Dez dias após completar aniversário, uma criança de 2 anos morreu em uma Unidade de Pronto Atendimento de Canoinhas, no Planalto Norte catarinense. A família questiona o socorro prestado, entre os dias 24 e 25 de novembro, e denunciou a unidade à Polícia Civil.

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O menino estava em uma viagem com a família em Bombinhas, no litoral catarinense. Foi na cidade que apresentou os primeiros sintomas, no sábado, dia 22 de novembro, à noite. O menino se queixava de dor na cabeça, barriga e boca, além de apresentar vômito e febre.

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Como menino morreu

Após perceberem os sintomas, os pais da criança, Sérgio Nicoluzzi e Patricia da Silva, levaram-na até um pronto-socorro da região.

— Foi dito que ele não tinha infecção na garganta e que poderia ser início de uma doença viral que está sendo comum por lá. Porém, como ele não tinha tantos sintomas, poderia estar muito no início ou poderia ser uma gripe — conta o pai.

A família deixou a unidade com uma recomendação para monitorar os sintomas nas próximas 24 horas e uma indicação de medicamento. Ele não apresentou tosse, nem febre, mas ficou com coceira pelo corpo. Sérgio e Patricia, então, decidiram suspender o remédio indicado na primeira consulta, temendo uma reação alérgica.

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Durante todo o dia de domingo, o menino descansou, cochilou e tomou bastante água, a pedido dele próprio, segundo o pai. Na segunda, acordou melhor, mas ainda pedindo colo e tirando cochilos. Na volta para Canoinhas, na segunda-feira, a criança se manteve ativa e conversando com os pais.

— Quando chegamos em casa, por volta das 22h30min, ele foi para o sofá e chamou a mãe para ir com ele dormir. Porém, resolvemos ir com ele para a UPA para ter uma segunda opinião — relata.

A mãe e a criança foram direto para a área de triagem. Já nessa etapa, a equipe de plantão não conseguiu verificar os sinais vitais do menino, conforme o pai. Sem febre, o menino recebeu uma pulseira amarela para aguardar atendimento.

Cerca de 10 minutos depois, a família foi chamada para um dos consultórios. O médico plantonista afirmou que o menino estava com um pouco de placa na garganta, sinal que pode indicar uma possível infecção ou inflamação.

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— Eu falei que estava notando que ele estava com uma respiração cansada, porém o doutor examinou e falou que ele não tinha sinais de nada no pulmão. Foi então solicitado raio-x, exames de sangue e iam fazer medicação nele — conta o pai.

O menino, então, foi direcionado a uma sala para aguardar os exames e a medicação.

— Me relataram que o raio-x da UPA estava quebrado e que estavam encaminhando os pacientes para outra cidade para fazer o exame. E lá eles atendiam até as 24 horas, então meu filho iria poder realizar o exame no outro dia pela manhã. Como eu trabalho no hospital ao lado da UPA, perguntei se eu não poderia tentar realizar o exame de forma particular para não ter que esperar. E foi autorizado — relata.

Sérgio e Patricia então levaram o menino até o Hospital Santa Cruz, que fica a poucos metros da UPA. Lá, o menino passou pelo exame de raio-x e logo retornou à unidade pública por volta da 1h da madrugada.

—Mostramos o raio-x e o doutor falou que ele [o menino] estava com as alças abdominais distendidas. Perguntei sobre o pulmão, porém o doutor falou que o pulmão estava bom. Examinou ele e viu que o abdômen estava com barulho de eco — relembra.

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O pai afirma que o médico, então, entrou em contato com uma pediatra do Hospital Santa Cruz para consultar o caso. A médica pediu para internar o menino no hospital para investigar o quadro de saúde.

— Cerca de um tempo depois a pediatra chegou e, avaliando pessoalmente, falou que seria melhor encaminhar ele a Joinville para avaliação de um cirurgião, pois ele poderia estar com obstrução intestinal. Relatamos que naquele dia o menino evacuou duas vezes, o que ele fez pouco foi urinar. Diante disso, foi chamado o Samu para fazer o transporte — conta Sérgio.

Nesse tempo, o menino foi encaminhado à sala de emergência para fazer uma coleta de sangue. No local, o menino passou a ficar mais cansado e foi ofertado oxigênio a ele por meio de uma máscara. Pouco tempo depois, o Samu chegou à UPA para fazer o transporte do menino até o Hospital Infantil Dr. Jeser Amarante Faria.

— A médica do Samu veio conversar comigo que o estado do menino estava ficando grave. Que ele estava rebaixando e que achavam melhor entubar ele para a viagem, pois ele não estava respondendo à dor — afirma.

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Minutos depois, a família percebeu uma “movimentação estranha” no local e percebeu que o menino estava em parada cardiorrespiratória.

— 4h22min meu filho foi constatado como morto. Perguntei ao médico o motivo da morte, ninguém soube dizer. Um medico falou: “é algo inacreditável, ele estava bem e evoluiu muito rápido”. A médica, então, do Samu me aconselhou a encaminhar ele à Polícia Científica para investigar o motivo. Foi o que fizemos — afirma Sérgio.

Morte sob investigação

A família denunciou o caso e aguarda a conclusão de exames periciais que vão determinar a causa da morte do pequeno. De acordo com Sérgio, uma análise inicial já determinou que o menino não foi a óbito devido a algum problema no intestino, como uma hipótese levantada na UPA.

— Enterramos ele sem saber do que morreu. Ele não estava com febre, brincava, conversava, andava… Queremos saber o que aconteceu dentro da sala de emergência. O que causou a morte dele e o porquê desta piora repentina — diz.

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Além da apuração do caso no Laboratório Central de Saúde Pública de Santa Catarina (LACEN/SC), a família também registrou um boletim de ocorrência para que a morte seja investigada pelas autoridades. No documento, ainda consta o relato que a família recebeu de uma profissional da Polícia Científica, que confirmou que a morte é apurada como uma possível complicação de pneumonia.

O documento ainda cita que quando a família perguntou sobre o raio-x não ter indicado problemas nos pulmões, a médica disse que “havia sim presença de líquido nos pulmões e que estava atestando o óbito, mas que outros exames ainda seriam feitos.”

O que diz a UPA

Em nota, o Instituto Ideas, responsável pela gestão da Unidade de Pronto Atendimento de Canoinhas, afirmou que o menino foi acompanhando por uma equipe multidisciplinar desde a chegada no local.

“O prontuário confirma que todas as medidas clínicas necessárias foram adotadas, sem omissões ou atrasos. A criança deu entrada já em estado grave, com quadro de três dias de febre, prostração, vômitos intensos, desidratação e dor abdominal, evolução que se iniciou dias antes da procura pela UPA Canoinhas”, diz a administração da UPA.

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Conforme o instituto, o menino apresentou piora súbita, que evoluiu para uma parada cardiorrespiratória.

— Foram realizados 46 minutos de manobras de reanimação, com administração de medicações, intubação, reposição glicêmica e todo o arsenal terapêutico disponível, sem retorno da circulação espontânea, sendo o óbito declarado às 4h22min — detalhou.

Questionado, o instituto não comentou a denúncia sobre o equipamento de raio-x quebrado, que levou a família do menino a procurar uma unidade particular para fazer o exame de imagem. O espaço segue aberto para esclarecimentos.

Confira a nota na íntegra

“O Instituto IDEAS vem a público prestar esclarecimentos sobre o atendimento à criança G.N., ocorrido na UPA Orestes Golanovski, em Canoinhas, na noite de 24 para 25 de novembro.

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Desde sua chegada, às 23h06, a criança foi assistida por equipe multiprofissional, composta por médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e, posteriormente, pela equipe do SAMU e pela pediatra do Hospital Santa Cruz (HSCC), acionada e envolvida no caso desde os primeiros minutos. O prontuário confirma que todas as medidas clínicas necessárias foram adotadas, sem omissões ou atrasos.

A criança deu entrada já em estado grave, com quadro de três dias de febre, prostração, vômitos intensos, desidratação e dor abdominal, evolução que se iniciou dias antes da procura pela UPA Canoinhas. Após avaliação clínica inicial, foram realizadas medidas imediatas de estabilização, incluindo hidratação venosa, medicação, analgesia, suporte respiratório e monitorização contínua.

Contrariando informações que vêm sendo divulgadas, o prontuário registra que foi realizado exame de raio-X, que evidenciou padrão obstrutivo intestinal, indicando gravidade e necessidade de transferência para unidade hospitalar terciária. A coleta de exames laboratoriais foi tentada repetidas vezes, mas não obteve sucesso devido à condição clínica, especialmente à desidratação e ao colabamento venoso — situação esperada em quadros graves.

Com o agravamento progressivo, foi solicitada vaga zero via SAMU, e a transferência para o Hospital Jeser Amarante Faria, em Joinville, foi formalizada. Durante o período de espera, a equipe seguiu em atendimento contínuo, com suporte avançado, procedimentos de emergência, tentativas de novos acessos venosos, antibióticos de amplo espectro e demais medidas compatíveis com protocolos pediátricos.

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Já na presença da equipe do SAMU e da pediatra, a criança apresentou piora súbita, evoluindo para parada cardiorrespiratória. Foram realizados 46 minutos de manobras de reanimação, com administração de medicações, intubação, reposição glicêmica e todo o arsenal terapêutico disponível, sem retorno da circulação espontânea, sendo o óbito declarado às 04h22.

O Instituto IDEAS lamenta profundamente o falecimento e se solidariza com a família neste momento de dor. Reafirmamos que todo o atendimento prestado seguiu rigorosamente os protocolos clínicos e de urgência, sendo conduzido por múltiplas equipes médicas e de enfermagem que atuaram de forma integrada e contínua, empenhando todos os esforços possíveis.”