Em mais um ano, o mês de maio é marcado pelas mesmas notícias em Santa Catarina. As doenças respiratórias, especialmente a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) registram um crescimento elevado no número de casos, e pressionam o sistema de saúde. Em contrapartida, a campanha de imunização contra a gripe enfrenta desafios para avançar nos percentuais de cobertura.

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A médica infectologista e diretora do Hospital Nereu Ramos, Renata Zomer, confirma que esse fenômeno que resulta em um aumento na taxa de ocupação dos leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) tem sido recorrente neste período. A chegada do frio é um dos motivos, já que ele favorece a circulação de vírus respiratórios, como a gripe (influenza), Covid-19 (SARS-CoV-2), bronquiolite (vírus sincicial respiratório – VSR), o rinovírus, entre outros.

— Além disso, nesse período é comum que as pessoas permaneçam mais tempo em ambientes fechados e com pouca ventilação, o que facilita a transmissão desses agentes infecciosos. Esse conjunto de fatores resulta em um aumento expressivo de casos de infecções respiratórias, algumas das quais evoluem para formas graves que exigem internação hospitalar e suporte intensivo — explica.

Baixa cobertura vacinal complica cenário

A infectologista Maysa Bonfleur Nascimento aponta ainda para outra preocupação: a baixa cobertura vacinal. Segundo informações da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), atualizados na terça-feira (6), Santa Catarina havia aplicado 634.309 doses da vacina contra a gripe. A cobertura vacinal é equivalente a 20,56% entre os grupos de gestantes, crianças e idosos.

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Os grupos prioritários, que estão sendo vacinados na rede pública de saúde, incluem ainda pessoas com doenças crônicas ou deficiência, e trabalhadores da saúde, educação, segurança e transporte, e representam ao todo 2.033.845 pessoas. A infectologista Maysa destaca como fundamental a busca pela vacinação em um momento de superlotação das UTIs e hospitais e aumento de doenças respiratórias.

— A vacinação é fundamental. Ela reduz as chances de infecção e, principalmente, das formas graves da doença que demandam internação. Estudos demonstram que a vacina pode reduzir em até 60% o risco de hospitalização por influenza, principalmente entre os grupos mais vulneráveis, como idosos, crianças pequenas e pessoas com comorbidades. Além disso, com menos pessoas doentes, diminuímos a circulação dos vírus, o que também protege os não vacinados e ajuda a aliviar a pressão sobre o sistema de saúde — afirma.

Maysa afirma que a percepção equivocada de que a gripe é uma doença leve acaba desestimulando muitas pessoas a se vacinar, mesmo quando elas integram os grupos prioritários. Ainda, possíveis efeitos colaterais, leves e esperados, geram insegurança.

Essas questões, somadas à desinformação sobre as vacinas que circulam na internet, são alguns fatores que colaboram para um baixo percentual de vacinação, mesmo diante de um crescimento nos casos de doenças respiratórias.

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Cidades em emergência

A prefeitura de Florianópolis declarou situação de emergência em saúde pública por conta do aumento dos casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) na cidade no dia 1º de maio.

Na quarta-feira (7), a prefeitura da Capital anunciou que a vacina contra a gripe seria liberada para toda a população a partir dos 6 meses de idade. A medida, que estava prevista para o Dia da D da vacinação, no sábado (10), foi adiantada com o objetivo de reduzir complicações, hospitalizações e óbitos causados pela gripe, especialmente entre os grupos mais vulneráveis.

O decreto de emergência autoriza a contratação de pessoal e compra de insumos, como leitos na rede privada, em caráter emergencial.

No dia 5 de maio, a prefeitura de Itajaí, no Litoral Norte, seguiu o mesmo protocolo, decretando emergência. Com isso, a previsão do secretário de Estado da Saúde, Diogo Demarchi Silva, era realizar a compra de 12 leitos temporários de UTI pediátrica no Hospital Pequeno Anjo para Itajaí.

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Diferenças entre gripe e SRAG

Ainda que estejam relacionadas, a gripe comum e a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) possuem diferenças. A gripe, causada pelo vírus Influenza, costuma causar sintomas leves a moderados, como febre, dor no corpo, tosse e mal-estar. A Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) é um quadro mais grave, que exige internação e pode até levar à morte, como explica a médica Renata Zomer.

— A Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) representa um quadro clínico mais severo, caracterizado por sinais de gravidade, como dificuldade respiratória, queda na saturação de oxigênio, necessidade de hospitalização e, em casos mais graves, insuficiência respiratória e óbito. A SRAG pode ser causada por diversos agentes respiratórios, incluindo o próprio Influenza, o SARS-CoV-2 e o vírus sincicial respiratório, por exemplo — pontua.

De acordo com dados do painel do Centro de Informações Estratégicas para a Gestão do SUS de Santa Catarina (Cieges/SC), consultado na quarta-feira (7), foram registrados em Santa Catarina 3.007 casos de SRAG. Destes, 2.949 foram hospitalizados, sendo 735 em UTIs. Até o momento, foram registrados 137 mortes por conta da doença.

A infectologista Renata Zomer reforça a vacinação como uma estratégia para a redução de casos graves de infecções respiratórias, especialmente nos grupos mais vulneráveis, como idosos, crianças, gestantes e pessoas com comorbidades.

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— Ao diminuir a circulação do vírus Influenza, a imunização reduz tanto os atendimentos ambulatoriais quanto as internações hospitalares por complicações da doença. Em um cenário de alta demanda por serviços de saúde, como o que vivemos atualmente, a vacinação é também uma medida coletiva de proteção e contribui diretamente para aliviar a pressão nos sistemas hospitalares e preservar os leitos para os casos mais críticos — alega.

Esses resultados, contudo, não são imediatos. Por isso a importância da população buscar a vacinação o quanto antes, e associar a imunização a outras ações, como evitar aglomerações e manter os ambientes arejados. Dessa forma, é possível se proteger das doenças respiratórias e proteger os outros, explica a médica infectologista e diretora do Hospital Nereu Ramos.

— Se mais pessoas se vacinarem contra a gripe agora, os resultados devem começar a aparecer em cerca de duas a três semanas, que é o tempo que o corpo leva para criar proteção. Com mais gente protegida, principalmente os mais vulneráveis, como idosos e pessoas com doenças crônicas, caem as chances da gripe virar um caso grave — o que ajuda a evitar internações e a liberar os leitos das UTIs — explica Renata.

Ocupação dos leitos de UTI

Na atualização da tarde de quarta-feira (7), o Painel de Leitos de UTI de Santa Catarina apontava que a taxa de ocupação geral no Estado era de 91,2%. As situações mais críticas eram do Planalto Norte e Nordeste e da Foz do Rio Itajaí, que estavam com 95,6% e 96% de ocupação geral dos leitos, respectivamente. 

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Se analisados somente os leitos de UTI adulto, a região Sul e a Foz do Rio Itajaí estavam completamente lotadas, com 100% de ocupação. Nas demais regiões, o quadro também é crítico, com Vale do Itajaí (98,8%), Grande Oeste (97,1%), Grande Florianópolis (96,7%), Planalto Norte e Nordeste (96,7%), Serra catarinense (96,5%) e Meio Oeste (91,1%). A Foz do Rio Itajaí também estava com 100% dos leitos de UTI neonatais ocupados.

O que diz o secretário da Saúde

Em entrevista ao NSC Total, o Secretário de Estado da Saúde de Santa Catarina, Diogo Demarchi Silva explicou quais ações têm sido tomadas a longo prazo e de forma pontual para reverter esse quadro e ampliar o número de leitos no UTI Estado. Confira na íntegra:

Esse cenário de UTIs lotadas e de baixa vacinação no mesmo período, é um cenário que se repete. O que pode explicar essa situação?

A sazonalidade na saúde ocorre em vários momentos. Nós estamos até o final de maio em um período mais agudo relacionado à dengue. E já iniciamos agora a questão das síndromes respiratórias, com gripe e outros vírus. Então, a sazonalidade da saúde acaba acontecendo em várias situações diferentes, como agora no caso da SRAG com essa sobrecarga. Nós tivemos uma sobrecarga já em 2023, principalmente na pediatria. E desde o início do nosso governo, com o governador Jorginho Mello, nós identificamos ainda na época que a secretária era a Carmen, eu era adjunto dela, a necessidade de expansão de leitos de UTI. 

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Porque nós ficamos anos e anos sem uma expansão adequada para os leitos de UTI, considerando a expansão da população em Santa Catarina. Nós vimos o período da pandemia quando foram criados muitos leitos, mas eles foram criados de maneira provisória, temporária, não de maneira fixa. Então o que que nós fizemos já em 2023: olhamos região por região do Estado para fazer uma expansão de leitos de UTI, seja ele adulto, pediátrico ou neonatal. Então, a partir desse planejamento, nós começamos a dialogar com os secretários, com os hospitais, onde nós poderíamos expandir.

E assim nós estamos fazendo desde 2023. Foi uma expansão onde nós colocamos leitos de UTI, eu não estou falando de leitos intermediários. Nós expandimos 264 leitos de UTI, ultrapassando mais de 1.430 leitos no Estado. Só para ter uma ideia, o chamado “legado da pandemia” foram 230 leitos incorporados após a pandemia, onde nós tivemos aí em Santa Catarina 600, 700 leitos temporários.

Então, nós estamos falando que em dois anos nós expandimos mais leitos do que o chamado “legado da pandemia”. Se nós não tivéssemos expandido esses leitos, nós já teríamos colapsado de várias maneiras na rede estadual num momento como esse. Não só na pediatria, mas também na parte do adulto e por aí vai.

Nós expandimos 264 leitos de UTI e continuamos com o nosso planejamento e com a nossa ação para expandir ainda mais. Nós temos a previsão de abrir 10 leitos em Itajaí, 10 leitos adultos em Itapema. Nós temos 10 leitos neonatais previstos para Rio Negrinho e mais 14 leitos adultos previstos aqui em Florianópolis, que agora até meados de junho, julho, a gente deve colocar em operação seguindo tudo que foi planejado. Então aí eu estou falando de mais 44 leitos, ou seja, ainda nesse ano vamos ultrapassar mais de 300 leitos de UTI.

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Se for pegar os dados oficiais do próprio Datasus, Ministério da Saúde, você vai verificar que, se não é a maior expansão do Brasil, é a segunda maior. Estou falando de um Estado com 8 milhões de pessoas, com relação aos leitos de UTI, a gente tem esse cenário. O que acontece hoje? Quando 100% dos leitos de UTI estão ocupados em uma região, numa macrorregião, caso necessário eu quebro a referência. O que é quebrar a referência? A pessoa está precisando de um leito em Itajaí, eu não tenho mais disponibilidade na macrorregião da Foz do Rio Itajaí, eu quebro a referência e ela vem para Florianópolis, vai pro Sul. Mas a gente quebra quando esgota a disponibilidade daquela região. 

Em último caso, eu trato dos dispositivos para poder ter a possibilidade de contratar leitos no privado. Acontecia muito em Chapecó, no Oeste de Santa Catarina. Nós só tínhamos cinco leitos pediátricos em todo o Grande Oeste. Nós abrimos mais cinco em Chapecó e abrimos 10 leitos pediátricos em Joaçaba, o que deu um respiro lá para a região do Oeste na pediatria. 

Quando a parte do privado tem disponibilidade, se for o caso, a gente compra. Mas hoje, mesmo o privado está com sobrecarga. Você pega aí na Grande Florianópolis, estão lotados também. Então a gente monitora, garante a assistência. Se for necessário cancelar uma cirurgia eletiva, a gente cancela. Muitas vezes, o paciente estabiliza numa sala de reanimação com suporte ventilatório, num leito cirúrgico, até subir para um leito de UTI. Então a gente tem uma rotina de garantir assistência.

E a gente vai permanecer avançando, conforme o governador determinou, nesta expansão, independente de ter uma pandemia, como aconteceu em 2020. Desde 2023 a gente fez essa expansão e em boa parte do ano os leitos ficam 60%, 70% ocupados.

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Mas a gente sabe que tem que manter esse leito disponível para poder suprir momentos como esse que a gente tá passando agora.

Quais ações pontuais vocês pretendem fazer nesse cenário? Também há ações previstas específicas para regiões que estão com uma maior sobrecarga?

Hoje eu tenho uma sobrecarga maior identificada em Florianópolis e na região de Itajaí. Na Grande Florianópolis a gente convocou todos que estão trabalhando na rede de urgência e emergência, os hospitais próprios, os municípios, para aprimorar os fluxos na nossa rotina. É como se fosse um chamamento de uma sala de situação, digamos assim.

Para estar dando giro nesses leitos. A gente avalia a necessidade e a possibilidade de comprar leitos no privado, mas o que a gente está fazendo de imediato é também pedir para contar um pouco mais com o Hospital Universitário. 

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Na região de Itajaí, a partir do momento que o prefeito decreta emergência, provavelmente eu vou comprar 12 leitos temporários no Hospital Pequeno Anjo, pediatria, leito de suporte ventilatório, ali para a região da Amfri, o que ajuda nessa distensão dessa questão da pediatria. Fora isso, com relação à expansão de leitos, só para deixar claro, esses 44 leitos que estou mencionando agora, eles não são para o final do ano. São para agora, em meados deste ano. E a gente tem a previsão de colocar mais 14 leitos adultos na Grande Florianópolis.

A questão da antecipação da vacinação, mesmo sem a orientação do ministério, eu tomei a decisão, levei para os secretários municipais, já no dia D, no sábado (10), a gente vai ampliar para toda a população que queira se vacinar com relação a gripe para amenizar um pouco essa sobrecarga. 

Com relação à porta dos hospitais e das UPAs, é reforço de pessoal. Porque uma coisa é leito de UTI, outra coisa é a porta. O paciente não vai para leito, né? Então, tem uma sobrecarga hoje no Infantil que dialoga com a situação do HU que a gente está pedindo para que eles retomem o atendimento na pediatria. Os secretários municipais estão reforçando nas UPAS o atendimento na pediatria e na porta de atendimento. 

Eu reforcei a porta do Hospital Infantil também. Nós temos a previsão de abrir mais 28 leitos de enfermaria no Hospital Infantil até metade do ano. A gente está reformando todo o hospital, aumentando os leitos. A gente deve entregar mais uma ala com 28 leitos até junho, julho.

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A gente está com essas ações práticas no dia a dia. E fora isso é pedir muita colaboração da população, principalmente para se vacinar. Aproveitar que a gente está abrindo para toda a população, que todo mundo se vacine para nos ajudar também nesse sentido.

Por parte da população, o que pode ser feito para melhorar esse quadro?

É a vacinação e a etiqueta com relação às síndromes respiratórias, a tosse, o aperto de mão, higienizar a mão. A gente até publicou no nosso site e nas nossas mídias sociais com relação ao que é chamado de etiqueta, que é o pessoal evitar tossir e apertar a mão da outra pessoa. São situações simples.

O uso de máscara quando está no ambiente fechado, caso esteja mais agudo, não ir a locais de grande circulação para evitar a maior proliferação do vírus, até que se estabilize. São situações muito semelhantes à época da COVID. A gente não está falando de restrição, mas tem que ter a etiqueta, evitar certas situações, principalmente no contato com outras pessoas.

Mas o nosso principal foco é que a população se vacine contra a gripe, porque ela protege de três vírus que estão circulando muito aqui em Santa Catarina, principalmente a influenza.

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Já que é algo previsto, que a gente sabe que nessa etapa do ano esses casos sobem, tem algo a mais que poderia ser feito nesse sentido para evitar que chegue à lotação máxima das UTIs?

Nós fizemos. Desde 2023, nós abrimos mais de 260 leitos. Isso não estava previsto em local nenhum. E nenhum outro estado fez o que a gente fez. Se eu não tivesse aberto os 260 leitos, nós teríamos colapsado. Eu já não teria leito no privado nem no público. Nós temos uma ocupação acima de 95%, em alguns locais estão 100%, mas a gente está garantindo assistência para a população.

O que a gente está fazendo são outras medidas preventivas, para ter guarida para comprar inclusive no privado, se for necessário, e avançando ainda mais numa expansão que já veio sendo programada desde 2023. Eu repito, se nós não tivéssemos abertos esses 264 leitos, não teria leito adulto, não teria leito neonatal e pediátrico para boa parte da população do Oeste até o Litoral. 

A sazonalidade com relação às síndromes respiratórias impacta nos leitos de UTI, leitos de enfermaria e porta de atendimento na emergência.

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Leitos de UTI, a gente está avançando bem na expansão. Devemos expandir, chegando a mais de 300 desde o início do nosso governo. Leitos clínicos, nós temos uma retaguarda boa. A gente precisa ampliar nos hospitais de grande referência, que é algo que também está em andamento.

E a porta de urgência e emergência é reforçar a porta no momento que nós estamos nessa época, por exemplo, lá no Infantil ficam de cinco a sete médicos na porta, diferente de outros períodos. As UPAs São José, Florianópolis, Palhoça estão reforçando também as equipes para esse momento. Então, avançar na estrutura, como nós estamos fazendo, e reforço de pessoal.

E o terceiro ponto, contar com a colaboração de toda a população, principalmente relacionada à vacinação.

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