Especialistas apontam que a fala do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ligando Guilherme Boulos (PSOL) a uma facção criminosa pode acarretar punições como cassação e inelegibilidade. Na manhã de domingo (27), dia da eleição em segundo turno, Tarcísio afirmou em coletiva de imprensa, ao lado do então candidato à prefeitura de São Paulo Ricardo Nunes (MDB), que a polícia havia interceptado mensagens de uma facção criminosa orientando votos no psolista.

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Em nota, a Secretaria da Segurança Pública informou que “o Sistema de Inteligência da Polícia Militar interceptou a circulação de mensagens atribuídas a uma facção criminosa determinando a escolha de candidatos à prefeitura nos municípios de Sumaré, Santos e Capital. A Polícia Civil investiga a origem das mensagens.”

Já o secretário nacional de Segurança Pública, Mario Sarrubbo afirmou que “a nossa inteligência não detectou qualquer recomendação de facções para este ou aquele candidato neste segundo turno nas capitais.” Em nota, o Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE) afirmou ao g1 que não recebeu relatório e informação sobre o assunto.

Entenda a polêmica envolvendo Tarcísio, Boulos e facções criminosas em SP

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Quais medidas tomou Boulos

Boulos (PSOL) classificou a declaração como “crime eleitoral” e entrou com duas ações distintas. Na Justiça Eleitoral, protocolou uma Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) pedindo a inelegibilidade de Tarcísio (Republicanos) e de Nunes (MDB), eleito mais tarde, com 59,35% dos votos. No documento, o advogado Francisco Almeida Prado Filho cita abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação pelo governador.

À noite, Boulos (PSOL) também apresentou uma notícia crime ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra Tarcísio (Republicanos) e Nunes (MDB). O relator será o ministro Nunes Marques, que também é membro do Supremo Tribunal Federal (STF). Cabe a presidente do TSE, ministra Cármen Lúcia, decidir se abre ou não uma investigação sobre o caso.

Cármen Lucia, em entrevista coletiva para apresentar o balanço do segundo turno, informou que uma resposta rápida será dada sobre as acusações do governador. De acordo com ela, o incidente foi isolado e não compromete a credibilidade das eleições. 

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O que pode acontecer?

Para o advogado e atual presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SC, Pierre Vanderlinde, há três possíveis enquadramentos legais para as declarações do governador. Primeiramente, Tarcísio pode ter violado a conduta vedada na Lei Geral das Eleições, de que autoridades façam pronunciamentos fora do horário eleitoral gratuito nos três meses anteriores à eleição, salvo em casos urgentes e relevantes. Caso haja condenação, a pena vai de multa até cassação e inelegibilidade.

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— Embora não tenha sido um pronunciamento oficial do Governo do Estado, e sim uma entrevista coletiva, ela foi realizada no dia da eleição e com conteúdo privilegiado, acessível apenas em razão do cargo ocupado por Tarcísio — pontua o especialista.

Além disso, mesmo que não se configure como conduta vedada, o uso de informações privilegiadas pelo serviço de inteligência do governo para fins eleitorais pode ser visto como abuso de poder político. Por fim, se as informações divulgadas por Tarcísio (Republicanos) forem falsas, ele pode ser acusado de divulgar fake news, conforme o artigo 323 do Código Eleitoral, e de fraude eleitoral, o que poderia levar à cassação do mandato de Nunes (MDB) e à realização de novas eleições.

Por outro lado, se as informações de Tarcísio (Republicanos) forem verdadeiras e a divulgação legítima, Boulos (PSOL) poderia ser acusado de coagir eleitores, conforme o artigo 301 do Código Eleitoral, e de abuso de poder econômico, o que também poderia resultar em inelegibilidade.

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Qual o trâmite?

De acordo com o advogado especialista em Direito Eleitoral, Paulo Fretta Moreira, as duas ações de Boulos (PSOL) devem correr de forma distinta. Na Justiça Eleitoral, a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) ainda terá prazos para defesa, oitiva de testemunhas, parecer do Ministério Público Eleitoral e, finalmente, sentença pela Justiça Eleitoral de primeira instância, com possibilidade de recurso ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE) e ao TSE.

— Caso a Justiça Eleitoral reconheça que houve de fato abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, pode julgar procedente a Ação de Investigação Judicial Eleitoral e, reconhecendo ainda gravidade suficiente para interferir no resultado das eleições, aplicar as penalidades de cassação dos diplomas e decretação de inelegibilidade pelo prazo de 8 anos a contar da data da eleição de 2024 — diz.

Já a notícia-crime será julgada diretamente pelo TSE, seguindo um rito diferente do processo eleitoral.

— A notícia-crime é um processo criminal que tem outro rito, e como tem como um dos réus o governador, o foro é direto no TSE — explica Fretta.

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Saiba mais sobre as eleições em São Paulo

Relembre a fala de Tarcísio

A afirmação de Tarcísio (Republicanos) ocorreu durante coletiva de imprensa após votação no Colégio Miguel Cervantes, no Morumbi, também na Zona Sul de São Paulo, após o governador ser questionado sobre um suposto “salve” do PCC para que não se votasse na candidata à Prefeitura de Santos, Rosana Valle (PL). Ele estava ao lado de Ricardo Nunes (MDB), candidato à reeleição.

— Aconteceu aqui também, teve o salve. Houve interceptação de conversas, de orientações que eram emanadas de presídios por parte de uma facção criminosa orientando determinadas pessoas em determinadas áreas a votar em determinados candidatos. Houve essa ação de intercepção, de inteligência, mas não vai influenciar nas eleições — afirmou.

Questionado em qual candidato os integrantes pediam para votar, Tarcísio respondeu:

— Boulos.

Tarcísio (Republicanos) também afirmou que as conversas achadas pela inteligência estão sendo encaminhadas para o Tribunal Regional Eleitoral.

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— A gente vem alertando isso há um tempo sobre o crime organizado na política. Então, nós fizemos um trabalho grande de inteligência, temos trocado informações com Tribunal Regional Eleitoral para que providências sejam tomadas — afirmou.

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