Apesar de ter vivido minha infância em um circo, que é “quase” um parque de diversões, brinquei muito e quase sempre com outros “tipos” de brinquedos que atiçavam minha imaginação, enalteciam meu espírito investigativo e me davam oportunidade de experimentar na prática, os valores que recebi de meus pais e que mais tarde percebi serem valores éticos universais.

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Primeiro porque as brincadeiras infantis, assim como os jogos de recreação e a prática esportiva de competição ou não, é sempre uma maravilhosa oportunidade de experimentar, de colocar em prática esses ensinamentos que normalmente são oferecidos em teoria.

Tomo como referência a conhecida frase: "As palavras emocionam, mas os exemplos arrastam e lembro dos meus pais me orientando para a vida e expondo-se imediatamente à minha avaliação, que confrontava o que me diziam com a forma como eles se comportavam".

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Eu recebia seus ensinamentos, mas acreditava ainda mais e me sentia fortalecido em seguir seus passos, exatamente porque me diziam:

– "Vá por aqui..." e eles seguiam na frente fazendo exatamente o que me aconselhavam.

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– "Respeite os mais velhos", e acompanhei até o fim da vida de meus avôs agasalhados pelo carinho deles. Não só os pais de meus pais, mas todos os idosos que conosco viviam.

– "Aja sempre como se alguém estivesse te observando", pois essa é uma grande verdade. Mesmo que você não veja ninguém ao seu lado, que você esteja sozinho num cômodo pequeno e sem janelas, você estará sendo observado por sua consciência. E ela tem os olhares mais aguçados que você conhecerá durante toda a sua vida.

– "Respeite e busque amar o próximo como gostaria de ser respeitado e amado". E se não conseguires sentir todo o carinho que gostaria, lembre-se que não tens a mesma autorização com relação ao respeito – esse nunca poderá ser graduado para menos que o máximo. Para o exercício de uma vida digna, é fundamental que se mantenha o respeito, até independente do amor.

E possível que você nunca tenha olhado para uma brincadeira de criança, como a fórmula quase mágica da educação em seu mais alto conceito, compreende? Se eu aprendo a respeitar as regras, respeito meus adversários, me empenho ao máximo para vencer uma competição, mas tenho a compreensão da justiça que foi ser derrotado por alguém que esteja mais bem preparado que eu e tome essa aparente derrota como o próximo passo para estar ainda melhor da próxima vez…

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Tudo isso é parte do meu processo educacional como um verdadeiro ser humano. Tudo isso faz parte de uma simples brincadeira infantil. Mas, por que escrevo isso, dividindo com vocês um pouco dessa humilde e simples filosofia, que muito me ajudou a viver uma vida feliz como filho de meus pais e pai de meus filhos?

Salvador.
Aí está seu Salvador. (Foto: Arquivo Pessoal)

Recebi da Leila, uma grande amiga de jornada (colega de trabalho quando ainda militava na educação), algumas fotos que ela clicou de surpresa do pai dela e um breve relato deixa claro o quanto uma brincadeira de criança é motivo para gerar felicidade, alegria e emoção. Principalmente se ela permanecer na memória e no coração.

brinquedo
Transformando a madeira com amor. (Foto: Arquivo Pessoal )

Relata-me a Leila:

“Caro Mário, meu pai chama-se Salvador Bissoli. Nascido em Tijucas, Santa Catarina, foi Professor e Promotor de Justiça e hoje, aposentado, completou 92 anos de idade. É uma pessoa extremamente otimista (mamãe, que está com 89 anos, costuma dizer às vezes, que seu otimismo chega ao exagero de não conseguir ver o lado ruim das coisas…)

Em sua casa aqui em Florianópolis, ele mantém um cantinho em que mistura marcenaria, serra e solda elétrica, martelo, alicate e outras ferramentas, cantinho que ele chama de “baiúca”.

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Ali, guarda também, objetos que lhe lembram a infância, constrói seus inventos para utilizar no dia a dia da casa e produz artesanalmente licores, cachaças leves e vinhos. Pois, foi ali que ele fez alguns brinquedos que vai enviar para aos bisnetos pequenos, que nasceram e moram na França.

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E o menorzinho, que completou um ano de vida há pouco, ele ainda nem conhece, pessoalmente. Espera viver esse momento de alegria, tão logo termine a pandemia que os mantém (papai e mamãe) e a todos nós, isolados.

Os brinquedos que ele construiu com as próprias mãos, são exatamente os mesmos com os quais brincava quando pequeno. Uma miniatura de carro de boi e um carrinho que faz girar os cilindros sustentados pelas próprias rodinhas quando acionadas. Acho que meu pai é um belo exemplo de Ser Humano na real acepção do ser, ou seria do Ser?

Um abraço. Leila”.

Em tempos de pandemia, o seu Salvador é uma alívio e uma benção ao espírito de quem crê, não é mesmo?

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Nosso carinho, nossa humilde homenagem e a certeza de que é motivo de alegria para os bisnetinhos franceses ainda tê-los (ele e a bisa) por aqui…