“É, eu ando em busca dessa tal simplicidade. É, não deve ser tão complicado assim”, canta Lenine em Simples Assim. Tal qual o músico pernambucano, muita gente nutre o anseio por uma vida mais fluida, mais próxima da suavidade de andar descalço pela casa do que da afobação ao volante ao ter de cumprir uma agenda abarrotada.
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Porém, boa parte das pessoas se acostumou a existir no modo automático das máquinas e nem percebe quão atrelada sua correria está à busca por um padrão de sucesso insaciável, sempre de olho na conquista seguinte.
Tanto acúmulo não abrirá passagem para um jeito mais arejado de levar a vida a menos que nos movamos devagar, refinando a percepção de nós mesmos e de nossas prioridades à medida que o autoconhecimento se aprofunda.
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“É um processo de desapego que acontece aos poucos. Com calma e paciência, descobrimos o que faz nosso coração sorrir e nossa alma se apaziguar”, afirma Luciana Pianaro, CEO e publisher da Vida Simples.
A complexidade que é viver
Viver com simplicidade é um valor cada vez mais indissociável de uma vida sã. Não há dúvidas quanto a isso. No entanto, existir, por si só, é um acontecimento complexo, e não devemos fingir o contrário. De acordo com a psicologia existencial, assim que nasce, o ser humano desembarca numa realidade atravessada por contingências que extrapolam o seu querer.
Difícil calcular a carga de angústia que isso nos traz. Como pode, cada um vai encontrando formas de lidar com essa complicação pré-adquirida. “Aprendemos muito cedo que não temos o controle dos acontecimentos em geral, ao mesmo tempo em que o mundo no qual vivemos nos oferece uma infinidade de dispositivos técnicos que criam a ilusão de controle”, formula a psicóloga Anna Paula Rodrigues Mariano, criadora do Espaço Cuidar.
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Se é simples, é de verdade
Veja que paradoxal: quanto mais nos lançamos em direção às coisas para possuí-las, multiplicá-las, moldá-las do nosso jeito exato, mais vazios nos sentimos. Porque, na maioria das vezes, elas não nos preenchem com significados profundos, que realmente façam valer nossa passagem pela Terra. Resultado: nossas forças se esvaem, arrastando com elas a alegria de estarmos vivos.
Como uma compensação natural aos excessos que permeiam a vida contemporânea, o anseio por simplicidade vem nos lembrar que não precisamos nos esfolar para manter tudo sob controle, correspondendo a ideais de desempenho e de adequação social que, não raramente, nos distanciam da nossa essência.
“Acolher as nossas questões com serenidade, dando o tempo necessário para cada processo que vivemos, sem a pretensão de agir na régua da velocidade e da eficiência, é uma experiência que nos aproxima de uma vida mais autêntica”, frisa Anna Paula.
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Trabalhando em um propósito coletivo
Talvez você esteja curioso para saber qual é o lugar da simplicidade no dia a dia de uma empresa cujo nome é justamente Vida Simples. Bem, já atravessamos períodos complexos, não pense que não! Mas também aprendemos a ampliar a consciência acerca do nosso papel, além de amadurecermos pontos cruciais para a fluidez do trabalho em equipe, tais como organização de processos, simplificação na comunicação e autonomia para o time.
“As pessoas sabem o que precisa ser feito e até onde podem ir sozinhas, têm espaço para opinar e, acima de tudo, acreditam no propósito, o que reforça o desejo de fazer daqui um lugar simples e fácil de se trabalhar”, detalha Luciana.
Adeus ao acúmulo
Apesar da vontade de descomplicar a vida, podemos nos esquecer do que nos basta. Por isso, vale se cutucar de vez em quando: “Ei, o que é suficiente para te acalentar?”. Nesse questionamento, ancora-se a filosofia minimalista, corrente que caminha na contramão do consumismo a fim de forjar uma vida centrada em experiências e relacionamentos significativos, valorizando as miudezas de cada dia.
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“Ser simples, na prática, significa desapegar do excesso e focar no que realmente importa, como uma faxina que vai eliminando tudo o que não é essencial e nos sobrecarrega. É viver com menos preocupações e estresse, menos bagagem física e mental, encontrando uma sensação de leveza e liberdade”, define Alexandre Chahoud, autor do livro Seja Minimalista — O Guia para uma Vida Mais Leve e Mais Feliz e criador do canal @seja.minimalista.
Comece de dentro para fora
A faxina sugerida pelo especialista inclui o dentro e o fora. “Internamente, é importante deixar de lado as expectativas excessivas, a autocrítica constante e a pressão para sermos perfeitos. Externamente, devemos nos livrar do acúmulo de objetos desnecessários, da necessidade de estar sempre conectado e disponível e da busca incessante por aprovação dos outros”, ele lista. O intento é equilibrar o ter e o ser, ou seja, dispor do suficiente para viver bem, mas sem ser escravo das coisas materiais e de uma agenda extenuante.
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Vivendo a vida com mais leveza
“Chique para mim é o simples. Ter uma horta é muito mais luxuoso do que ter uma Ferrari”, revelou a saudosa Rita Lee. Já Luciana Pianaro considera inestimáveis tanto a confiança que conquistou ao dizer “não” para aquilo que não fazia mais sentido para ela quanto a liberdade de viver aquilo o que realmente acredita. E você? Já alcançou a mesma clareza acerca do que faz sua alma suspirar satisfeita? Se ainda não, experimente pausar os insistentes “tenho que isso, tenho que aquilo”, substituindo-os por instantes substanciosos.
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Algumas ideias: apreciar o céu querendo ficar lilás no entardecer; sentir gratidão pelo alimento que nos fortifica; trocar sorrisos fraternos com desconhecidos pelas ruas; pegar a mão de um ente querido e, pela milésima vez, reconhecer aquela cútis única no mundo. Ou, então, pergunte a si mesmo: se eu tirar determinada coisa da minha vida, como sobreviverei sem ela? “A depender da resposta, você vai começar a descobrir onde estão os excessos”, incentiva Luciana.
Buscando refúgio na simplicidade
Uma vez reincorporada, a simplicidade dá notícias de sua regência sobre nossas vidas, pois, ao restituir nossa humanidade, ela nos devolve um bocado de paz. “Assim conseguimos silenciar o falatório externo que nos impede de escutar o que importa”, sublinha Anna Paula. “Com o simples, descobri a importância de definir meus valores e prioridades, bem como de direcionar minha energia para o que é vital, apreciando o presente”, relata Alexandre.
Não por acaso, Carl Gustav Jung, criador da psicologia analítica, terminou seus dias numa casa rústica à beira de um lago, esculpindo pedras, em sintonia com sua ancestralidade. Desse lugar, ele partilhou: “Quanto mais velho fico, tanto mais procuro refúgio na simplicidade da experiência imediata para não perder o contato com as coisas essenciais”.
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Por Raphaela de Campos Mello
É jornalista e descobriu, no tapete de yoga, uma simplicidade que foi se alastrando para o todo da vida. Para ela, que faz da escrita o seu servir no mundo, cada palavra pode carregar uma dose certa de poesia e, claro, simplicidade.
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