Na noite deste domingo “Roma” deverá ganhar o Globo de Ouro de melhor filme estrangeiro. Também é o favorito para levar o Oscar da mesma categoria, dia 24 de fevereiro. É um filmaço em toda sua singeleza e simplicidade em preto-e-branco. E ainda não chegou ao circuito de cinemas de todo o mundo.

Continua depois da publicidade

Revela lembranças de infância do diretor mexicano Alfonso Cuarón. As ruas de Roma, bairro onde viveu com a família classe média na Cidade do México; a amizade com os três irmãos; a indômita força da mãe; o abandono do pai; as relações com uma empregada doméstica de origem indígena (ela é a principal inspiração para escrever o roteiro e dirigir o filme, diz o próprio Cuarón).
Vi “Roma” duas vezes. Chorei as duas vezes.

Penso, por exemplo, em como teria sido minha infância em Santo Antônio de Lisboa. Aquele lugar lindo, aquele encantamento. Cheiros e músicas do mar, o calor amenizado pela brisa, os barcos pesqueiros, as cores do nascer e do pôr do sol, as ruas irregulares e seus moradores… 

Lembro e recrio minha infância em Brás de Pina, subúrbio do Rio. Mais precisamente na Jureia, pequena rua sem saída daquele bairro carioca de classe média-baixa. As festas na casa grande em que vivíamos. O som dos atabaques de um centro religioso nos melancólicos finais dos domingos. O Bloco da Vaca nos carnavais.

Os perfumes de uma vila de casas pobres. Célia, a primeira paquera frustrada. A dureza de voltar às aulas depois das férias. As constantes brigas de meus pais. As pipas e as peladas de futebol. O braço direito três vezes quebrado. As brincadeiras com minhas irmãs Sandra e Catia. O Fuscão abóbora de minha mãe. A cabeça inúmeras vezes rachada. O tricampeonato no México (que baita coincidência!) e as comemorações com fogos e balões colorindo o céu… Enquanto me divertia em toda minha pureza, a ditadura militar comia solta, prisões, torturas, mortes. “Roma” pode ser visto, por enquanto, em streaming.

Continua depois da publicidade

Trata-se de um espetacular relato sobre o politicamente conturbado México dos anos 1970. Acima de tudo, “Roma” é um monumental relato sobre como podem ser especiais e bonitas as banalidades da vida. Um filme imperdível.

°°°

Minha única resolução para 2019 é bem simples: manter distância de gente tóxica com egos exagerados, de malas-pesadas, de sujeitos empáticos de mão única, de gente hipócrita e sem um pingo de humanismo. Não há mais tempo a se perder com pessoas assim.

°°°
“Há duas épocas na vida, a infância e a velhice, em que a felicidade está numa caixa de bombons”, escreveu o poeta Carlos Drummond de Andrade em toda a sua despretensiosa grandeza.

°°°

Paz, paz, paz.