O procurador da República Claudio Cristani, membro da Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão (PRDC) do Ministério Público Federal (MPF), em Santa Catarina, comentou nesta quarta-feira a recomendação feita pelo órgão a universidades e institutos federais do Estado, para que se abstenham de atos que possam ferir os princípios constitucionais na educação. A PRDC também recomendou que as instituições de ensino tomem medidas para evitar assédio moral contra os professores.
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O procedimento é em resposta à publicação da deputada estadual eleita, Ana Caroline Campagnolo (PSL), que incentivou alunos a denunciarem professores que se manifestarem contrários à eleição de Jair Bolsonaro (PSL) à Presidência da República. A parlamentar eleita divulgou um número de telefone para denúncias, que teve pedido de bloqueio feito à Justiça pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).
Em entrevista, Cristani fala sobre o projeto Escola Sem Partido, censura na educação, e afirma que deputada tem que arcar com consequências do que disse.
Entrevista: Claudio Cristani
Quais serão os próximos passos do MPF em relação a esse procedimento?
Foi um assunto que pegou todos de surpresa, uma informação muito rapidamente propagada. No MPF procuramos direcionar mais para as instituições de âmbito federal, no sentido de recomendar que não tomem medidas contra os professores, e que se permita o livre exercício do magistério sem nenhum tipo de censura ou patrulhamento. A gente acredita que as universidades e instituições vão acatar, e é importante que a comunidade discente (alunos) tome conhecimento, como contraponto à forma de agir proposta pela candidata eleita.
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O inquérito pode ter novos desdobramentos?
A depender do desenrolar dessa recomendação, e do que pode ocorrer nos próximos dias, tudo nos leva a crer que o objetivo já foi alcançado. Não tem, no âmbito federal, uma medida mais concreta (que possa ser tomada) em relação à candidata. Ela tem direito à livre iniciativa, mas também tem se responsabilizar pelas consequências. Não vejo medida mais concreta a ser tomada, até porque o Ministério Público estadual (MPSC) já entrou com pedido de danos morais coletivos.
O projeto Escola Sem Partido está indo nesta quarta à votação. É algo debatido no âmbito do MPF?
É um assunto muito polêmico, presente, e me parece que de certa maneira os interlocutores dos dois lados não têm interesse em dialogar e falar uma mesma linguagem. De forma alguma nossa recomendação está legitimando que a atividade do professor é fazer política partidária em sala de aula, é claro que (isso) é errado. O que se quer proteger é o entendimento transversal, que se ensine e prepare no campo da cidadania, da política. É importante que haja bastante discussão, aprimoramento, mas por ser um assunto polêmico querem (trazer) por meio de legislação.
Há receio de novas situações como essa, enfrentada com a deputada eleita?
A Constituição traz matéria relacionada com a educação, e o constituinte deixou clara uma versão (de educação) crítica, universalista, de construção de cidadania. O problema é estabelecer diretrizes iniciais, e depois haver cobrança ou censura dos professores. Em relação à educação do Brasil há tantos problemas a resolver. Sabidamente, se fala isso, as universidades foram local em que o pensamento mais de esquerda prevaleceu. Meu medo é que se busque um revanchismo. Ficar batendo nesses pontos mais agudos é preocupante. Tomara que (a postagem da deputada eleita) tenha sido uma expressão mais impensada, de momento de euforia, e que esse assunto sirva de aprendizado para esquecer os pontos de conflito e buscar soluções para os problemas.
Entenda o caso:
A deputada estadual eleita por SC Ana Caroline Campagnolo (PSL) fez uma publicação em redes sociais na noite de domingo (28) oferecendo um contato telefônico para alunos enviarem vídeos de professores em sala de aula que estejam fazendo “manifestações político-partidárias ou ideológicas”:
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