Inicialmente previsto para ser entregue em 2012, o Contorno Viário da Grande Florianópolis alcançou pela primeira vez a escavação subterrânea completa de um dos quatro túneis duplos do projeto, na semana passada.
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A megaobra promete desafogar o trânsito na região da BR-101 que dá acesso à capital de Santa Catarina ao oferecer uma rota alternativa para o transporte de cargas que corta o litoral do Estado.
A estimativa da Arteris, que controla a concessionária da rodovia, a Autopista Litoral Sul, e é responsável pela obra, é de que 18 mil veículos pesados vão ser desviados por dia da BR-101 para o contorno, que poderá ser atravessado em 38 minutos, com possibilidade de ganho de até uma hora e 22 minutos em horários de pico.
No ano passado, em visita do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, ao canteiro de obras, a Arteris anunciou a finalização da megaobra para dezembro de 2023.
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A promessa ainda gera, no entanto, insatisfação do Ministério Público Federal (MPF) e de parte dos municípios que abrigam o trecho — Governador Celso Ramos, Biguaçu, São José e Palhoça —, que aguardam conclusão mais cedo.
Além disso, ela contraria o que a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), que cedeu a concessão a Arteris e acompanha os trabalhos, prevê em relatórios mensais, com prazos finais se estendendo até fevereiro de 2024, ao menos do túnel 4 e de uma passagem em desnível.
O prazo inicial de entrega total do empreendimento, para dez anos atrás, estava previsto no contrato de concessão do trecho que vai de Curitiba a Palhoça, assinado em 2008 e com duração até 2033.
Segundo a Arteris, a obra rodoviária é a maior em andamento no país e deve ter investimento total de R$ 3,7 bilhões, custeado pela arrecadação dos pedágios — R$1,9 bi já foi colocado no projeto.
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O trajeto tem início com um desvio no km 177 da BR-101, entre Governador Celso Ramos e Biguaçu. Depois, corta São José e volta à rodovia federal na altura do km 220, já em Palhoça.
O que já foi feito
A ANTT estima percentualmente, em relatórios mensais, o andamento acumulado das principais frentes de trabalho, que reúnem diferentes obras.
A divulgação mais recente é referente ao mês de fevereiro. Nela, sete frentes aparecem com obras ainda em andamento mesmo com prazo final para dezembro de 2021 mencionado no próprio documento, destacadas abaixo:
- Trecho Norte A: 6,53%;
- Trecho Norte B: 75,46%;
- Trecho Norte C: 74,65%;
- Trecho Norte 2N: 74,18%;
- Trecho Intermediário Sub trecho 2: 73,08%;
- Túnel 4: 51,45%;
- Trecho Intermediário Sub trecho 3: 96,29%;
- Trecho intermediário Sub trecho 4-A: 92,45%;
- Trecho intermediário Sub trecho 4-B: 91,82%;
- Trecho Sul A: 28,17%;
- Trecho Sul B: 24,70%.
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A reportagem questionou a ANTT se ela reconhece atrasos nos casos verificados, quais eventuais justificativas recebeu da concessionária para cada um deles e se houve aplicação de multa, prevista em contrato entre ambos.
A agência afirmou que ainda consolida os percentuais executados em todas as obras obrigatórias da concessão para o 14º ano de contrato, que vai de março de 2021 ao último mês de fevereiro.
Após isso, ela irá dar oportunidade para a concessionária se manifestar e, se verificada a responsabilidade da Autopista Litoral Sul, será tomada a medida cabível, o auto de infração no caso.
“Somente com a apuração da execução anual a Agência poderá apurar a responsabilidade da concessionária caso sejam verificados atrasos”, escreveu a ANTT em comunicado à reportagem.
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A reportagem enviou questionamentos parecidos à Arteris:
“A empresa reitera que todos os assuntos relacionados às obras, bem como a necessidade de adequação em seus cronogramas, são reportados à ANTT, que acompanha e fiscaliza o seu andamento”, comunicou, em nota.
A controladora da Autopista Litoral Sul reiterou que executa obras em todo o contorno, que trata ele como prioridade para ser concluído no fim de 2023, quando pretende então liberá-lo para circulação de veículos.
A concessionária afirmou ainda que 11 dos cerca de 50 quilômetros de pista dupla da rodovia foram pavimentados. Também estão prontas sete das 20 passagens em desnível e quatro das sete pontes inseridas no projeto.
O contorno ainda terá seis acessos por trevos, com um deles já completo. Os demais têm obras em andamento.
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Entre eles, se destacam o trevo de interseção do contorno com a BR-282, que tem um viaduto em construção, e outros dois que acessam as partes norte e sul da BR-101.
Esses dois últimos ainda passam por trabalhos de geotecnia, para avaliação das condições do solo — o primeiro deles também está submetido a serviços de terraplanagem.
A megaobra tem também mais três túneis duplos em fase de escavação subterrânea, para vazamento de um lado ao outro, o que já foi atingido no túnel 4.
“Atualmente, 2.295 trabalhadores atuam nas diversas frentes de obras do Contorno Viário e 415 equipamentos pesados estão em operação. As atividades são realizadas 24 horas por dia, de segunda a sábado”, escreveu a Arteris, em nota à reportagem.
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Origem dos atrasos
Em linhas gerais, a megaobra pode ser dividida em três trechos. Os dois mais avançados são o Intermediário e o Norte, que somam cerca de 34 quilômetros e tiveram início em 2014 e 2015, respectivamente, após mudanças do projeto previsto no contrato da concessão.
Já o chamado Trecho Sul, que passa por Palhoça, foi iniciado só em fevereiro do ano passado, por conta de uma nova alteração, em 2018. Ela foi motivada pelas construções habitacionais que surgiram sobre o traçado original ao longo do anos.
No passado, o município de Palhoça defendeu uma nova mudança deste trecho mais problemático ao citar a segregação de bairros, o que não foi acatado.
Quando alterada, a nova rota do Trecho Sul, de 15 quilômetros, previu cortar uma área montanhosa de Mata Atlântica, o que passou a exigir a construção de mais três túneis, que tornaram a obra mais cara e trabalhosa — são os que ainda não foram perfurados por completo.
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Antes de ser posta em prática, a alteração impôs ainda uma nova rodada de desapropriações, obtenção de licenciamentos socioambientais e aprovação da ANTT, além de um aditivo de custeio de R$ 1 bilhão, que impactou a tarifa dos pedágios — e isso só se deu após uma longa disputa judicial, que só foi parcialmente resolvida.
Disputa de prazos
Em 2019, o município de Palhoça deu início a uma ação civil pública contra a ANTT e a Autopista Litoral Sul por conta do atraso de início das obras do Trecho Sul. Em paralelo, o MPF acompanhava o andamento da megaobra em um inquérito civil.
A concessionária afirmava que, para executar o novo traçado, precisaria estabelecer com a ANTT uma mudança nas tarifas, para reestabelecer o equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão assinado em 2008.
O MPF reuniu então as partes do caso, incluindo também o município de Biguaçu, para assinar um Termo de Ajuste de Conduta (TAC) de caráter parcial em fevereiro de 2020.
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O acordo citava prazos para que a concessionária e a Arteris definissem o reajuste da tarifa e estabelecia um período de 36 meses para a entrega do contorno.
Ainda hoje, o MPF conta esses três anos a partir da data de assinatura do TAC parcial e espera, portanto, a finalização da megaobra para fevereiro de 2023.
O município de Biguaçu cobra prazo semelhante e disse que pretende pedir a liberação imediata de trecho entre a BR-101 e a SC-407 quando ele estiver apto para rodagem.
Já Palhoça adota um outro critério. O município conta os 36 meses a partir de junho de 2020, quando uma sentença da Justiça Federal, onde corre sua ação civil pública contra a ANTT e a concessionária, homologou o TAC parcial de quatro meses antes.
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O município de Governador Celso Ramos, por sua vez, disse esperar conclusão no prazo estabelecido pela concessionária. Já São José, outro que abriga o contorno, não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.
Naquele ano de 2020, o novo arranjo das tarifas entre a ANTT e Autopista Litoral Sul ainda sofreu contestações do Tribunal de Contas da União (TCU). O termo aditivo ao contrato de concessão que permitiu, enfim, o início das obras só saiu em dezembro.
À reportagem, a concessionária afirmou se comprometer com esse contrato estabelecido junto à ANTT, sem citar o TAC nem a sentença judicial anteriores.
“A Arteris Litoral Sul reafirma o seu compromisso com as obras do Contorno Viário da Grande Florianópolis e trabalha para concluir essa que é a maior obra rodoviária em andamento no Brasil dentro do prazo acordado com a agência reguladora”, pontuou.
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Conflito na Justiça
A ação civil pública de Palhoça segue na Justiça. O MPF, que se manifesta nela como interessado, pede uma indenização de R$ 10 milhões a ser paga pela Arteris ao município devido aos danos morais coletivos causados pelos atrasos.
Além disso, a Procuradoria pede aplicação de multa à Arteris por afirmar que ela deveria ter entregue os trechos Norte e Intermediário ao final do ano passado,
Esse prazo está estabelecido no TAC parcial e foi descumprido com alegação da concessionária de que a pandemia do coronavírus atrasou o cronograma, mas sem apresentar provas, segundo afirma a Procuradoria.
A multa seria de R$ 20,5 mil por dia, equivalente a cinco mil vezes o valor do pedágio para carros na praça de Palhoça, atualmente em R$ 4,10. A Justiça aguarda perícia técnica para tomar uma decisão sobre isso.
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À reportagem, a Procuradoria disse acompanhar as obras e se reunir com a concessionária periodicamente.
No último dia 7, anunciou que passou a ter ajuda nisso de um grupo de trabalho da Rede de Controle da Gestão Pública, que reúne entidades e órgãos de Santa Catarina.
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