratar de questões tributárias, as propostas seguem para a Comissão de Finanças e Tributação. Caso haja algum pedido de vista, ou seja, de modificação, será preciso ainda que os projetos passem pela Comissão de Constituição e Justiça. Os projetos estão em regime de urgência e precisam ser totalmente apreciados e votados dentro de 45 dias a partir do início da tramitação.
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O que a Alesc apresenta
Vigência dos decretos
O projeto, de autoria da Comissão de Finanças e Tributação, suspende até 31 de julho os efeitos dos decretos 1.866 e 1.867, editados em dezembro do ano passado. Os documentos estavam previstos para entrar em vigor em 1o de abril.
Mudança na LDO
Alteração de parte da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que foi originalmente aprovada pela Alesc no ano passado, que determinava que, gradativamente até 2022, o governo só poderia abrir mão de até 16% da arrecadação de ICMS, IPVA e ITCMD. Mudança também no prazo para que a Fazenda analise todos os benefícios fiscais concedidos pelo Estado. O limite para isso, previsto no artigo 45 da LDO , era até 7 de janeiro deste ano. O projeto altera o prazo para 31 de maio, já que os trabalhos não foram concluídos em tempo.
A tramitação
Por tratar de assunto de natureza tributária, o projeto será analisado apenas pela Comissão de Finanças e Tributação. A expectativa é que a proposta comece a ser analisada hoje e seja votada na sessão ordinária de amanhã.