Com o objetivo de liberar cifra bilionária de recursos para investimentos em Santa Catarina, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) realizou evento em Itajaí na última segunda-feira (22) deste mês com a participação do presidente da instituição, Aloizio Mercadante. Ele anunciou financiamentos no valor de R$ 3,3 bilhões para novos investimentos em três setores: naval, logístico e de combustível verde. No evento, ele destacou que o BNDES já liberou R$ 31,4 bilhões para investimentos em SC entre o início de 2023 até junho deste ano, sendo 67,8% para pequenas empresas, e informou que a procura por financiamentos para enfrentar o tarifaço dos EUA começou forte. Somente nos dois primeiros dias, empresas de SC contrataram R$ 155 milhões e em todo o país somaram R$ 1,2 bilhão.

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Do montante de R$ 3,3 bilhões, R$ 2,5 bilhões foram para indústria naval, R$ 401 milhões para rodovias em parceria com o governo de SC e R$ 355 milhões para a Cooperalfa.

De acordo com Mercadante, o banco tem ampliado o financiamento de investimentos, tem dado atenção à inovação com a liberação de mais de R$ 900 milhões para SC e conta com inadimplência baixíssima, de 0,003%. Ele disse que empresários interessados em financiamento do BNDES devem procurar o banco ou a rede de instituições parceiras.

O evento com Mercadante, na Superintendência do Porto de Itajaí, contou com a presença de políticos e empresários, como o presidente do Sebrae Nacional, Décio Lima, o prefeito de Camboriú, Leonel Pavan, que foi colega do político no Senado, e o presidente da Federação das Indústrias de SC (Fiesc), Gilberto Seleme. Após o evento, Mercadante falou com exclusividade para o NSC Total. Leia a seguir:

O senhor anunciou em Itajaí investimento relevante de R$ 3,3 bilhões, sendo R$ 2,5 bilhões destinados à indústria naval. O que representa esse financiamento ao setor naval brasileiro?

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– Nós temos um histórico muito longevo, mas também marcado por muitas experiências de fracasso na indústria naval. A indústria naval começou lá atrás, principalmente no governo do presidente Juscelino Kubitschek, dentro do Plano de Metas. Ele definiu o setor como estratégico para o país. E faz todo sentido: o tamanho do litoral que possuímos, a estrutura hidrográfica, que também é uma alternativa logística para o transporte fluvial. Afinal, 95% do comércio exterior do Brasil ocorre por via marítima.

Portanto, faz muito sentido um país com essas características, que já conta com uma indústria siderúrgica e metalmecânica, investir no fortalecimento da indústria naval. Mas foram muitas tentativas, nem sempre exitosas. Precisamos aprender com os erros e trabalhar com os pés no chão.

O que encontramos? Quando assumimos, em 2022, o Fundo da Marinha Mercante havia aprovado apenas R$ 200 milhões. Ou seja, era um fundo praticamente vegetativo. Não havia encomendas, nem foco, não era prioridade. Nós mudamos. Em 2023, já realizamos mais de R$ 6 bilhões em operações. No ano passado, ultrapassamos R$ 8 bilhões em investimentos. Este ano, também temos uma perspectiva bastante positiva. 

Como serão esses navios construídos aqui em Santa Catarina?

– O que anunciamos aqui foi R$ 2,5 bilhões: oito embarcações, com motores a diesel e elétricos com baterias. Isso é muito importante porque se trata de navios de apoio offshore para a Petrobras, que encomendou essas embarcações para os próximos 12 anos. As principais entregas do BNDES na construção naval, nesses dois últimos anos, foram voltadas ao transporte fluvial: balsas e barcos empurradores. Há uma forte demanda por balsas para transporte de minério, soja e outros produtos, além de barcos fluviais de empurradores.

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E agora começam a surgir demandas de embarcações mais estruturadas, como estas. Em três anos, serão entregues oito embarcações, que gerarão 1,4 mil empregos diretos e 8 mil empregos totais na região. O estaleiro Detroit, de Itajaí, vai fabricar para a Starnav. Portanto, acreditamos que poderemos superar essa meta.

No ano passado, foram R$ 8 bilhões de crédito aprovados para a construção naval. A demanda está muito forte, o que é positivo, pois arrasta toda a cadeia da indústria pesada. Além disso, está mais diversificada: no ano passado, era muito concentrada na Petrobras; hoje já não é mais. Como disse, o foco recente foi o transporte hidroviário, com balsas e barcos empurradores.

Também foram liberados recursos para rodovias aqui no estado. Onde serão esses investimentos?

– Além dessa entrega, também viemos aqui reforçar outra frente importante: o esforço na área de logística rodoviária do estado. O BNDES financiou o contorno de Florianópolis, uma obra bastante estruturante para o estado.

Agora, estamos investindo em quatro rodovias estaduais: SC-492, SC-483, SC-120 e SC-305. São R$ 401 milhões, em 117 quilômetros que serão duplicados, reestruturados e pavimentados. É um salto importante e demonstra a relação republicana que o governo Lula mantém com os estados, independentemente das adversidades políticas, que não são pequenas.

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Por que é importante investir na infraestrutura logística?

-Fortalecer a infraestrutura logística é essencial, porque Santa Catarina, além de ser um polo agropecuário e produtor de proteínas, também tem uma indústria relevante, inovadora e de muito valor agregado. É uma economia muito inovadora. Empresas como a WEG, que é cliente histórica do BNDES, e a Tupy, da qual somos o principal acionista, são exemplos da importância do estado no desenvolvimento de uma indústria de maior valor agregado.

Estamos investindo R$ 401 milhões nessas estradas, com contrapartida estadual de R$ 149 milhões. Ou seja, 73% são financiados pelo BNDES. Isso sem contar as rodovias federais que também financiamos no estado. Só em Santa Catarina, fizemos três vezes mais financiamentos rodoviários do que o governo Bolsonaro. 

O BNDES também está financiando um investimento do agronegócio no Oeste de SC?

– Sim, um financiamento de R$ 355 milhões para a Cooperalfa, uma cooperativa agrícola. O projeto é voltado ao esmagamento de soja e produção de biodiesel, agregando valor ao cooperativismo, que ainda tem pouca visibilidade no Brasil. As cooperativas brasileiras já reúnem 23 milhões de pessoas. No ano passado, faturaram R$ 670 bilhões. O BNDES é o banco das cooperativas, o que mais atua na sua estruturação.

O cooperativismo é uma forma de produção muito inteligente, porque potencializa os pequenos produtores, que ganham escala, competitividade e eficiência. Eles recebem o resultado da cooperativa, são empreendedores e se beneficiam dos serviços que ela oferece.

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O setor está crescendo muito e, em breve, talvez já no próximo ano, deve alcançar R$ 1 trilhão em faturamento. O BNDES tem mais de 25 anos de parceria com as cooperativas. Esse também é um projeto estratégico para o agro do estado. 

Outras empresas catarinenses têm buscado financiamento junto ao BNDES?

– Para a WEG, foram R$ 390 milhões em apenas uma operação especialmente voltada à exportação para o grupo Alupar, que está desenvolvendo projeto de energia no Chile.

Também destinamos R$ 960 milhões para 12 centros de P&D. Esse é um projeto exclusivamente voltado à pesquisa, desenvolvimento e inovação. São quatro novos centros e oito de expansão, fundamentais para gerar valor agregado e empregos altamente qualificados em Santa Catarina.

Há uma forte demanda por P&D, especialmente de indústrias europeias, principalmente alemãs. A Alemanha perdeu competitividade ao abandonar a energia nuclear após o acidente nuclear da usina de Fukushima. Eu era ministro de Ciência, Tecnologia e Inovação na época e alertei sobre esse erro estratégico. Hoje, a indústria intensiva em energia não consegue mais se sustentar lá.

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Dou um exemplo: a Bosch, que está há 70 anos no Brasil e nunca teve P&D aqui. Agora, o centro mundial de P&D da Bosch para o agro está no Brasil, com financiamento nosso. A Volkswagen também está investindo muito em P&D para carros híbridos. Enquanto o mundo ocidental dominava o motor a combustão, a China criou uma rota tecnológica diferente: o carro elétrico, e já lidera.

A vocação do Brasil é o híbrido etanol-elétrico. A infraestrutura do etanol já está pronta, não há necessidade de criar toda uma rede de plug-in como no elétrico. Isso nos dá uma vantagem competitiva única, com emissões ainda menores que as do carro elétrico. O mesmo raciocínio vale para a indústria naval: essas embarcações que financiamos tem motorização diesel-elétrica, com baterias.

Lançamos um edital de R$ 8 bilhões para motores de navegação renovável e aviação SAF (Combustível Sustentável de Aviação). A demanda foi de R$ 156 bilhões, o que mostra o potencial do setor. Estamos processando esses pedidos porque o Brasil pode liderar o uso do biodiesel na aviação e navegação. Nenhum combustível é tão competitivo nessa fase quanto o biodiesel.

O hidrogênio verde é promissor, mas exige toda uma nova estrutura em portos e aeroportos, que ainda não está pronta. Já temos um avião 100% movido a biocombustível voando em testes, na aviação agrícola. Santa Catarina pode ter um papel muito importante nesse processo.

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A WEG, por exemplo, está avançando na área de baterias e agregando valor ao lítio, o que pode impulsionar ainda mais a mobilidade híbrida. Vejo uma perspectiva muito promissora para o estado.

No caso do biodiesel, além desse projeto, outro em SC visa produção de SAF. Existe uma demanda junto ao BNDES para esses projetos?

– Sim. O projeto da Cooperalfa já está voltado à produção de biodiesel, com esmagamento de soja. E temos também o da Copercampos, outra cooperativa daqui que está na mesma direção. Portanto, existe uma demanda forte no estado, que conta com uma indústria inovadora e potente. A WEG é um grande exemplo, assim como a Tupy, a maior fundição do Ocidente.

A Tupy já tem um motor a biodiesel?

– Ela tem um motor a biodiesel, mas ela vai ter que evoluir para o carro híbrido e para o carro elétrico. Mobilidade elétrica não apenas para automóveis, mas para toda a linha de produção. Eu sei que eles estão agora fazendo parcerias com grandes grupos chineses nessa área de motores, para disputar esse novo mercado que está surgindo. Não é algo para agora. É uma estratégia de diversificação bastante complexa, e eles estão empenhados nela.

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O BNDES é o maior acionista da Tupy…

– Estou falando do desafio tecnológico. Não é um anúncio imediato, é um processo bastante complexo. O CEO da Tupy, Rafael Lucchesi, por exemplo, foi 16 anos diretor do Sebrae e coordenava o Centro de Inovação da CNI. Ele também foi superintendente e acompanhou a Embrapii. Tem muita experiência em inovação tecnológica. Por isso, acredito que ele tem uma visão de longo prazo que será muito importante para a transição que a empresa terá de fazer.

O BNDES liberou quinta-feira (18) as linhas de crédito para o programa Brasil Soberano… Exportadores de SC estavam esperando ansiosos. Como está essa demanda?

– Olha, nós só recebemos as informações da Receita Federal, via Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), na quarta-feira (17) da semana passada. O MDIC estava preparado para acelerar o Brasil Soberano, mas era um processo complexo: levantar todas as empresas exportadoras, verificar o histórico, porque há casos de empresas que exportam para suas matrizes. Foi um trabalho complexo da Receita, mas eles entregaram na semana passada.

Em apenas dois dias, quinta e sexta-feira, nós aprovamos R$ 155 milhões só para Santa Catarina. Para o Brasil inteiro, foi R$ 1,2 bilhão em dois dias. A demanda é muito forte. Estão chegando muitos projetos, e o que vier nós vamos atender. Esses R$ 30 bilhões, segundo nossas estimativas, vão cobrir a necessidade das empresas que foram impactadas em mais de 5% de perda de faturamento.

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O MDIC colocou mais R$ 10 bilhões para quem teve perda menor que 5% ou não sofreu a tarifa de 50%. Portanto, estamos trabalhando com um universo de R$ 40 bilhões.

Além disso, também estão disponíveis R$ 20 bilhões do Fundo Garantidor, que assegura o acesso ao crédito para micro, pequenas e médias empresas. Esses recursos não são crédito como os R$ 40 bilhões. Esses R$ 20 bilhões são para garantia.

Por exemplo, se Banco do Brasil, Itaú ou Bradesco abrirem uma linha para micro, pequenas e médias empresas que se enquadrem no Brasil Soberano, nós garantimos a operação até R$ 20 bilhões.

Quanto o BNDES já liberou para investimentos em Santa Catarina na atual gestão?

-O BNDES já financiou para Santa Catarina R$ 31,4 bilhões entre 2023 e julho de 2025. Esse valor é geral. Nos quatro anos do governo anterior, foram R$ 24 bilhões. Nós já superamos bastante esse número, e 67,8% foram destinados a micro, pequenas e médias empresas.

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O Fundo Garantidor é justamente o que ameniza o risco para nossa rede de parceiros, que reúne mais de 50 instituições. Quando garantimos a operação, o crédito flui mais rápido. Por isso, dentro do Brasil Soberano ainda temos R$ 20 bilhões de Fundo Garantidor voltado a micro, pequenas e médias empresas.

A propósito, eu queria elogiar o novo presidente da Fiesc (Federação das Indústrias de Santa Catarina). Na quinta-feira passada, ele promoveu uma audiência online, e nós enviamos nosso diretor de Política Industrial e Inovação, José Luiz Gordon, para explicar aos industriais como funciona o Brasil Soberano: as linhas, taxas, procedimentos de cadastro, avaliação e liberação de crédito, além de como acompanhamos as operações. Porque o BNDES é muito rígido na sua governança, muito sólido. Nossa taxa de inadimplência hoje é 0,003%. É a menor do mercado.

Se houver maior demanda do setor empresarial, o banco tem como aumentar essa oferta de crédito atual?

– Os 10 bilhões que colocamos são linhas da LCD, a Letra de Crédito para o Desenvolvimento, um pouco abaixo da Selic. Mas é uma taxa mais alta para quem perdeu menos de 5% ou teve alíquota de 25%, 10%, abaixo de 50%. Isso o BNDES pode ampliar. Já a linha do Plano Brasil Soberano, só se houver participação do Ministério da Fazenda, porque é uma linha com taxa de juros favorecida que não temos como sustentar sozinhos.

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As taxas para o programa Brasil Soberano são subsidiadas?

-Sim. As taxas de juros variam de 7% a 10% ao ano, aproximadamente. Abaixo da Selic. Precisa ser, porque as empresas foram muito prejudicadas. Imagine um empresário que produziu, construiu toda uma relação com a economia americana e, de repente, cai a indústria imobiliária. Então, depois de anos exportando aquele tipo de produto, de um dia para o outro, você perde 50% das vendas, sem ter nenhuma responsabilidade por isso.

Se o Estado não ajudar essas empresas diversificarem, buscarem novos mercados e amortecerem o impacto da perda de faturamento, elas quebram. Há empresas que perderam 90% do faturamento porque dependiam exclusivamente do mercado dos Estados Unidos. Por isso, a Apex, junto com o BNDES, fez um estudo para identificar os mercados potenciais para cada tipo de produto, para onde podemos exportar, onde há interesse e possibilidade.

Estamos também em diálogo com importadores americanos, verificando se é possível flexibilizar e ajudá-los a retirar essas barreiras, ou buscar novos mercados, que é uma forma de ampliarmos as exportações e compensarmos as perdas nos Estados Unidos.

Como será possível resolver o impasse do tarifaço com os Estados Unidos?

– O Brasil é um dos 15 países da ONU que mantêm relações com todos os demais do planeta. Se há uma diplomacia aberta ao diálogo, com cultura de paz e respeito às diferenças, é a diplomacia brasileira. Isso é uma política de Estado. E o presidente Lula, mais do que ninguém, é um líder que defende a paz, o diálogo e a diplomacia em todas as circunstâncias.

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Agora, quanto ao interesse, é imprevisível o que será a política comercial do governo americano. A Justiça americana, em instância equivalente ao STJ, suspendeu o tarifaço até 14 de outubro. Pode-se observar que não estão sendo tomadas novas medidas. Suspenderam. Mas o governo recorreu à Suprema Corte americana. Até agora, já arrecadaram US$ 165 bilhões com as tarifas, fazendo ajuste fiscal.

Os critérios, no entanto, não são racionais. Trata-se de uma agressão, de um desmonte da Organização Mundial do Comércio. Hoje, inclusive, o Valor publicou artigo de um ex-presidente e grande jurista da Corte de Justiça da OMC elogiando a firmeza do Brasil ao recorrer contra as medidas injustas e indefensáveis.

O que o senhor considera como medidas injustas e indefensáveis?

– Dou um exemplo didático: como é que um país que não produz manga pode taxar manga? O mesmo vale para o açaí. Ou para o café. Os Estados Unidos compram 8 milhões de sacas da América Latina, sendo 8 milhões só do Brasil. Um terço do café que eles consomem vem daqui.

Como vão suprir essa demanda se houver uma perda de 30% na produção mundial, causada pelas mudanças climáticas? Então, em algum momento, isso terá de se acomodar. O mesmo com o açaí. Não há nenhum país do mundo que produza açaí fora da região amazônica. O Brasil é o maior produtor global. É algo vital para manter a floresta em pé, gerar valor agregado para pequenas comunidades e proteger o meio ambiente. Taxar isso é completamente injustificado.

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Outro exemplo: tiveram de rever a tarifa sobre papel de celulose para papel higiênico, porque a fibra curta brasileira não tem concorrente e o custo estava pesando demais para o consumidor americano. Algumas medidas, portanto, tendem a ser superadas. E nós precisamos trabalhar bastante para mitigar esses impactos. Por isso o Brasil é soberano.

Veja o exemplo da Embraer: conseguiu sair da tarifa de 50% e exportou 50 aeronaves para os Estados Unidos, mostrando um nível extraordinário de eficiência e competitividade. Muito disso se deve ao ITA, à qualidade da engenharia brasileira. A Boeing, em crise, chegou a montar escritório em São José dos Campos apenas para contratar engenheiros do ITA e da Embraer. Levou 100 deles para tentar melhorar sua engenharia, que não vai bem.

Mas a Embraer continua imbatível em jatos regionais, seu segmento de excelência. Foram 50 aviões exportados, e hoje há mais 74 encomendas da Latam, sendo 24 já confirmadas para 2026. Isso vai gerar muito emprego no setor aeronáutico e também impulsionar a reestruturação da manutenção em São Carlos. Tudo isso faz parte do pacote com a Embraer.

A Latam, que possui 3 mil aviões e até agora operava apenas com Airbus, tem 65% de seu faturamento concentrado no Brasil e grande parte das rotas na América Latina. Portanto, faz todo sentido estar junto da Embraer. Para nós, foi um grande momento esse encontro entre Embraer e Latam. Estamos fortalecendo o mercado interno, abrindo novos mercados e mostrando que foi uma decisão muito acertada da Latam.

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A Embraer conseguiu fazer um acordo para vender para os Estados Unidos, excluindo tarifas. O senhor acredita que outras empresas brasileiras também podem seguir o mesmo caminho?

– Isso já está acontecendo em vários setores. A Apex tem trazido os compradores para o Brasil e promovido reuniões com as empresas locais. A ideia é avaliar se é possível acomodar preços e condições para manter a exportação sem desestruturar a produção.

 Em alguns casos, a logística é difícil de substituir rapidamente. Um exemplo é o pescado de Santa Catarina, cuja exportação estava toda direcionada aos Estados Unidos. Encontrar novos parceiros exige tempo, adaptação logística e financiamento para atravessar esse período de transição.

O BNDES, junto com a Apex, tem apoiado as empresas nessa adaptação e, ao mesmo tempo, dialogado com importadores americanos que também têm interesse em que os EUA revejam sua política tarifária. O caso do suco de laranja ilustra bem: como é um produto essencial, que também serve de base para outros sucos, a medida tarifária teve forte impacto direto no consumidor americano.

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Houve pressão interna e os EUA precisaram recuar. A estratégia é trabalhar junto com essas empresas, que também estão sendo penalizadas, para remover barreiras.

O senhor citou a importância de respeitar os pilares da democracia. Pode detalhar isso?

– Não há como aceitar que outro país interfira na independência do Judiciário brasileiro. É preciso respeitar pilares básicos: a soberania do voto, a harmonia e independência dos poderes e o direito à liberdade. Infelizmente, vivemos recentemente tentativas de golpe no Brasil.

Houve quem planejasse explodir um caminhão com 60 mil litros de querosene ao lado do aeroporto de Brasília; tentativas de invadir a Polícia Federal e incendiar veículos; destruição dos prédios públicos para criar a impressão de caos. Tudo isso está documentado. Eu vivi parte da minha vida sob a ditadura militar. Lutei contra a censura, o exílio e a tortura.

Por isso, para minha geração, é inegociável garantir as liberdades conquistadas, de imprensa, de organização política e de manifestação. O presidente Lula jamais negociará esses princípios. A democracia não se negocia. O que pode ser negociado é o comércio. Nesse campo, estamos abertos ao diálogo, sempre em defesa de soluções multilaterais e buscando parcerias no Sul Global.

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E em relação às micro e pequenas empresas, qual o papel do BNDES?

– No ano passado, o BNDES fomentou R$ 278 bilhões em crédito para a economia, um recorde histórico. Dois terços desse total foram destinados a micro, pequenas e médias empresas. Isso só foi possível por meio do Fundo Garantidor (FGI-PEAC), criado na pandemia e fortalecido pelo governo.

Esse fundo é um sucesso e garante democratização no acesso ao crédito, sem colocar grandes e pequenas empresas em conflito. Grandes corporações estruturam setores inteiros, mas muitas micro e pequenas sobrevivem justamente em torno delas. Os dois segmentos são complementares.

Dentro da política da Nova Indústria Brasil (NIB), já foram destinados R$ 18,2 bilhões para inovação, exportações e produtos industriais de maior valor agregado. No agro, o plano Safra deste ano destinou R$ 70 bilhões do BNDES.

A Bloomberg aponta o BNDES como o banco que mais financiou energia limpa e renovável na história. A matriz energética brasileira, a mais limpa do G20, deve muito a essa atuação. Além disso, o Fundo Clima vem financiando a descarbonização da indústria, da agricultura e da energia. Outro destaque é a linha de inovação com taxa de juros de apenas 3% ao ano, criada porque a inovação envolve risco. É um crédito subsidiado para estimular novas ideias, processos e produtos.

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O senhor mencionou a criação de um “BNDES azul”. O que significa isso?

– Nós desenhamos um novo BNDES: inovador, neoindustrializante, voltado à descarbonização da economia e ao apoio à economia verde. Além disso, avançamos bastante no que chamamos de BNDES azul, que olha para a economia do mar. Se fosse um país, a economia azul seria a sétima maior do mundo. Hoje, 90% do comércio mundial é feito por navios, o que envolve diretamente a indústria da construção naval.

E quais ações já foram realizadas nessa área?

– Estamos desenvolvendo o Planejamento Espacial Marítimo (PEM), um mapeamento de toda a plataforma continental brasileira, em parceria com a Marinha e universidades, para definir o que cabe em cada região, turismo, pesca, produção, exploração mineral, de forma estratégica e sustentável. Inclusive destinamos R$ 7 milhões para o litoral de Santa Catarina.

Também estamos conduzindo projetos ambientais de grande porte: recuperação de 13 mil quilômetros de manguezais, políticas de proteção de corais em parceria com a Petrobras e ações com a Marinha para preservar as ilhas oceânicas, hoje ameaçadas por predadores que afetam a fauna local e aves migratórias.

Como a economia azul se conecta ao desafio da descarbonização?

– Um dos pontos centrais é a navegação com energia renovável. A partir de 2028, será obrigatória a utilização de navios movidos por fontes limpas, sob pena de multa, conforme determinação da ONU. Isso é estratégico para o Brasil: como estamos distantes dos principais mercados, o custo do transporte é elevado. Com navios movidos a energia renovável, ganharemos competitividade, reduzindo custos em relação a outros países que não conseguirem fazer essa transição a tempo.

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E quanto ao crescimento econômico do Brasil, como o senhor avalia os resultados recentes?

– Nos dois primeiros anos do atual governo, o crescimento surpreendeu quem desacreditava do país. O mercado previa uma expansão média de 2,75%, mas o crescimento acumulado foi de aproximadamente 6,75%, mais que o dobro da projeção. Hoje temos a menor taxa de desemprego da história, o maior número de trabalhadores empregados e a renda média da população mais pobre cresceu 20%.

O índice de Gini, que mede a desigualdade, atingiu o melhor nível já registrado pelo IBGE, mostrando que os de baixo estão melhorando mais rapidamente, graças a políticas sociais de inclusão. Além disso, o câmbio está estável, ajudando a conter a inflação.

Nos últimos dois meses, registramos deflação. O único ponto ainda elevado é a taxa básica de juros, mas há condições concretas para sua queda sustentada em breve. Comparado ao resto do mundo, o Brasil foi a 10ª economia que mais cresceu nesse período, um resultado espetacular.