O sonho de ser mãe sempre esteve no coração de Fabielle Grosbelli, moradora de Xanxerê, no Oeste Catarinense. Para ela, maternidade nunca esteve limitada à biologia. Desde muito jovem, alimentava a ideia de adotar um filho. Em 2020, quando ainda namorava Leandro, sentiu que esse desejo tinha chegado à hora certa de se concretizar.
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A decisão não veio sozinha. Havia um detalhe que tornava sua escolha ainda mais especial: Fabielle desejava que o filho tivesse alguma deficiência. A ideia não assustou Leandro. Pelo contrário, encontrou nele um parceiro que partilhava a mesma compreensão de que “filho é filho”, independentemente de como chega.
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— Alguns dizem que a mulher sente a maternidade aflorar, e eu posso dizer que pra mim foi exatamente assim. Tive muitos sonhos em que era mãe de um menino com deficiência, e um destes sonhos eu estava em uma instituição de acolhimento (abrigo) e lá eu olhava para todas aquelas crianças e pensava emocionada: “Eles também são merecedores de amor”. Depois daquele dia eu tinha certeza que nosso filho viria pela adoção — salienta.
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Um mês depois da decisão, o casal iniciou o processo de habilitação. Três meses mais tarde, se casaram. Para eles, a motivação também era espiritual.
— Existe um sentimento em nós, em relação à adoção, que na nossa fé, vem de Deus. Quando pensamos nas crianças e adolescentes que foram abandonados, negligenciados, violentados de várias formas, e que hoje não tem ninguém para chamar de pai e mãe, nosso coração dói, a emoção toma conta, e o que nos vem à mente é: “Como gerar um filho biológico, sabendo que milhares de crianças rogam por uma família, um lar?”, e aí não há dúvida, a adoção é o nosso caminho — frisa.
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Foi em uma pesquisa no site Busca Ativa, que reúne perfis de crianças menos procuradas por adotantes, que o casal conheceu João Vitor. Ele tinha apenas 10 meses e um histórico médico delicado: paralisia cerebral severa, epilepsia e dependência de sonda nasoenteral para se alimentar. A conexão foi imediata.
A chegada de João Vitor, em 2 de junho de 2021, transformou completamente a vida de Fabielle e Leandro. Em apenas 10 dias desde o primeiro contato, ele já estava em casa.
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— A sensação era que ele sempre esteve conosco, desde seu primeiro dia de vida. João tinha paralisia cerebral severa, e decorrente disso tinha epilepsia e se alimentava via sonda nasoenteral. Aprendemos rápido a medicar, alimentar, dar banho e fazer dormir. Recebemos da instituição que ele morava toda a rotina, horários, quantidades de leite e medicamentos de tudo que ele precisava. As coisas fluíram muito bem. Tanto eu quanto o Leandro nos sentimos completos ao nos tornamos pais. Sem dúvida, ter filhos é a melhor coisa que existe na terra. Muito desafiador, contudo, o amor que nasce com a chegada desse filho, faz tudo valer a pena —, salienta.
Cuidar de uma criança com deficiência exigia adaptações, dedicação e força emocional. Consultas médicas, terapias, altos custos de produtos específicos e a incerteza sobre o tempo de vida de João faziam parte da rotina. Os médicos alertavam que ele poderia não viver muito. Essa realidade, em vez de paralisar, motivava os pais a viverem cada momento intensamente.
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— Cada ida ao hospital também era muito difícil, havia sim o desgaste físico, mas era pequeno e superável levando em conta a preocupação com a sua melhora e o desejo de levá-lo de volta para casa. Ao mesmo tempo que saber que ele poderia partir logo era triste e desafiador, era o combustível para viver o presente o máximo possível, com todo amor e atenção que conseguíamos. Todos os colos foram dados, todos os beijos e afagos foram ofertados, todas as canções de ninar foram cantadas, nada foi deixado para depois. E, assim, podemos dizer que nossa maior alegria na adoção dos nossos filhos foi identificar neles o maior amor do universo, o maior presente de Deus. Sem dúvida eles deram sentido para nossa vida —, lembra.
Em setembro de 2022, João Vitor faleceu, vítima de complicações pulmonares agravadas pela Covid-19.
— Enfrentar a partida dele foi bem difícil, nada pode se comparar a essa dor. Ninguém consegue imaginar isso sem ter passado pela mesma situação. Ter nossa filha Maria conosco foi um acalento, mas para conseguir seguir em frente, nossa fé em Deus foi essencial. Acreditamos na imortalidade da alma, na multiplicidade de reencarnações do espírito, e assim, ao olharmos para a trajetória de vida do nosso filho, tínhamos a certeza que dor e a dificuldade que ele passou, foi para sua cura e evolução, e que sua volta ao plano espiritual, nossa verdadeira casa, foi um acalento de Deus em sua jornada, e nada poderia ser mais perfeito que a vontade de Deus. Nós aceitamos e o guardamos em nosso coração, crentes que um dia nos encontraremos novamente. Nosso luto foi vivido e segue até hoje, mas há muita paz e alegria por tudo que vivemos. Nós o adotaríamos quantas vezes fosse possível, mesmo sabendo da sua partida em pouco mais de um ano conosco —, afirma.
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A história de Maria Antonella começou antes mesmo da despedida de João. Seis meses após a chegada do primeiro filho, Fabielle sentiu novamente o chamado para adotar. Voltou ao site Busca Ativa e se encantou por uma menina de 10 meses, descendente de haitianos, também com paralisia cerebral e uso de sonda.
— Era linda como uma boneca. Daquele dia em diante, me sentia mãe de dois, mas ela não estava ali —, recorda.
Leandro, inicialmente, demonstrou preocupação sobre como cuidariam de dois filhos com deficiência. Foram dois meses de conversas e cálculos financeiros, até que veio o “sim”. Em 31 de maio de 2022, Maria chegou à família.
— Ela é doce, sorridente, muito alegre. Iluminou nosso lar —, diz Fabielle.
O início da relação entre João e Maria foi cauteloso, mas logo os dois criaram um vínculo especial. João acompanhava a irmã com o olhar e balbuciava como se conversasse. Quando ela não estava bem, ele reagia, chamando a atenção dos pais.
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— Eles tinham muita sintonia. Quando a Maria não estava bem, o João gritava, como se pedisse onde e como ela estava. Era lindo de ver. Durante quatro meses estivemos todos juntos, João, Maria e os papais. Ela chegou e transformou o João no “mano” e ela na “mana”, e eu fico muito feliz por termos tido tempo de presenciar isso —, conta emocionada.
Hoje, Fabielle define a maternidade como a experiência mais transformadora de sua vida.
— Eu digo para mim mesma: “Eu nasci para ser mãe, e mãe pela adoção de crianças com deficiência”. A adoção marcou minha vida. Eu sempre estou lendo, pesquisando, vendo vídeos sobre isso. Com certeza é um dos pilares da minha vida agora. Entendo que a escolha de ter filhos pela adoção é tão linda e cheia de significado quanto a via biológica. Cada uma a sua maneira, nenhuma mais importante que a outra, pois, o ponto principal na chegada de um filho é o amor, e não o seu sangue —, diz.
Sua vivência também trouxe reflexões profundas:
— Conhecer nossos filhos e as lutas que enfrentaram desde pequenos nos fez perceber o quanto Deus foi generoso conosco. Muitas pessoas não têm amor, alimento, segurança, e estão perto de nós, no nosso bairro, na nossa cidade.
Fabielle acredita que quem deseja adotar precisa buscar preparo técnico, conhecimento sobre traumas e necessidades específicas, além de autoanálise.
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— A adoção é um passo lindo, porém grande e desafiador. O adotante precisa sentir essa decisão no coração. Se essa força estiver ali, digo: adotem! Nada é tão gratificante quanto amar um filho e perceber que o sangue que corre em suas veias não define quem ele é, mas sim o seu exemplo e o seu amor como pai e mãe —, conclui.
Antonietas
Antonietas é um projeto da NSC que tem como objetivo dar visibilidade a força da mulher catarinense, independente da área de atuação, por meio de conteúdos multiplataforma, em todos os veículos do grupo. Saiba mais acessando o link.

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