Os debates acerca da ação de um homem que aparece retirando um pedaço de rede de pesca, que estava preso em uma baleia na Praia da Ponta do Papagaio, em Palhoça, continuam. O registro, feito pelo fotógrafo Carlos Anselmo, já ultrapassava 6,3 milhões de visualizações nas redes sociais nesta quarta-feira (16). A reação de entidades ambientais ao fato, no entanto, causou polêmica, o que levou a abertura de uma investigação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
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Ao g1 SC, o instituto informou que apura a intervenção feita pelo homem, já que existe uma regulamentação sobre a soltura desses apetrechos nesse tipo de animal. A punição prevista por descumprir o documento é uma multa de R$ 2,5 mil.
O caso ocorreu no sábado (12), na praia que fica em Palhoça. No vídeo, é possível ver o momento em que o homem, em cima de uma prancha de stand up, se aproxima da baleia e usa um remo para soltar a rede de pesca.
Ao NSC Total, o Ibama confirmou que as investigações estão em andamento, mas “sem pressa”:
— O que tinha para acontecer de errado já aconteceu, então agora é analisar as imagens, as entrevistas… Já temos quem são as pessoas e vamos fazer os procedimentos no momento certo. Não tem mais pressa nesse momento. A pressa era para monitorar a baleia. Então, agora, é aguardar o momento certo, fazer a apuração direitinho, configurar tudo e ver qual a medida que a gente vai tomar — afirmou o analista ambiental do Ibama, Leandro Aranha.
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Na terça-feira (15), o instituto ProFRANCA, que monitora os animais no litoral do Estado, se pronunciou sobre o caso. Em um vídeo publicado nas redes sociais, uma especialista esclarece que a instituição monitorava a baleia e já havia notado a rede de pesca. “A baleia-franca do caso é a B897, catalogada desde 2022 e que, nesta temporada, havia sido avistada em Itapoá (SC) no início do mês, já com o seu filhote”, escreveu a instituição.
No vídeo, a especialista destaca a portaria número 3 de 8 de janeiro de 2024, que busca regulamentar a atividades de desenredamento para proteger os animais e tornar a atividade o mais segura possível. Entre as principais regras, estão:
- A atividade de desenredamento só pode ser exercida por instituições autorizadas;
- A atividade deverá ser realizada com condições de visibilidade e estado do mar adequadas, entre o nascer e o pôr do sol;
- Por motivos de segurança, só pode ser feito com o auxílio de uma embarcação;
- Todo desenredamento deverá ser documentado e informado ao ICMBio num prazo máximo de 30 dias;
- Sempre que possível, a equipe deve recolher a rede de pesca, identificando a categoria e origem para registro.
A portaria é conjunta entre o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, o Ibama e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
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Também há regras para a equipe de resgate. São elas:
- Duas pessoas no barco treinadas para lançamento dos equipamentos de resgate, corte dos artefatos e pilotagem da embarcação;
- Dois resgatistas de apoio técnico em barco de apoio.
A portaria prevê, ainda, que as atividade de desenredamento de baleias realizadas por instituições não autorizadas ou pessoas não habilitadas serão caracterizadas como molestamento intencional de cetáceos, previsto no artigo 30 do decreto número 6.514, de 22 de julho de 2008.
Ainda no vídeo publicado pela ProFRANCA, a especialista destaca que, no caso da baleia-franca que estava na praia de Palhoça, não havia indicação de intervenção, uma vez que o animal e o filhote apresentavam comportamento normal e se movimentavam bem.
Veja o vídeo
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Fotógrafo fala sobre a retirada
Em meio às polêmicas, o fotógrafo Carlos Anselmo publicou um vídeo junto ao homem que fez a retirada da rede de pesca da baleia. Nele, eles esclarecem o que motivou o resgate. “Ninguém agiu por curiosidade, vaidade ou lucro. Houve apenas uma resposta humana, ética e urgente diante do sofrimento de um ser vivo”, escreveu na publicação.
Assista ao pronunciamento
Ao NSC Total, o Ibama esclareceu, ainda, que a baleia estava sendo acompanhada pela instituição e que não apresentava ferimentos, tampouco risco imediato à saúde. Por isso, a intervenção imediata não seria necessária.
Ainda segundo o órgão, casos em que baleias se enroscam em redes e se desvencilham delas sem auxílio humano são comuns em Santa Catarina. O Ibama, no momento, apura se a intervenção não autorizada causou algum prejuízo à baleia ou ao filhote.
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Leia a nota do Ibama na íntegra
“O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) informa que acompanhou, de 10 a 13 de julho, a presença de uma baleia-franca com seu filhote na Praia da Pinheira, em Palhoça (SC). O monitoramento foi realizado por meio de drones e observações de campo por equipe especializada, formada por integrantes do Ibama e de outras instituições habilitadas em protocolos internacionais de desenredamento de grandes cetáceos.
Durante a ação, foi identificada uma rede de pesca presa superficialmente às calosidades da cabeça da baleia-mãe. Após avaliação técnica, constatou-se que o enrosco:
- não causava ferimentos;
- não interferia na amamentação do filhote nem em outras atividades naturais do animal; e
- não apresentava risco imediato à sua saúde.
Diante dessa avaliação e conforme os protocolos técnicos adotados internacionalmente, a recomendação em casos como esse – especialmente envolvendo fêmeas com filhotes – é não realizar intervenção imediata, uma vez que qualquer aproximação indevida pode causar estresse elevado à baleia, prejudicar a relação maternofilial e comprometer a sobrevivência de ambos os animais. O protocolo seguido pelo Ibama é o da Rede Global de Desenredamento de Mamíferos Marinhos (Global Whale Entanglement Response Network), a qual é coordenada principalmente pela Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA, na sigla em inglês) e respaldada por entidades como a International Whaling Commission (IWC).
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Além disso, essa conduta visa à integridade física das pessoas envolvidas, pois baleias são animais de grande porte e comportamento imprevisível, especialmente quando acompanhadas de filhotes. Tentativas de aproximação ou manipulação sem a devida capacitação técnica podem colocar em risco a vida do próprio indivíduo.
Essa situação não é inédita em Santa Catarina. Em 2020, um caso semelhante foi registrado no estado, quando uma baleia-franca com filhote foi avistada com um material de pesca preso à cabeça. Naquela ocasião, as instituições responsáveis adotaram o mesmo protocolo de não intervenção, diante dos riscos que a aproximação humana poderia representar para a baleia e seu filhote. O material acabou se desprendendo de forma natural, sem causar prejuízos à saúde dos animais.
No episódio recente, mesmo após as orientações das equipes do Ibama para que não houvesse aproximação, um grupo realizou a retirada da rede por conta própria e de forma não autorizada, sem seguir os protocolos oficiais de desenredamento. A ação foi realizada em desacordo com a Portaria Conjunta nº 03/2024 do Ministério do Meio Ambiente e Mudança de Clima, do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que regulamenta os procedimentos de desenredamento de grandes cetáceos no Brasil. Esse tipo de conduta, além de contrariar as normas e protocolos estabelecidos, representa um grave risco, tanto para os animais – especialmente durante o período de amamentação –, quanto para as pessoas, podendo ainda incentivar comportamentos imprudentes por parte de outros indivíduos.
O Ibama está apurando se a intervenção não autorizada causou algum prejuízo à baleia ou ao seu filhote. Reforça-se que as orientações das instituições competentes devem ser rigorosamente respeitadas, pois são baseadas em protocolos internacionais e normas técnicas consolidadas, sempre com o objetivo de preservar a vida e o bem-estar dos animais, especialmente em períodos sensíveis, como o da amamentação.
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Vale ressaltar que o Ibama também realiza, de forma contínua, ações de fiscalização para coibir práticas de pesca ilegal que possam causar impactos às baleias, especialmente durante a temporada reprodutiva. Entre essas ações, estão a fiscalização da pesca em áreas sensíveis, como nas proximidades de costões rochosos, e a identificação e retirada de “redes fantasmas” – equipamentos de pesca abandonados ou perdidos que permanecem à deriva no mar –, além de outras atividades que possam representar risco para esses animais. Essas medidas visam a prevenir situações de enredamento e garantir a preservação da espécie no seu habitat.
Por fim, o Ibama reforça que acompanhou o caso desde o início, de forma contínua e responsável, com base em critérios técnicos e no compromisso com o bem-estar da fauna marinha. Também alerta para o risco de desinformação e sensacionalismo em redes sociais, que podem distorcer os fatos, gerar interpretações equivocadas e comprometer ações técnicas corretamente conduzidas.
O Ibama orienta que a população mantenha distância segura de animais marinhos e comunique avistamentos ou situações semelhantes por meio dos canais oficiais.
O que diz o protocolo
De acordo com a Rede Global de Desenredamento de Mamíferos Marinhos (Global Whale Entanglement Response Network), os principais princípios e diretrizes desses protocolos incluem:
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1) Avaliação cuidadosa antes da intervenção
- A decisão de intervir deve considerar o risco à vida do animal e das pessoas.
- Intervenções só devem ser feitas quando há risco real de vida ou sofrimento prolongado.
2) Intervenções apenas por equipes treinadas
- Apenas pessoas capacitadas e certificadas devem realizar ações de desenredamento.
- O Ibama conta com servidores treinados por protocolos internacionais, como os ministrados pela NOAA ou pelo IWC.
3) Evitar intervenções em fêmeas com filhotes
- Fêmeas com filhotes são extremamente sensíveis a estresse.
- O risco de separação do filhote é alto, o que pode comprometer a sobrevivência de ambos.
4) Monitoramento e não intervenção quando a rede não oferece risco imediato
- Em muitos casos, redes superficiais se soltam sozinhas com o movimento do mar e o atrito com o corpo do animal (como calosidades da baleia-franca).
- A observação contínua é considerada a melhor prática em casos de enroscos leves.
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5) Segurança humana é prioridade
- A intervenção sem conhecimento técnico coloca vidas em risco, pois o comportamento de baleias é imprevisível, especialmente quando estão protegendo filhotes“, diz o comunicado.
As baleias-francas em SC
As baleias-francas realizam grandes migrações no Hemisfério Sul, entre suas áreas de alimentação e reprodução. Na maior parte do tempo, estão submersas. É possível avistar os animais na costa catarinense entre julho e novembro, quando elas chegam à região para dar à luz e amamentar os filhotes.
Segundo o ProFranca, cerca de 10% da população de baleias-francas-austrais que frequenta as áreas de concentração reprodutiva apresentam manchas brancas no ventre e no queixo. Contudo, os sinais podem ocorrer em todo o corpo, o que resulta em indivíduos parcialmente albinos.
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*Sob supervisão de Luana Amorim
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