Em 2018, após perder filho de 23 anos devido a um câncer na coluna, o ex-diretor de política monetária do Banco Central do Brasil, sócio fundador e presidente do conselho de administração da Jive Investiments, Luiz Fernando Figueireto, fundou o Instituto Fefig, voltado à educação. A ONG foi criada para homenagear o filho Luiz Felipe Figueiredo, que foi um guerreiro contra a doença diagnosticada aos 10 anos e deixou um legado exemplar em favor da educação e da espiritualidade.
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– Eu já tinha alguma atuação social, mas depois que ele faleceu decidi criar algo mais estruturado, perene. Queria fundar um instituto que ajudasse o maior número possível de crianças. Essa foi a motivação. Escolhemos a educação como foco porque, embora toda ação social seja importante, a educação tem um impacto que se projeta no futuro – explica Figueiredo.
Veja mais imagens sobre o Instituto Fefig:
Desde que iniciou atividades até em 2024 o Instituto Fefig impactou 225 mil crianças no Brasil. No ano passado, chegou a Santa Catarina em parceria com o Lepes (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social) da Universidade de São Paulo (USP) para um projeto com a Associação dos Municípios da Grande Florianópolis (Granfpolis), que reúne 22 municípios.
Após análise da realidade regional em 2024, foi anunciado no mês de maio deste ano o Programa de Formação Continuada para educadores com a adesão de 17 municípios. O plano é revolucionar a educação a partir do aprimoramento da formação dos professores. O trabalho envolve a formação de multiplicadores locais, para que seja desenvolvido de forma permanente.
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De acordo com Figueiredo, o Instituto Fefig tem como missão ajudar o setor público a entregar educação de qualidade. O trabalho tem quatro prioridades: aprendizado das crianças até os seis anos, gestão da alfabetização, parcerias com municípios para melhorar a educação e realização de exames nas escolas para identificar e dar óculos a crianças com problemas de visão.
Nascido em São Paulo, onde segue atualmente , Luiz Fernando Figueiredo é um dos principais nomes do mercado financeiro brasileiro. Trabalhou em diversos bancos, integrou a diretoria do Banco Central de 1999 a 2003, foi cofundador da Gávea Investimentos e fundador da Mauá Capital que depois fez fusão com a Jive. Ele já atuava na área social, mas se envolveu muito mais agora com o Instituto Luiz Felipe Figueirego (Fefig), do qual é o principal mantenedor. Saiba mais sobre a atuação do instituto na entrevista a seguir:
No Brasil, você é mais conhecido pela atuação como diretor do Banco Central e, depois, como empresário do setor financeiro. Mas, agora, se destaca também por ter fundado e liderar o Instituto Fefig, voltado à qualidade da educação infantil pública. Pode detalhar mais esse projeto?
-O Instituto Fefig nasceu no dia 13 de abril de 2018. Eu o fundei em homenagem ao meu filho, Luiz Felipe Figueiredo, que havia falecido seis meses antes. Ele foi diagnosticado com um tumor chamado meduloblastoma aos 10 anos, e lutamos contra a doença até os 23 anos, quando infelizmente ele nos deixou.
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O Luiz Felipe teve uma trajetória muito bonita. À medida que sua vida ia se tornando mais limitada, ele foi ficando mais espiritualizado, mais centrado, mais sensível. Foi um privilégio ser pai dele e ver como ele transformou a dor em crescimento interior. Eu já tinha alguma atuação social, mas depois que ele faleceu decidi criar algo mais estruturado, perene.
Queria fundar um instituto que ajudasse o maior número possível de crianças, essa foi a motivação. Escolhemos a educação como foco porque, embora toda ação social seja importante, a educação tem um impacto que se projeta no futuro.
Ela transforma não só a vida de quem recebe, mas também das pessoas ao redor. O nosso diagnóstico é que o Brasil universalizou o acesso à escola, mas ainda não conseguiu garantir qualidade para todos.
E qual seria, então, a missão principal do Instituto?
– O “negócio” do Instituto Fefig é ajudar o setor público a entregar educação de qualidade. Para isso, recebemos apoio importante do Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), que é referência no apoio a novas organizações do terceiro setor.
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Fizemos um grande trabalho inicial e definimos três pilares para tudo o que fazemos: impacto direto nas crianças, escalabilidade e sustentabilidade. Ou seja: só apoiamos projetos que realmente impactam os alunos, que possam ser replicados em escala e que tenham potencial para se transformar em políticas públicas duradouras.
E como se dá a atuação de vocês na prática?
– Buscamos os melhores projetos já existentes, com esses três critérios. Não queremos reinventar a roda. Apoiamos e fortalecemos quem já está fazendo um excelente trabalho. Todos os projetos em que atuamos têm participação ativa nossa, mas sempre em parceria com quem já está no território. Hoje temos quatro projetos principais.
E quais são esses projetos?
– O primeiro é voltado à primeira infância. Atuamos em municípios para garantir que crianças de 0 a 6 anos, especialmente de 3 a 6, tenham o estímulo necessário para se desenvolver cognitivamente. Isso inclui desde a adequação das salas, a alimentação, até a formação de professores.
A ideia é preparar essas crianças para a alfabetização e para a vida. Diferente de uma consultoria, que entrega e vai embora, nós capacitamos os municípios para que eles próprios implementem e sustentem as ações.
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E onde esse projeto já está sendo executado?
– Começamos em Patos, na Paraíba. Em 2024, já estamos atuando em 17 municípios de Santa Catarina. Esse projeto é feito em parceria com o Lepes (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Economia Social) da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto, uma equipe fantástica. O segundo projeto é o de gestão da alfabetização. Utilizamos uma metodologia desenvolvida pelo Instituto Ayrton Senna, com mais de 20 anos de experiência. Nós cuidamos de toda a implementação e acompanhamento, com técnicos locais apoiando os municípios. Atuamos do 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental.
E qual tem sido o impacto desse projeto?
– Em 2023, começamos com cerca de 30% das crianças alfabetizadas e terminamos o ano com mais de 72%. É um impacto enorme. Neste ano, devemos alcançar mais de 40 mil crianças. E sempre atuando onde o Estado tem mais dificuldade de chegar com qualidade. Não há transferência financeira. Firmamos contratos com as prefeituras e damos suporte técnico, tanto na alfabetização quanto na primeira infância.
Qual é o terceiro projeto desenvolvido pelo Instituto Fefig?
– O terceiro projeto é uma parceria com a organização Parceiros da Educação. Sou conselheiro lá há vários anos. Atuamos no estado de São Paulo, ajudando municípios a desenvolverem sua educação. Estivemos em Santo André e Ituverava.
Santo André evoluiu tanto que conseguimos encerrar a atuação lá, eles atingiram um IDEB acima de 6,5, que é considerado excelente. Agora, estamos com um edital aberto para entrar em três novos municípios em São Paulo.
Que bom saber que o trabalho evolui até o ponto de poder sair. E o quarto projeto?
– O quarto projeto chamamos de “Visão na Escola”. Em todos os lugares onde atuamos com alfabetização ou primeira infância, levamos exames oftalmológicos com retinografia, algo que o estado geralmente não oferece, e doamos óculos às crianças.
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Para você ter ideia, entre 20% e 30% das crianças têm dificuldade de aprendizagem simplesmente porque não enxergam bem. E mais: 80% dessas crianças nunca fizeram um exame de vista. Então, muitas vezes, elas nem sabem que não enxergam direito. Quando recebem os óculos, tudo muda, elas passam a ver o mundo de forma diferente.
Muitas vezes, uma criança é considerada desatenta ou com algum transtorno de aprendizagem, quando na verdade ela tem apenas um problema de visão, certo?
– Exatamente. Crianças que não conseguem prestar atenção, que a professora às vezes acha que têm TDAH ou algo do tipo… Na verdade, elas só não enxergam direito. No ano passado, passamos de 80 mil crianças atendidas em quatro projetos. Este ano, vamos ultrapassar 100 mil, pois já estamos acima de 92 mil. Ou seja, até o ano passado, o Instituto já tinha alcançado 225 mil crianças desde sua fundação. Com os resultados deste ano, vamos chegar perto de 325 mil.
Como o Instituto Fefig trabalha para melhorar a educação? É como uma consultoria ao setor público?
– Não é bem uma consultoria. A gente ajuda os municípios a executarem o trabalho. Firmamos um contrato com contrapartidas: eles precisam garantir, por exemplo, auxiliares em sala de aula, assiduidade dos professores, quantidade mínima de livros lidos pelas crianças…
Essas condições são necessárias para que a nossa metodologia funcione. Em cada cidade, ajudamos a formar os professores. Assim, a formação de professores passa a ser um conhecimento instalado naquele município. É um modelo sustentável.
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Vocês ficam por quanto tempo em cada cidade?
– Pelo menos quatro anos. Esse é o tempo necessário para transformar nossa atuação em política pública local. Depois disso, seguimos para outros municípios.
Os municípios procuram vocês ou o Instituto é quem busca os parceiros?
– Eles podem nos procurar, sim. Por exemplo, na Bahia, começamos com cinco municípios e hoje estamos em mais de 20. No Piauí, começamos com sete e hoje já são 10, em diferentes regiões.
A procura tem crescido. Quando os municípios nos procuram, avaliamos se eles têm real interesse e condições de implementar as ações. Se houver comprometimento, tudo flui com mais facilidade.
E, hoje, vocês têm mais demanda do que capacidade?
– Exatamente. Em 2018, 2019, quando lançamos o programa de gestão da alfabetização, tínhamos mais vontade do que adesão dos municípios. Hoje, temos mais municípios interessados do que conseguimos atender. Mas vamos chegar lá.
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Em cada município, vocês formam gestores de professores?
– Sim, formamos aqueles que vão liderar a formação continuada dos professores. O objetivo é que os professores estejam preparados para atingir bons resultados, como, por exemplo, uma nota alta no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, que mede o aprendizado na educação básica no país).
Com os novos prefeitos eleitos, o momento é bom para iniciar esse tipo de política. Você concorda?
– Sim. Muitos prefeitos estão iniciando mandatos e têm potencial para implementar políticas por oito anos. Em mais de 90% dos municípios onde atuamos, os prefeitos se reelegeram, mesmo sendo de oposição. Isso mostra que nosso trabalho é apartidário. Estamos ali para ajudar.
Como o Instituto Fefig se sustenta? Há doações?
– Sim. A principal fonte de recursos ainda sou eu, como mantenedor, mas temos doações de pessoas físicas e jurídicas, mensais, anuais ou pontuais. Há quem doe serviços também. Um escritório de advocacia, por exemplo, nos apoia financeiramente e juridicamente.
O foco do Instituto é na educação em geral ou em alguma disciplina específica?
– Atuamos com crianças pequenas. Percebemos que a educação não estava na agenda política dos prefeitos, mas isso está mudando. Prefeitos de cidades pequenas e médias estão mais próximos da população e perceberam que melhorar a educação gera retorno político. Além disso, há programas estaduais que repassam mais recursos a municípios com bom desempenho educacional.
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Vocês também atuam com leis de incentivo?
– Sim. Criamos nosso primeiro projeto via Lei Rouanet. Distribuímos livros para alfabetização e, só neste projeto, vamos alfabetizar 25 mil crianças este ano.
Esse trabalho é feito dentro das escolas públicas?
Sempre. Trabalhamos com as prefeituras, nas escolas públicas. Nosso foco é educação pública.
Vocês também atuam com alunos com necessidades especiais?
É mais difícil, porque precisamos de escala. Mas temos iniciativas. No final do ano passado, nossos agentes técnicos fizeram um curso com a Turma do Jiló, uma entidade especializada em inclusão. Estamos capacitando nossos técnicos para ajudar os professores a lidarem melhor com essas crianças.
Qual é a meta de longo prazo do Instituto Fefig?
– Queremos que nosso trabalho se torne política pública. Isso amplia nosso impacto. Por exemplo, estamos ajudando a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo com o programa Visão na Escola. O piloto envolve 150 mil crianças. É um projeto que faz exames oftalmológicos e entrega óculos gratuitos às crianças. E tudo na escola, para facilitar ao máximo a vida das famílias.
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Como vocês veem a tecnologia e a inovação para ajudar nesse trabalho?
– Reservamos cerca de 20% do nosso orçamento para inovações. Sempre testamos em piloto antes de escalar. Um dos projetos é um aplicativo que melhora a comunicação entre escola e pais. Professores deixam de escrever no caderno e passam a registrar tudo digitalmente. Os pais acessam online e podem responder. Isso aproxima famílias da escola e reduz o trabalho dos professores.
Esse envolvimento dos pais faz diferença no aprendizado?
– Muita. Estudos mostram que o envolvimento dos pais pode ampliar em até 10 vezes o aprendizado das crianças. É um impacto enorme.
Vocês têm projeto que envolve preservação ambiental?
– Sim. Um exemplo foi em Porto Alegre, com o pessoal do Instituto Reciclar, focado em ensino profissionalizante. Atendemos pouco mais de 3 mil alunos. A ideia é: se impactamos com uma ação, imagina com cinco simultâneas? Ampliamos muito o potencial de desenvolvimento das crianças. Tem vários outros que estamos fazendo e estamos sempre de olho para ver o que mais pode ajudar.
Que outra iniciativa do Fefig você gostaria de destacar?
– Temos um projeto maravilhoso. Está bem no início. Estamos fazendo junto com a Turma do Jiló, da Carolina Videira. O nome do projeto é Cidadania nas Escolas. A ideia é estimular o aprendizado dos jovens, principalmente do final do fundamental e ensino médio, em temas como filantropia, doações e engajamento social.
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A nossa geração não tem uma cultura forte de doação. Para se ter uma ideia, no Brasil as doações representam apenas 0,2% do PIB. Nos Estados Unidos, são 2%, 10 vezes mais. Queremos que essas crianças aprendam desde cedo sobre solidariedade e filantropia. Se isso for incorporado já na escola, essas atitudes vão se tornar parte da cultura das próximas gerações. Já começamos com três escolas em São Paulo e nossa meta é chegar ao Brasil inteiro. Primeiro em escolas privadas, depois em públicas e universidades.
Como um observador da educação brasileira, na sua opinião, qual é a maior deficiência no aprendizado?
– Acho que tudo, mas matemática é um desafio muito grande. Outro é o aprendizado de idiomas. Mas ainda estamos falhando na educação básica. No Brasil, dois terços do orçamento para educação vão para universidades. Deveria ser o contrário: mais investimento na educação básica.
 
				 
                                     
                            
                            




