Passados mais de dois meses do anúncio da taxação de 50% às exportações do Brasil para os Estados Unidos, as empresas prejudicadas aguardam o início do crédito prometido ao setor. Essa ajuda começa esta semana, adiantou para a coluna o diretor de Desenvolvimento Produtivo, Inovação e Comércio Exterior do BNDES, José Luis Gordon. Ele fala sobre as linhas que serão oferecidas pelo Programa Brasil Soberano em evento nesta quarta-feira na sede da Federação das Indústrias de SC (Fiesc), que também terá transmissão online.

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As liberações de crédito para esse programa podem chegar a R$ 60 bilhões, informa ele. Outra novidade do BNDES que acaba de estrear no mercado é uma linha de R$ 10 bilhões para financiar investimentos a indústrias 4.0. Além disso, o BNDES tem outras linhas do programa Nova Indústria Brasil (NIB) e todos também contemplam pequenas empresas. Leia a entrevista do diretor da instituição, José Luiz Gordon, a seguir:

Um dos temas da sua palestra na reunião da Fiesc será a linha de crédito do Programa Brasil Soberano, para quem foi afetado pelo tarifaço imposto por Donald Trump. Quando essa linha será liberada para as empresas acessarem os recursos?

– O Programa Brasil Soberano é importante. O governo do presidente Lula tomou medidas diante de um tarifaço colocado de forma unilateral, sem nenhuma correlação econômica, porque não existem razões econômicas para justificar esse tarifaço. O governo do presidente Lula tem olhado com muito carinho para o setor industrial, colocou a indústria no centro da agenda de desenvolvimento, voltou a falar em política industrial, criou a Nova Indústria Brasil. Entende que o setor industrial, o setor produtivo, o empresarial, é importante para o país e, por isso, criou o Brasil Soberano, que foi estruturado com algumas medidas.

Além disso, também vamos falar sobre a linha da Indústria 4.0, que é fundamental para a indústria que quer se modernizar, ampliar a capacidade produtiva, investir em eficiência energética e digitalização. Portanto, vamos falar sobre o Brasil Soberano e sobre a nova linha da Indústria 4.0, destinada à aquisição de máquinas e equipamentos. O parque fabril brasileiro tem, em média, mais de 15 anos de idade e precisa ser modernizado. Esse é um dos focos.

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O Brasil Soberano, nesta semana, ele já poderá ser acessado pelas empresas e nós esperamos que, assim que começar a operação, as empresas possam utilizar a linha de crédito, tanto diretamente no BNDES quanto de forma indireta, pelos bancos parceiros.

E como as empresas devem proceder?
O que nós recomendamos é que as empresas já comecem a procurar os seus bancos parceiros ou o BNDES, conforme o caso, para iniciar o processo de habilitação. Então, nesta semana a linha estará disponível para as empresas se beneficiarem. É importante lembrar que o pacote é de R$ 40 bilhões. Ou seja, todas as empresas afetadas pelo tarifaço, seja em 50%, 25% ou 10% do faturamento, terão algum tipo de linha.

Aquelas que estão no tarifaço de 50% e que tiveram pelo menos 5% do seu faturamento impactado terão acesso às linhas mais incentivadas. As demais terão acesso a linhas diferenciadas que o BNDES está propondo para ajudar. Essas linhas mais incentivadas têm taxas de juros entre 6% e 10% ao ano e podem ser usadas tanto para capital de giro, inclusive o que chamamos de capital de giro para diversificação, ou seja, para explorar novos mercados de exportação, quanto para aquisição de máquinas, equipamentos ou outros investimentos.

Os benefícios serão diferentes conforme os impactos sofridos pelas empresas?
– O funcionamento será mais ou menos assim: empresas que tiveram mais de 20% do faturamento impactado terão acesso a todas as quatro linhas: capital de giro, capital para diversificação, investimento e bens de capital. As que ficaram entre 5% e 20% terão acesso à linha de capital de giro para diversificação, que também é bastante incentivada.

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Além disso, as pequenas empresas desse grupo poderão contar com os fundos garantidores. Esses fundos são para todos, mas são ainda mais relevantes para as pequenas empresas, que muitas vezes têm dificuldade para acessar crédito. O governo fortaleceu o fundo garantidor do BNDES, o FGI, e o fundo garantidor do Banco do Brasil, o FGO. Assim, as pequenas empresas poderão acessar as linhas com garantia. Isso soma R$ 40 bilhões em crédito, mais os fundos garantidores, que podem alavancar até mais R$ 20 bilhões.

Então, no total, o apoio do governo para os setores atingidos pode chegar a R$ 60 bilhões.
– Pode chegar a isso, sim.

Quando falamos de pequenas empresas com recursos do fundo garantidor, elas devem procurar diretamente o BNDES ou o Banco do Brasil? Ou podem procurar outros bancos credenciados?
– Elas devem procurar os bancos parceiros, porque são eles que sabem acessar os fundos garantidores. Pequenas e médias empresas devem procurar seus bancos parceiros. Já as grandes podem procurar tanto os bancos parceiros quanto o próprio BNDES para estruturar seus projetos.

O senhor já circulou por alguns estados do Brasil. A expectativa é de grande demanda por essas linhas ou não tanto assim?
– Estamos recebendo muitas consultas de empresas. Alguns setores têm se destacado, como o de máquinas e equipamentos, que foi bastante afetado. Já estive na Abimaq, que representa o setor. O setor de alimentos e bebidas também sofreu e tem buscado informações.Então, há um conjunto de setores que têm procurado mais. Estamos escutando, mas muitas empresas ainda aguardam para confirmar se estão dentro ou fora do critério de 5% de faturamento impactado.

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Já realizamos eventos com as federações do Paraná e de Minas Gerais, com a Abimaq, com a Fiesp e agora com a Fiesc. Vamos também fazer com as federações do Rio Grande do Sul, Rio Grande do Norte, Pará e outras. Além disso, vamos realizar um grande feirão em várias cidades do Brasil, levando a equipe do BNDES e dos bancos parceiros.

Esses recursos terão diferenciação, por exemplo, para empresas atingidas pela tarifa de 50% e para outras com 25%?
– Exato. As taxas mais incentivadas são para as empresas que foram afetadas pelo tarifaço de 50% e que tiveram ao menos 5% do faturamento impactado. Para quem teve acima de 20%, as condições são ainda mais vantajosas. Mas também há um conjunto de alternativas para empresas em outras situações.

Quer dizer, quando o senhor fala acima de 20%, é quem tem um faturamento afetado acima de 20% em função da tarifa de 50%, é isso?
– Isso, perfeito. Agora, também há casos de empresas com tarifa de 25% ou 10%. Essas também terão linhas, mas são linhas do BNDES, que estamos disponibilizando, inclusive com recursos, por exemplo, da LCD, para poder apoiá-las. Nós também, em alguns casos, estendemos o prazo de pagamento para ajudar essas empresas. Fizemos algumas mudanças para que todas tenham algum tipo de linha de crédito, contribuindo nesse momento de recuperação.

E quanto ao cenário internacional, ainda não há negociação entre os presidentes, não existe abertura do governo americano. Mas a expectativa é de que se consiga um acordo com os Estados Unidos para reduzir as tarifas. Como vocês olham para esse cenário?
O presidente Lula é um democrata que está aberto a conversar com todos os presidentes. Ele está aberto ao mundo para dialogar, como tem dito constantemente. Essa é uma pauta mais ligada à Presidência da República, então não cabe a mim aprofundar minha opinião.

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O senhor vai falar também sobre as linhas do BNDES para a Indústria 4.0. Como está esse recurso? Qual é o custo e quem pode acessá-lo?
– Esse é um recurso muito interessante. Nós percebemos dentro do governo que precisamos ajudar o setor empresarial a aumentar sua produtividade, eficiência energética e inserção no mundo digital. No âmbito da Nova Indústria Brasil, o presidente Lula pediu que criássemos uma linha específica para apoiar a modernização da indústria.

Nesse contexto de inteligência artificial e digitalização, lançamos essa linha: R$ 10 bilhões do BNDES e mais R$ 2 bilhões da Finep, totalizando R$ 12 bilhões. A da Finep é concentrada no Norte e Nordeste; a do BNDES é para todo o Brasil. Ela atende pequenas, médias e, também, grandes empresas, com foco maior nas pequenas e médias. Esse recurso permite trocar maquinário e modernizar parques industriais.

Os últimos estudos apontam que as máquinas no Brasil têm, em média, 14 a 15 anos, e isso mostra a necessidade de atualização. O BNDES financia apenas máquinas e equipamentos com conteúdo local, ou seja, produzidos no Brasil. Indiretamente, isso também ajuda o setor de máquinas e equipamentos, que foi prejudicado pelo tarifaço, pois parte da produção que não conseguiu ser vendida para os EUA poderá ser absorvida pelo mercado interno.

Essa linha já estava sendo planejada antes do tarifaço, mas veio somar. Ela tem taxa de juros a partir de 7,5% ao ano, mais os spreads do BNDES, e já está disponível. As empresas podem procurar seus bancos parceiros ou o próprio BNDES para acessar o crédito e adquirir máquinas e equipamentos.

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Quando foi lançada essa linha?
-Lançamos uma semana depois do Programa Brasil Soberano. Começou a operar na semana passada. É um recurso incentivado, com juros de 7,5% mais os spreads, pronto para pequenos, médios e grandes empresários. Santa Catarina, que tem um setor industrial moderno, certamente poderá acessá-la.

E há algum prazo de carência?
Normalmente, de um a dois anos de carência e até 10 ou 12 anos para pagamento.

Sobre o recurso da Finep: ele é exclusivo para Norte e Nordeste. Mas tem indústrias de Santa Catarina com fábricas nessas regiões. Funciona da mesma forma?
– Exatamente igual. A linha do BNDES e da Finep têm as mesmas condições. A diferença é que a da Finep se concentra no Norte e Nordeste, enquanto a do BNDES vale para todo o país.

E em relação à Nova Indústria Brasil? Foram lançados R$ 300 bilhões para os quatro anos de governo. Como está a execução desses recursos?
Quando lançamos a Nova Indústria Brasil, a meta era de R$ 300 bilhões, dos quais o BNDES era responsável por cerca de R$ 250 bilhões. Hoje, esse volume já dobrou: estamos em R$ 600 bilhões, com participação do Banco do Brasil, Finep, Caixa, Banco do Nordeste, Banco da Amazônia e o BNDES. Até agora, já apoiamos R$ 238 bilhões em projetos industriais no Brasil.

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A meta inicial de R$ 259 bilhões (2023-2026) foi elevada para R$ 300 bilhões, e estamos avançando rapidamente. Estamos especialmente em busca de bons projetos de inovação, que contam com a taxa mais barata, vinculada à TR. Projetos de pesquisa, desenvolvimento e tecnologia podem ser financiados com juros entre 1% e 1,5% ao ano, mais os spreads do banco.

Santa Catarina tem uma indústria inovadora, que pode acessar essas linhas. Também temos a linha do Fundo Clima para descarbonização, com taxa de 6,5% ao ano, extremamente atrativa. Essa linha praticamente não existia antes do governo Lula: eram apenas R$ 300 a 500 milhões por ano.

Em 2023, foram R$ 10 bilhões, e em 2024 já são R$ 14 bilhões, podendo aumentar ainda mais. Além disso, há a agenda estratégica de exportação. O BNDES voltou a apoiar a exportação de bens industriais, ajudando empresas brasileiras a conquistar mercados.