O prefeito de Florianópolis, Topázio Neto, anunciou uma medida polêmica: a criação de um posto da Secretaria de Assistência Social na Rodoviária de Florianópolis, para “garantir o controle de quem chega” à Capital catarinense. De acordo com o chefe do executivo municipal, que publicou um vídeo sobre o assunto nas redes sociais, mais de 500 pessoas já foram “devolvidas pelo trabalho da assistência social”. O caso ganhou repercussão nacional.

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O critério, segundo Topázio, é saber se a pessoa que desembarca dos ônibus que chegam à Rodoviária Rita Maria tem casa ou trabalho em Florianópolis. Se a resposta for não, a prefeitura “dá passagem de volta” para a cidade de origem.

No vídeo, o prefeito de Florianópolis mostra um homem que veio de um município do Estado, não citado pelo prefeito, sem vínculo com a cidade, segundo ele. A Secretaria, então, identificou um parente próximo do homem e o mandou de volta à cidade de origem.

Topázio ainda afirma que vai encaminhar esse caso para averiguação do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).

— Não podemos impedir ninguém de tentar uma vida melhor em Florianópolis, mas precisamos manter a ordem e as regras. Quem aqui desembarca deve respeitar as nossas regras e a nossa cultura. Simples assim — diz o prefeito.

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Veja o vídeo

Repercussão negativa

Desde domingo (2), quando o vídeo foi publicado, a fala de Topázio tem ganhado grande repercussão nacionalmente. Com isso, nesta quarta-feira (5), o prefeito publicou um novo vídeo, mantendo a posição do município sobre o controle de quem entra na Capital catarinense.

No novo vídeo, ele afirma que Florianópolis “não quer ser depósito de pessoas em situação de rua” e “se alguma cidade mandar para cá, nós vamos impedir, sim”.

“Se a pessoa chega aqui, sem saber onde vai dormir, sem qualquer plano de vida, é óbvio que foi despachada de algum lugar. Diferente do que fazemos aqui em Floripa, a gente não despacha ninguém, a gente trata. Só mandamos de volta quando contatamos a família na outra cidade. Respeitem a nossa cidade. Somos um povo acolhedor, onde a maioria da população já é de migrantes, mas não podemos perder o controle. Eu sou pago para defender os interesses dos moradores de Florianópolis e para manter a cidade como a capital mais segura do Brasil”, afirma.

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Confira o vídeo

Direito constitucional

O vídeo chegou ao conhecimento do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e será encaminhado às Promotorias de Justiça com atribuição na área da cidadania, para ciência e adoção das providências que julgarem cabíveis.

Já a Defensoria Pública afirma que “instaurou procedimento para apurar medidas que estariam impedindo o ingresso de pessoas em situação de vulnerabilidade em Florianópolis e determinando seu retorno às cidades de origem”.

Em nota, a Defensoria Pública afirma que o poder público deve manter “serviços socioassistenciais acessíveis e acolhedores para orientar e proteger quem chega ao município em busca de melhores condições de vida”, e que esses serviços devem existir para oferecer apoio.

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O órgão ainda frisa que a preocupação é com o discurso e com a abordagem, “que passam a ideia de que determinadas pessoas não são bem-vindas na cidade ou estão sendo identificadas e ‘devolvidas’ com base em critérios discriminatórios”.

Para a defensora pública Ana Paula Fão Fischer, coordenadora do Núcleo de Cidadania, Igualdade, Diversidade, Direitos Humanos e Coletivos, o vídeo de Topázio pode caracterizar uma violação à Constituição Federal.

“O vídeo divulgado pela Prefeitura traz um discurso de estigmatização e exclusão, ao dar a entender que pessoas pobres não podem permanecer na cidade. Além de ferir a dignidade humana, isso pode representar uma violação ao direito fundamental de ir, vir e permanecer, garantido pela Constituição”, afirma.

Ainda em nota, a Defensoria afirma que “não existe qualquer controle de fronteira entre municípios e que ninguém pode ser impedido de circular pelo território nacional por não ter emprego ou moradia”.

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“A remoção ou o transporte compulsório de pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade social é vedado por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e por legislações municipais que regulamentam o benefício eventual de passagem – que só pode ser concedido quando há vontade expressa da pessoa em retornar e comprovação de vínculo familiar ou comunitário na cidade de destino. Diante da gravidade dos fatos, a Defensoria Pública informa que irá acompanhar e apurar a situação, a fim de garantir que nenhum direito fundamental seja violado e que a atuação da assistência social em Florianópolis ocorra dentro dos princípios de dignidade, acolhimento e não discriminação que devem nortear as políticas públicas”, conclui a nota.

O que diz a Prefeitura de Florianópolis

Em nota, a Prefeitura de Florianópolis afirma que “mantém um serviço de assistência social na rodoviária municipal para dar suporte a todas as pessoas que chegam na cidade e precisam de alguma orientação”.

“Quando identificamos que essas pessoas chegam sem ter um contato de trabalho ou família, sem saber o que fazer e identificamos que foram enviadas a cidade por outros municípios, buscamos entender os motivos e enviamos de volta para a cidade de origem. É importante explicar que a assistência social sempre entra em contato com a cidade de origem e/ou familiares para dar o encaminhamento correto”, destaca.

Veja as notas na íntegra

Defensoria Pública

“A Defensoria Pública do Estado de Santa Catarina, por meio do Núcleo de Cidadania, Direitos Humanos e Ações Coletivas (NUCIDH), instaurou procedimento para apurar medidas que estariam impedindo o ingresso de pessoas em situação de vulnerabilidade em Florianópolis e determinando seu retorno às cidades de origem. A iniciativa ocorre diante da divulgação de que mais de 500 pessoas teriam sido “devolvidas” pela Prefeitura da capital.

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Para a Defensoria Pública, é essencial que o poder público mantenha serviços socioassistenciais acessíveis e acolhedores para orientar e proteger quem chega ao município em busca de melhores condições de vida. Esses serviços devem existir para oferecer apoio e encaminhamentos adequados, garantindo que ninguém fique desamparado.

O que causa preocupação, no entanto, é o discurso e a forma de abordagem adotados, que passam a ideia de que determinadas pessoas não são bem-vindas na cidade ou estão sendo identificadas e “devolvidas” com base em critérios discriminatórios.

“O vídeo divulgado pela Prefeitura traz um discurso de estigmatização e exclusão, ao dar a entender que pessoas pobres não podem permanecer na cidade. Além de ferir a dignidade humana, isso pode representar uma violação ao direito fundamental de ir, vir e permanecer, garantido pela Constituição”, destaca a defensora pública Ana Paula Fão Fischer, coordenadora do NUCIDH.

A Defensoria lembra ainda que não existe qualquer controle de fronteira entre municípios e que ninguém pode ser impedido de circular pelo território nacional por não ter emprego ou moradia. A remoção ou o transporte compulsório de pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade social é vedado por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e por legislações municipais que regulamentam o benefício eventual de passagem – que só pode ser concedido quando há vontade expressa da pessoa em retornar e comprovação de vínculo familiar ou comunitário na cidade de destino.

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Diante da gravidade dos fatos, a Defensoria Pública informa que irá acompanhar e apurar a situação, a fim de garantir que nenhum direito fundamental seja violado e que a atuação da assistência social em Florianópolis ocorra dentro dos princípios de dignidade, acolhimento e não discriminação que devem nortear as políticas públicas”

Prefeitura de Florianópolis

“A Prefeitura de Florianópolis mantem um serviço de assistência social na rodoviária municipal para dar suporte a todas as pessoas que chegam na cidade e precisam de alguma orientação. Quando identificamos que essas pessoas chegam sem ter um contato de trabalho ou família, sem saber o que fazer e identificamos que foram enviadas a cidade por outros municípios, buscamos entender os motivos e enviamos de volta para a cidade de origem. 
É importante explicar que a assistência social sempre entra em contato com a cidade de origem e/ou familiares para dar o encaminhamento correto.”