Um bom remédio para a alma brasileira é, quando possível, preferir o “cômico” ao “trágico”. Quando acontecem tragédias encomendadas pela incompetência das autoridades – como as que castigam o povo do Ceará – rir é uma receita temerária, pois o seu Estado bem pode ser a próxima vítima.
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Se, contudo, a escolha é possível, rir é o melhor remédio. O homem é o único animal que ri conscientemente. Essa mistura de espasmo com esgar hilariante é uma “punição” aos seus semelhantes que cometeram algum tipo de aberração social. Por exemplo: um político conhecido por seus “alcances”, vir à boca de cena declarar-se “a última reserva da moralidade pública”.
“O riso – sustentou Henri Bergson, seu maior especialista – é uma espécie de “trote social”, sempre um tanto humilhante para aquele que venha a ser o seu objeto”.
O filósofo garante que o riso “castiga certos defeitos quase como a doença pune certos excessos”:
– O riso nasce assim como uma espuma. Ele assinala, no exterior da vida social, as revoltas da superfície. É uma espuma salgada, mas faz muito bem para quem ri.
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Rir, no Brasil de hoje, é um ato de “legítima defesa” diante da corrupção compulsiva e da excessiva auto-estima das autoridades. Rir faz bem ao coração. Dar uma gostosa gargalhada equivale a tomar uma pílula de Isordil – e assim liberar os fluxos sanguíneos.
Rir é tão bom que o escritor francês Jules Renard receitava o riso como “o principal tônico da alma”:
– Estamos neste mundo para rir. No Purgatório (ou no Inferno) já não teria graça, pois estaríamos sofrendo. E no Paraíso, já não seria conveniente…
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Rir, mais do que o melhor remédio, é no Brasil a única alternativa de vida inteligente. Nada é mais engraçado do que a propensão brasileira à auto-irrisão. Estamos para rir a qualquer momento. O problema é que, às vezes, os acontecimentos revelam logo o seu lado trágico, em detrimento do “cômico”.
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Tudo no Brasil parece piada pronta para o mundo rir. Pois rir continua sendo a melhor panacéia, a melhor droga restauradora da sanidade. Afinal, o riso é um atributo do homem. Dostoievski, o atormentado romancista russo, dizia ser possível classificar-se o homem pela sua risada:
– Se nos for dado simpatizar com um homem por causa de sua risada, podemos garantir, tranqüilamente. que se trata de um homem bom…
Gente boa, o brasileiro. Ri tão convulsivamente quanto, no Carnaval, faz roncar uma cuíca. De enfarte, não morreremos tão cedo. De riso, talvez.