A mulher de 23 anos que foi presa ao final do ato pela democracia em Florianópolis, na noite desta quinta-feira (11), é suspeita de ter cometido quatro crimes na ocasião. Ela está detida na penitenciária feminina da capital catarinense, ao menos até que haja uma audiência de custódia, prevista para as 14h desta sexta (12), quando pode ser solta.

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A manifestante teria cometido os crimes de pichação e dano ao patrimônio público, desacato, resistência e lesão corporal, segundo a Polícia Civil. O prazo de detenção previsto para todos os crimes impediu que fosse feito um termo circunstanciado, o que liberaria ela já na Central de Plantão Policial (CPP), ou o arbitramento de fiança.

O boletim de ocorrência identifica que ela teria mordido o braço de um policial militar, xingado os agentes que abordaram ela na ocasião do ato e desobedecido a ordens de parada e de prisão no momento em que foi flagrada fazendo uma pichação.

A prisão e a confusão ocorreram na Rua Tenente Silveira, no Centro de Florianópolis, no encerramento de uma série de atos em defesa da democracia, com participação de estudantes, professores, sindicalistas, entidades da sociedade civil e movimentos sociais.

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Durante a manhã, houve a leitura de uma carta na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), repetindo um movimento nacional. À tarde, houve ato no Largo da Alfândega. De lá, partiu uma passeata pelo Centro que deveria ser encerrada no Ticen. No meio dela, no entanto, houve a confusão.

O que dizem os manifestantes

À reportagem, a advogada Daniela Felix, que atuará em defesa da mulher detida, disse que ainda não havia tido contato com o auto de prisão em flagrante e que eventualmente se posicionaria após a audiência de custódia. Manifestantes faziam uma vigília desde a manhã desta sexta em apoio à jovem.

Já a UFSC, onde a manifestante estuda, declarou repúdio à postura da PM e disse ser significativo o caso ter se dado após um ato pró-democracia.

“A jovem, detida supostamente por fazer pichações, foi imobilizada à força, em atitude de nítida truculência. No momento da prisão fica evidente a atitude injustificável dos policiais, que deveriam estar no ato para garantir a segurança dos manifestantes”, escreveu a direção da UFSC, em comunicado emitido na manhã seguinte à prisão.

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A comissão organizadora do protesto, formada por oito entidades (DCE UFSC, APG UFSC, DCE Udesc, Ubes, UCE, Sintrasem, Fenet e Grêmio Livramento do IFSC), também se manifestou, em críticas à atuação da PM e ao tratamento dado à prisão.

“Agravantes de criminalidade foram forjados para manter a estudante à noite na delegacia, abrindo precedente para tranferi-la ainda durante a madrugada para o presídio feminino”, afirmou, também em nota.

Acrescentou ainda que uma outra pessoa presente no local acabou ferida no pé, inclusive com fratura, devido aos tiros de bala de borracha disparados pela PM.

Atuação necessária e reativa, diz PM

À reportagem, o comandante do batalhão da PM envolvido na ocorrência, o tenente-coronel Dhiogo Cidral, disse que atuação dos policiais foi necessária e reativa.

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Cidral afirmou que, antes de iniciada a confusão, a mulher agora detida fazia pichações no centro de Florianópolis, assim como outros manifestantes. Os policiais teriam então dado ordem de parada e de prisão a ela, o que não foi acatado.

A mulher teria passado então a xingar os agentes de segurança enquanto fugia em meio à multidão para não ser contida. Neste momento, ainda segundo Cidral, os policiais passaram a fazer uso da força ao se verem cercados pela massa de manifestantes, para que pudessem dispersar as pessoas e efetuar a prisão da suspeita.

Já contida, a mulher teria insistido, ainda assim, em não ser presa. Foi quando teria mordido um dos policiais. Em um primeiro momento, a PM comunicou que o ferimento teria sido no rosto, mas depois corrigiu a informação, ao dizer que se deu no braço direito do agente. Ele teve uma lesão superficial e passa bem, segundo a corporação.

Imagens do protesto

A reportagem questionou Cidral se a PM entende que houve truculência e exagero em ao menos três momentos flagrados por imagens da NSC TV: na ocasião em que a mulher já presa é agarrada por policiais, na que um policial dá cassetadas em um manifestante e na que um agente à cavalo atinge uma pessoa com o animal.

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O comandante do 4º Batalhão da PM afirmou que a mulher precisou ser contida por não acolher a ordem de prisão. Disse que o policial fez uso do cassetete apenas para abrir espaço, sem perseguir manifestante algum. Acrescentou ainda que a cena com o cavalo foi acidental, e não proposital, devido ao movimento natural do animal ao ser freado.

— Toda e qualquer manifestação é legítima, mas desde que ocorra sem o cometimento de transgressões, para que ela não comprometa outros direitos também constitucionais nem a dinâmica da cidade — afirmou Cidral à reportagem.

Questionado se a PM deveria ter se preparado de outra maneira para acompanhar o ato ou com maior efetivo para evitar as situações de conflito e de ter sido cercada, o tenente-coronel ratificou mais uma vez a atuação dos policiais e disse que eles não foram comunicados com antecedência pelos organizadores sobre a realização do ato, o que deveria ter sido feito, por ele ocupar o espaço público.

À reportagem, a comissão organizadora disse ter comunicado a Guarda Municipal de Florianópolis (GMF) e o Departamento de Operações de Trânsito, por recomendação da Secretaria de Segurança Pública, sobre o ato e o trajeto que ele ocuparia.

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Veja a íntegra do posicionamento da UFSC

“A Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) apresenta veemente protesto contra o uso da força excessiva, truculência e abusos cometidos pela Polícia Militar do Estado de Santa Catarina na prisão de uma estudante da Universidade que participava do ato em defesa do Estado Democrático de Direito. A jovem, detida supostamente por fazer pichações, foi imobilizada à força, em atitude de nítida truculência. No momento da prisão fica evidente a atitude injustificável dos policiais, que deveriam estar no ato para garantir a segurança dos manifestantes.

É simbólico que isso tenha ocorrido no mesmo dia em que a UFSC abriu suas portas para acolher um evento pró-democracia. Inadmissível, também, é convivermos com atitudes autoritárias em repressão a manifestações pacíficas e legítimas em favor da liberdade e dos direitos sociais e fundamentais.

Atos isolados, suposições ou preferências ideológicas não podem ser alegados por integrantes de forças de segurança para justificar truculência contra manifestações a favor da democracia. Em um período como o que vivenciamos, é fundamental que as forças de segurança permaneçam restritas às suas atribuições constitucionais. Infelizmente, atualmente convivemos com o aparelhamento de partes do Estado que são fundamentais para o próprio funcionamento da democracia. É importante estarmos alertas.

Os atentados contra a democracia não ocorrem de maneira generalizada. Eles são realizados em pequenas atitudes como as que presenciamos nesta noite de 11 de agosto. A sociedade não pode ter vergonha de lutar pela democracia, pela preservação do direito de livre manifestação do pensamento e das ideias: “Estado democrático de direito sempre!”

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Por outro lado, a UFSC espera uma manifestação do governo do Estado de Santa Catarina sobre as orientações a sua força de segurança para lidar com este momento histórico do país, no que se refere a defesa da democracia, bem como sobre este caso em particular.”

Veja a íntegra do posicionamento dos organizadores do ato

“Posição da Comissão de Organização sobre ação da polícia no ato 11.07 em Florianópolis:

A jovem foi injustamente detida com uma abordagem desproporcional, por cerca de 8 policiais homens, com tamanha agressividade e truculência, forçando a estudante a se ajoelhar e sentar no chão aos berros. Enquanto tentamos negociar e exigir a liberação da estudante, outros policiais armados se aproximaram e dispararam balas de borracha contra os manifestantes, atingindo um morador de ocupação no pé, o qual teve fratura no osso, lesões nos ligamentos e nos tendões; ademais, colocando a cavalaria para cima das pessoas que ocupavam a rua.

Agravantes de criminalidade foram forjados para manter a estudante à noite na delegacia, abrindo precedente para tranferi-la ainda durante a madrugada para o presídio feminino.

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A comissão responsável pela organização do ato do dia 11 em Florianópolis e todas as entidades estudantis e sindicais que a compõem repudiam a ação violenta e truculenta da Polícia Militar que utilizou de força excessiva em um ato que tinha como uma de suas bandeiras, justamente a defesa pelas liberdades democráticas e repúdio às políticas autoritárias do Governo Federal.”

Veja a íntegra do posicionamento da PMSC

“A Polícia Militar de Santa Catarina, através desta, vem atualizar o seu posicionamento a respeito da ocorrência registrada durante manifestação realizada nas ruas centrais de Florianópolis, na última quinta-feira, 11, no final da tarde.

Ocorrência acompanhada e atendida por policiais do 4º Batalhão de Policia Militar (Capital).

1) Durante a manifestação, houve a observação de flagrante crime com uma mulher pichando um imóvel, depredando-o, conforme registro em anexo;

2) No momento da prisão os policiais foram cercados e os manifestantes tentaram libertar a detida. Desta forma, foi necessário o uso progressivo da força para o devido afastamento dos policiais que estavam em menor número;

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3) Além das varias ofensas verbais, um policial foi ferido no braço, como relatado em foto em anexo;

4) A feminina presa em flagrante foi encaminhada para a Polícia Civil. Em nota, a Polícia Civil destacou que:

“A respeito do fato, a mulher foi encaminhada pela Polícia Militar na noite de quinta-feira (11/08) à Central de Plantão Policial (CPP) da Polícia Civil, em Florianópolis. Diante de situação flagrancial respaldada por prova testemunhal, imagens e laudo de uma forte mordida no braço do policial militar, ela foi autuada em flagrante delito pelos crimes de pichação e dano ao patrimônio público (lei 9.605), desacato, resistência e lesão corporal ao policial militar. Depois, ainda à noite, ela foi encaminhada ao sistema prisional da Capital, onde aguarda por audiência de custódia com o Judiciário.”

5) Desta forma, a Polícia Militar de Santa Catarina ressalta que também foram registradas outras diversas depredações em prédios e bens de uso comum da comunidade (conforme fotos em anexo);

6) A PMSC sublinha que acompanha ao longo dos anos toda e qualquer tipo de manifestação, prestando todo apoio e orientação para que sejam realizadas de forma pacífica e com respeito aos princípios constitucionais, como tem ocorrido em inúmeros eventos deste tipo nos últimos anos;

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7) Diante dos fatos, com a lesão do policial militar, ferido em serviço, a PMSC está instaurando Inquérito Policial Militar para apuração dos fatos e de responsabilidades;

A Polícia Militar de Santa Catarina reafirma o seu compromisso com a sua missão constitucional de manutenção e de preservação da ordem pública, agindo sempre e de acordo com a lei.”

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