O anúncio da possível retirada da exigência de aulas em autoescola para tirar a Carteira Nacional de Habilitação (CNH) gerou alerta entre os especialistas de trânsito em Santa Catarina. Segundo o ministro dos Transportes, Renan Filho, o objetivo da medida é baratear o processo e ampliar a oferta do documento. A declaração foi feita durante entrevista à Globo News na tarde de terça-feira (29).
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— A gente tem uma quantidade muito grande de pessoas dirigindo sem carteira porque ficou impeditivo. Tirar uma carteira no Brasil é entre R$ 3 mil e R$ 4 mil. O cidadão não aguenta pagar isso. E quando o custo de um documento é impeditivo o que acontece? A informalização, as pessoas dirigem sem carteira e esse é o pior dos mundos — alegou o ministro.
O novo modelo pode reduzir o custo do documento, nas categorias A e B, em até 80%. Ainda de acordo com Filho, o Ministério discute a proposta com o Governo Federal e planeja não alterar as leis de trânsito, para garantir que o assunto não vire “um debate longo no congresso”.
— A gente acredita que pode, por meio da regulamentação das normas, facilitar e desburocratizar para o cidadão — disse o ministro.
A pesquisadora em segurança do trânsito Márcia Pontes afirma que, em 2024, foram registrados 71 mortes por dia devido a acidentes. Esse número representa um aumento de 8,9% em comparação com o ano interior. Além de considerar o projeto irresponsável, a especialista alerta que pode ajudar, inclusive, no sucateio do Sistema Único de Saúde (SUS), que gasta cerca de R$ 50 bilhões com acidentes de trânsito por ano.
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— Nós já tivemos um modelo desse no Brasil, há muito tempo, que não funcionou, disparou a acidentalidade. A sinistralidade de trânsito tende a triplicar ou mais com uma medida populista dessa, pensando no bolso do brasileiro. Nós já temos o programa CNH Fácil, o programa CNH Social. A quinquagésima alteração no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) foi sobre isso. Pegar dinheiro das multas para financiar programas sociais — diz.
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Entenda a proposta
Segundo o ministro dos Transportes, cerca de 20 milhões de brasileiros já dirigem sem estar habilitados.
— E se você for olhar, por exemplo, as pessoas que compram moto, 40% delas, quando a gente faz um cruzamento entre o CPF de quem comprou e se ele tem ou não habilitação, não possuem habilitação. Só compram a moto e não possuem habilitação — disse na entrevista.
O Ministério defende que o melhor caminho para diminuir os problemas de qualificação de motoristas e ampliar a oferta de CNHs no país é o barateamento do processo. De acordo com Renan Filho, uma pesquisa realizada pelo órgão constatou que o custo elevado é o principal motivo para as pessoas não terem a carteira de habilitação.
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— A gente precisa baratear, utilizar as novas tecnologias, dar condição ao cidadão de ter formação digital, para que ele tenha conhecimento, porque o pior condutor é aquele que está no trânsito agora e não teve nenhuma condição de ser habilitado — diz Renan Filho.
A medida é inspirada em práticas adotadas em países como Estados Unidos, Canadá, Inglaterra, Japão, Paraguai e Uruguai, onde os modelos de formação são mais flexíveis e centrados na autonomia do cidadão.
O ministro ainda afirmou que, mesmo com a flexibilização da exigência, os cursos continuarão existindo para qualificar os cidadãos. Segundo a proposta, as aulas práticas, que antes tinham uma exigência mínima de 20 horas-aula, passarão a ser opcionais e sem exigência de carga horária mínima.
O candidato poderá contratar um centro de formação ou um instrutor autônomo credenciado nos Detrans e na Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran), obtendo sua formação da forma que achar mais adequada e minimizando os custos.
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Procurado pela reportagem do NSC Total, o Detran de Santa Catarina afirmou que, até o momento, as informações divulgadas são incipientes e carecem de detalhes técnicos e normativos que permitam um parecer conclusivo ou a adoção de novas diretrizes.
“O Detran/SC reconhece e valoriza o papel essencial desempenhado pelos Centros de Formação de Condutores ao longo dos anos. Essas instituições são responsáveis por formar condutores mais conscientes, preparados e comprometidos com a vida no trânsito. Portanto, até que novas normativas sejam oficialmente publicadas e detalhadas, o processo de habilitação em Santa Catarina permanece inalterado, seguindo as exigências atuais que incluem a formação teórica e prática em CFCs credenciados”, afirmou o órgão em nota.
“Medida catastrófica”
Márcia Pontes ainda afirma que o Brasil é um dos países que mais mata no trânsito. Apesar disso, ela garante que o CTB, que foi sancionado em 1987 e entrou em vigor em 1988, é considerado um dos códigos mais modernos da história do país.
— O processo de formação de condutores tem falhas, sim, mas ele precisa ser melhorado. (…) Implantar novas medidas é obrigação do governo. Agora, cortar justamente a única estrutura de formação que temos hoje é irresponsabilidade. (…) Essa é uma medida catastrófica, desastrada, um tiro no pé e a população brasileira inteira vai pagar a conta — alerta.
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Ainda, durante a entrevista, o ministro dos Transportes salientou que “é importante destacar que as autoescolas seguirão oferecendo as aulas e que a exigência de aprovação nas provas teórica e prática dos Detrans será mantida”.
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