No dia 31 de dezembro de 2019, quando o mundo se preparava para a virada de ano, o Sars-CoV-2, um vírus da família do Coronavírus, entrou em evidência pela primeira vez. Foi quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) recebeu um alerta sobre casos de uma pneumonia “de origem desconhecida” na cidade de Wuhan, província de Hubei, na China. O ocidente, no entanto, seguiu com a vida normalmente, calculando que o vírus estava longe demais.
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Não poderíamos estar mais errados. Cinco anos depois, de acordo com a última atualização do Ministério da Saúde, em 6 de fevereiro, o Brasil acumula 39.159.380 casos de Covid-19 desde o início da pandemia, com quase 715 mil mortes. No mundo, foram mais de 7 milhões de óbitos e 700 milhões de casos, trilhões de dólares perdidos com a economia paralisada por meses de lockdown e sequelas físicas e psicológicas que perduram na vida de milhares de pessoas — entre eles, muitos dos mais de 2 milhões de catarinenses diagnosticados com o vírus.
O primeiro caso no Brasil foi registrado ainda em fevereiro, no dia 26, um dia depois do término do Carnaval. Não demorou muito para que o luto atingisse a primeira família brasileira por causa da doença. No dia 17 de março de 2020, a morte de uma mulher de 63 anos, empregada doméstica de alguém que havia chegado de viagem justamente da Itália, foi confirmada. À época, já eram quase 300 casos confirmados no país.
Antes disso, a Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia feito algo que a população do século 21 jamais achou que passaria algum dia: foi declarada a pandemia da Covid-19, precisamente no dia 11 de março. Depois daquele dia, a vida nunca mais seria igual.
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Questões políticas desviaram foco
Para o infectologista Amaury Mielle, a pandemia da Covid-19 foi politizada no Brasil, com o uso de “questões econômicas e outras questões menores diante de uma crise sanitária muito grande”. À época, diversos estados decretaram o chamado lockdown, com restrições ao acesso a atividades consideradas não essenciais, como bares, restaurantes e o comércio em geral. As medidas eram criticadas pelo então presidente Jair Bolsonaro. Em declaração, ele chegou a dizer que, se dependesse dele, “nunca teremos lockdown”. A responsabilidade pela medida foi repassada para estados e municípios, o que Mielle considera um erro.
— Eu acho que o Brasil enfrentou um amadorismo muito grande. Não formulou políticas realmente de controle, não formulou políticas de testagem, não formulou políticas de tratamento. […] se desviou o foco de um problema, de uma doença muito importante, para questões políticas — pontua.
A cientista Natália Pasternak concorda:
— Tivemos um atraso na compra de vacinas, dificuldades de comunicação oficial para esclarecer sobre a importância de um distanciamento social razoável.
A condução do Ministério da Saúde durante a pandemia passou pelas mãos de quatro diferentes ministros. Na opinião de Pasternak, a comunicação com a população acabou sendo “truncada”, e que esse deve ser “um grande aprendizado para uma próxima vez, de aprender a comunicar o que a gente já sabe, o que a gente não sabe, o que a gente está investigando”. Por isso, ela vê a condução da pandemia no Brasil como uma “sucessão de erros”.
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— A partir do momento em que sabemos que existe uma contaminação respiratória, mudamos as intervenções que precisam ser feitas. Mas temos que explicar isso para a população. São coisas difíceis de explicar, não acho que é fácil, não acho que é questão de pôr a culpa em alguém e dizer que erraram porque eram gestores ruins. Foi uma situação bastante única — explica a cientista.
As vacinas também fazem parte dessa comunicação truncada que Pasternak cita, onde parte da população viu com desconfiança o surgimento de algo que poderia diminuir o número de casos e mortes progressivamente. Para ela, houve uma empolgação por parte da comunidade científica quando as primeiras doses ficaram disponíveis, ainda em dezembro de 2020, com a Pfizer/BioNTech, mas faltou uma explicação para a sociedade sobre como os imunizantes foram desenvolvidos. Hoje, são mais de 522 milhões de doses aplicadas no Brasil.
A economia ou o bem-estar da população?
Com as críticas ao lockdown, também vinham argumentos de que era necessário olhar para a economia na emergência de saúde e para as pessoas que “dependiam de poder sair às ruas para trabalhar”.
— Para muita gente não era uma opção: “eu morro de doença ou eu morro de fome?”, “por que eu não posso trabalhar?” “Como é que eu vou fazer para sustentar minha família?”. Então, essa dicotomia era real para muita gente. Agora, a dicotomia falta, que infelizmente foi usada por muitos políticos, foi de que existia uma escolha a ser feita entre preservar a economia, o comércio e preservar a saúde da população — diz Pasternak.
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A preocupação era, principalmente, com os trabalhadores informais, que não teriam nenhum tipo de compensação caso parassem de trabalhar. Para a cientista, não foi feito um planejamento, na maior parte do mundo, sobre como ajudar essas pessoas. À época, o governo federal criou o chamado Auxílio Emergencial, um benefício financeiro para garantir renda mínima aos brasileiros em situação vulnerável durante a pandemia do Covid-19. O auxílio era destinado para trabalhadores informais, microempreendedores individuais (MEI), autônomos e desempregados, com cinco parcelas de R$ 600 depositadas para o público-alvo.
Pasternak conta que a pandemia deixou muitos legados para a ciência e que, um deles, é a produção de tecnologia de RNA mensageiro para vacinas e medicamentos, que teve o auge durante a emergência de saúde pelo investimento feito na área de estudo.
— Hoje temos tecnologia disponível para fazer outros tipos de vacina a partir de RNA mensageiro, tem muita gente já estudando o uso de moléculas para tratamento de alguns tipos de doenças como o câncer, então teve um avanço técnico muito relevante — explica.
A colaboração internacional também possibilitou que o avanço tecnológico acontecesse de forma rápida, já que se tratava de uma emergência global.
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— Você tem uma colaboração internacional que provavelmente não ia acontecer em outra época e um investimento muito grande, também centralizado. Isso tudo com certeza dá uma alavancada para algumas áreas da ciência — diz Pasternak.
Fim da pandemia?
O infectologista Amaury Mielle e a cientista Natália Pasternak discordam quanto ao fim da pandemia. Apesar da OMS ter declarado como encerrada a emergência de saúde pública no dia 5 de maio de 2023, Mielle diz que, atualmente, “podemos dizer que a pandemia persiste, o que acontece é que poucas pessoas testam para Covid”. Para ele, “ignoramos a pandemia”.
Já Pasternak acha que a pandemia acabou.
— Você não tem picos de número de casos, nem de número de mortes. Aconteceu exatamente o que a gente achou que ia acontecer com a Covid-19: ela se torna uma doença que faz parte do nosso dia a dia e que a gente vai ter que conviver assim como convivemos com os diversos tipos de gripe — explica a cientista.
Para Pasternak, as mortes diárias no país diminuíram por conta da vacinação na população. As vítimas, hoje, são pessoas idosas e com comorbidades. Na última semana, foram registradas 144 mortes pela doença.
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