A redução de custos para a importação de bicicletas, anunciada na quarta-feira (17) pelo presidente Jair Bolsonaro em uma rede social, acendeu o sinal de alerta entre fabricantes nacionais das magrelas. A medida é vista com reservas por parte do setor por estimular a compra de bikes prontas do mercado externo, o que poderia impactar a produção nacional. Dados mais recentes levantados pelo Observatório da Federação das Indústrias (Fiesc) mostram que, em 2019, Santa Catarina tinha cerca de 30 fábricas do ramo, que empregavam em torno de 850 pessoas. O principal polo é Blumenau.

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Uma resolução publicada na quinta-feira (18) pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), vinculada ao Ministério da Economia, baixou de 35% para 30% a alíquota do imposto de importação de bicicletas. A medida entra em vigor no dia 1º de março. Novas diminuições estão previstas ainda em 2021. Pelo Twitter, Bolsonaro, citando a Camex, avisou que a alíquota baixará para 20% até dezembro.

O incentivo à importação não seria problema se fosse acompanhado de redução de custos também para quem produz internamente, avalia Antônio Vergos, diretor da Nathor. A empresa de Blumenau, que tem cerca de 500 funcionários, é uma das maiores fabricantes do país, com produção anual de pouco mais de um milhão de bicicletas.

— O que a gente espera do governo é uma contrapartida na importação de componentes, para podermos ser competitivos com as bicicletas montadas lá fora — diz o empresário, acrescentando que essa diferença de 15 pontos percentuais na alíquota de importação pode inviabilizar parte da produção interna.

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O presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e do Material Elétrico de Blumenau e Região (Simmmeb), Dieter Pfuetzenreiter, acredita que, sem essa contrapartida, a medida prejudica a indústria nacional. Procurada pela coluna, a Mormaii, outra grande fábrica de bicicletas de Blumenau, disse que ainda é cedo para avaliar os impactos.

Presidente da Câmara de Comércio Exterior da Federação das Indústrias de Santa Catarina (Fiesc), Maria Teresa Bustamante diz que a entidade ainda está apurando os efeitos da medida junto ao setor no Estado. Ela diz, no entanto, que os 20% representam um restabelecimento do que deveria ser a alíquota de efeito. Desde 2011, ela estava em 35% – taxa mais alta permitida pela Organização Mundial do Comércio (OMC) – dentro de uma lista de exceção, funcionando como espécie de incentivo à indústria nacional.

— É uma proteção fiscal que é retirada do fabricante nacional de bicicletas e que coloca ele numa posição de exposição frente a uma concorrência internacional. A questão é simples. Enquanto não tivermos uma reforma tributária e uma redução do Custo-Brasil, essa exposição é nefasta para o fabricante nacional, seja ele catarinense ou não — analisa.

Segundo a Associação Brasileira do Setor de Bicicletas (Aliança Bike), as vendas de bikes no país cresceram 50% em 2020 na comparação com o ano anterior. O pico de vendas ocorreu em julho, com alta de 118% frente ao mesmo mês do ano anterior.

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Divergências entre associações do setor

Foi a própria Aliança Bike quem reivindicou que o imposto de importação de bicicletas no Brasil voltasse à alíquota original de 20%. Para o diretor-executivo da entidade, Daniel Guth, trata-se de uma vitória para o mercado de bicicletas. Ele avalia que a medida vai permitir uma maior diversidade de modelos e reduzir o crime por descaminho de bikes – principalmente vindas do Paraguai –, garantindo maior arrecadação por parte da União. 

A entidade também considera que a medida aproxima o Brasil de práticas comerciais mais justas, com alíquota condizente em comparação a outras nações. Segundo Guth, há compromisso das empresas associadas à Aliança Bike de que essa redução será repassada ao consumidor.

Mas nem todo o setor pensa do mesmo jeito. O diretor de Relações Institucionais e presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira da Indústria, Comércio, Importação e Exportação de Bicicletas, Peças e Acessórios (Abradibi), Isacco Douek, trata a situação como um “raríssimo caso” em que o consumidor final não é beneficiado e a indústria é prejudicada.

Ele lembra que, hoje, a alíquota do imposto para a importação da maior parte das peças de bicicletas é de 16% – insumos importantes, como câmbios e cassetes, já caíram para 2%. Com a alíquota da importação da bicicleta pronta então a 35%, o negócio era mais rentável. Agora, com a redução, essa diferença mínima pode não compensar mais.

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— Se o imposto da bicicleta cair para 20%, para que o sujeito vai importar peça a 16%, fazer toda a montagem com o Custo-Brasil, se é mais fácil ele trazer uma bicicleta pronta da China? — questiona.

A ala dos descontentes deve contar com apoio de peso de produtores da Zona Franca de Manaus, outro importante polo produtor. Lideranças amazonenses já demonstraram contrariedade à medida, que na visão delas prejudica a produção local e pode comprometer empregos em um momento crítico da pandemia.

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