Um esquema de estelionato que lesou ao menos 215 idosos e pessoas vulneráveis foi alvo de uma operação do Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas (Gaeco) na manhã desta terça-feira (22). Foram cumpridos 13 mandados de prisão e 35 de busca e apreensão em 12 municípios nos estados de Santa Catarina, Ceará, Alagoas, Bahia e Rio Grande do Sul. O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) estima que mais de mil pessoas tenham sido prejudicadas pelo grupo. 

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De acordo com o MP, o esquema operava por meio de empresas de fachada que adquiriam créditos judiciais de idosos por valores irrisórios. As vítimas, que têm idade média de 69 anos, eram abordadas em casa ou por meio do site do Instituto de Defesa do Aposentado e Pensionista (IDAP), e induzidas a assinar contratos de cessão de crédito. Integrantes do esquema levavam as pessoas a cartórios para reconhecimento de firma, visando dar aparência de credibilidade à negociação.

Os criminosos lucravam com a diferença entre os valores judiciais e os pagamentos feitos. Investigadores encontraram planilhas detalhando a divisão de lucros e provas de lavagem de dinheiro. Em um dos casos, uma vítima com direito a R$ 146 mil recebeu apenas R$ 2,5 mil (1,71% do valor). No total, mais de R$ 6 milhões foram desviados, com as vítimas recebendo menos de 10% do que lhes era devido, segundo o MP.

Conforme os procuradores, os criminosos atuavam em Santa Catarina, Ceará, Alagoas e Rio Grande do Sul, com foco na captação de vítimas em regiões específicas. O escritório investigado também declarou atuação no Paraná e planos de expansão para São Paulo e demais estados brasileiros, segundo o MP.

O instituto IDAP tem ligação com duas empresas: a Ativa Precatórios e a BrasilMais Precatórios. A primeira teria concentrado as operações na região Oeste de Santa Catarina, enquanto a segunda, sediada no Ceará, expandiu as atividades para o Rio Grande do Sul.

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Além dos mandados de prisão e busca e apreensão, foram cumpridos 25 apreensões de veículos e 16 ordens de bloqueios de contas bancárias de 13 investigados e das três empresas. Conforme o MP, os bloqueios foram de até R$ 2 milhões, para garantir o pagamento de multas judiciais ou indenizações em caso de condenação.

O NSC Total entrou em contato com a IDAP, a Ativa Precatórios e a BrasilMais Precatórios, mas não recebeu retorno até o fechamento desta reportagem. O espaço segue aberto.

O que apontam as investigações

As investigações, que já duram mais de um ano, mostram que os contratos de cessão eram assinados em nome das empresas de fachada Ativa Precatórios e BrasilMais Precatórios, porém os alvarás eram todos expedidos em nome do escritório de advocacia da pessoa que a investigação apontou como chefe da organização criminosa. Depois, os valores eram, em parte, transferidos para as empresas ou rateados entre os integrantes do grupo criminoso. 

Durante a investigação foram identificadas planilhas de controle financeiro detalhando a divisão de lucros, comissões pagas, investimentos e despesas. Também foram coletados registros de procurações e substabelecimentos que indicam a transferência de poderes de representação entre os criminosos que extrapolavam a função de advogado e as empresas.

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Segundo as apurações, por meio da empresa de fachada Ativa Precatórios, da cidade de Pinhalzinho, no Oeste do Estado, foram liberados pela Justiça um total de R$ 924.479,10, mas pagos às vítimas apenas R$ 91.600,00, representando uma taxa de pagamento de apenas 9,91% do valor real devido, uma apropriação indevida de R$ 832.879,10.  

Já por meio da BrasilMais Precatórios, com sede em Fortaleza, no Ceará, foram liberados R$ 5.106.773,12, mas vítimas receberam somente R$ 503.750,00, resultando em uma taxa de pagamento de apenas 9,86% do valor devido, uma apropriação de R$ 4.603.023,12. 

Como funcionava o esquema

Esquema lesou ao menos 215 vítimas, conforme o MP (Imagem: MPSC, Divulgação)

Aquisições pós-sentença e patrocínio infiel

A investigação aponta que o esquema estaria utilizando as empresas de fachada para aquisição de créditos judiciais e como instrumento para formalizar as cessões fraudulentas e, ao mesmo tempo, com método para distanciar os criminosos, que extrapolavam a função de advogado, das reclamações e questionamentos das vítimas.

Como as empresas de fachada eram as novas detentoras dos créditos judiciais, quaisquer esclarecimentos ou questionamentos financeiros eram direcionados a elas, sob a aparência de legalidade e boa-fé, conforme o MP.

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A análise dos dados revelou que as empresas adquiriam os direitos sobre os créditos mesmo após as sentenças de primeira ou segunda instância, quando o direito da vítima já estava consolidado. Essa prática visava maximizar os lucros do grupo, assumindo menor risco processual.  

Há fortes indícios de crime de patrocínio infiel, onde os criminosos que extrapolavam a função de advogado, valendo-se da estrutura de empresas criadas pela organização criminosa, atuavam em conflito de interesses com seus próprios clientes, em clara afronta à lei e à ética da advocacia, desviando os direitos dos idosos para o caixa do grupo, conforme a promotoria.

Como vítimas podem denunciar

O caso chegou ao MP após denúncias. Pessoas que se identificarem como vítimas do esquema devem procurar a Delegacia de Polícia Civil mais próxima para registrar um boletim de ocorrência, o qual será posteriormente encaminhado ao órgão. Também podem contatar a Ouvidoria do Ministério Público ou a Promotoria de Justiça de Modelo, no Oeste do Estado.  

Onde denunciar

  • Promotoria de Justiça da Comarca de Modelo – Whatsapp: (49) 99200-7462
  • Ouvidoria do MPSC: E-mail: ouvidoria@mpsc.mp.br / Fone: (48) 3229-9306 ou 127, das 9h30min às 19h
  • Delegacia de Polícia mais próxima 

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