Uma tradição natalina germânica é atração na pequena cidade de Guabiruba, no Vale do Itajaí. É bem verdade que eles não são muito lindos nem fofos, mas caíram no gosto do público e somente este ano devem receber a visita de 30 mil pessoas. Sim, estamos falando dos Pelznickels. O nome também é um pouco complicado de escrever e pronunciar, mas para simplificar pode chamar de Papai Noel do Mato.
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O mestre da tradição, Fabiano Siegel, conta que nunca recebeu em casa aquele bom-velhinho da roupa vermelha e barba branca que ganha destaque no fim do ano. Na família dele, com avós descendentes de alemães, era uma figura com cara mais assustadora que aparecia todo dia 6 de dezembro para saber se as crianças tinham se comportado. E na noite de 24, ele voltava com presentes para os obedientes.
— Nós aprendemos desde pequenos que o Pelznickel era quem acompanhava o São Nicolau na época do Natal. Como São Nicolau era muito bonzinho, precisava ter com ele alguém que cobrasse bom comportamento das crianças. Então ele passou a levar junto aqueles que viviam aquém dos muros da sociedade, os chamados moribundos, que as pessoas costumavam ter medo — explica Fabiano.
O registro mais antigo que se tem da tradição do Pelznickel em Guabiruba é uma foto de 1954, mas já ocorria muito antes disso, porém as fotos não eram tão populares e baratas como hoje. Por muitos anos, moradores da cidade preparavam roupas especiais para incorporar a tradição e saíam pelas ruas. Alguns usavam trapos velhos e outros folhas de árvores para criar uma figura assustadora.
Para os pequenos, dizia-se que eles vinham do mato para ver quem tinha sido educado ao longo do ano.
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Veja imagens dos Pelznickels
Um esforço em nome da tradição
Com o tempo, o costume foi ficando de lado. Fabiano lembra quando ele e mais dois amigos, Ivan Elias Fischer e Vandrigo Kohler, estavam percorrendo a cidade como Pelznickel, em dezembro de 2004, e se deram conta de que precisavam fazer algo se quisessem manter a tradição viva. Um ano depois, nascia a sociedade que hoje tem cerca de 150 integrantes. É bastante em um município com 25 mil habitantes.
O mestre revela que, então, em 2012, decidiram fazer a primeira Casa do Pelznickel. Era em um sítio pequeno, onde montaram um espaço para cartinhas das crianças, um presépio, o homem do saco e, claro, o personagem principal do evento: o Papai Noel do Mato. O objetivo era reunir 300 pessoas ao longo de dois dias, mas foi bem diferente:
— Era para ser um encontro só para os amigos, família, mas não parava de chegar gente. Deu três mil pessoas. Não tínhamos estrutura nenhuma para receber aquele povo todo — recorda Fabiano.
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Era o começo da Pelznickelplatz, que atrai centenas de visitantes a Guabiruba há 13 anos.
Todos os personagens são voluntários. Até por isso, a programação é mais restrita. São dois finais de semana, somando seis dias, para visitação do público. E não com uma figura assustadora, mas quase 30. Brincam, divertem e, claro, cobram bom comportamento de quem chega. Tanto esforço e dedicação rendeu a Guabiruba o título de Capital Estadual do Pelznickel.
E a prática levou à perfeição. O grupo aprimorou o evento ano a ano e agora, em 2025, está de casa nova: no parque municipal da cidade. Aliás, o Pelznickel é tão importante para o município que neste mesmo endereço, junto ao maior labirinto do Sul do Brasil, está uma estátua gigante desta figura folclórica. Na edição passada, foram 14 mil visitantes. Agora, devem ser 30 mil.
— É gratificante manter a tradição. Não trocamos isso por nada — garante o mestre.
Uma família dedicada ao Pelznickel
Quem vê a foto da família Leite caracterizada nos personagens Pelznickelplatz imagina que a família cresceu com a história do Papai Noel do Mato. Mas isso está longe de ser verdade. Embora nascidos em Blumenau, com descendência germânica, eles só foram conhecer a tradição morando em Guabiruba. Alan tinha 12 anos quando chegou à cidade para morar com os avós e se deparou com a figura assustadora.
— Me assustei, pois nunca tinha visto — admite.
O susto passou rápido e logo ele se interessou pelo tema. Aos 14 anos, improvisou a própria roupa e foi com os amigos para as ruas assustar os desobedientes. Compraram umas máscaras, usaram lençóis velhos e colaram até barba de velho para incrementar o look. Gostou tanto que um ano depois entrou para a Sociedade do Pelznickel. Logo levou a avó, o avô, a bisavó e a irmã.
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Alan é um entre os quase 80 homens que se revezam como Pelznickel. A avó é a oma na cozinha por onde passam os visitantes antes de chegar ao Papai Noel do Mato. E avô é um dos que dão vida ao São Nicolau. Desde quando teve uma filha, há nove anos, quem aparece na noite de 24 de dezembro para entregar os presentes é a figura folclórica germânica. A garota ama, garante o pai.
— Hoje faz 14 anos que eu faço parte da Sociedade do Pelznickel. Uma tradição da qual amo fazer parte, além, claro, da felicidade das crianças, adultos, idosos — confessa.
A paixão é tamanha que ainda guarda a foto da primeira roupa que fez para ser um Pelznickel. Depois, foi aprimorando com uma cabeça de bode, um macacão peluciado e chifres feitos com cone de linha. E nesse caminho, claro, guarda com carinho as lembranças das crianças que entregaram a ele bicos, mamadeiras e até cartinhas.
Em um episódio emblemático para a organização da Pelznickelplatz, um menino de 11 anos fez um pedido especial ao Papai Noel do Mato:
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“Queria te fazer um pedido, porque sei que minha cartinha vai chegar até você: queria pedir para falar com o patrão da minha mãe e pedir um avião emprestado para poder ir ao céu falar com Deus. Que o nosso presente de Natal neste ano seja que o papai do céu dê um coração novo para o papai”, diz em um dos trechos da carta do pequeno Gabriel Dutra.
O pedido do menino para voar, claro, foi atendido.
— Hoje em dia a parte do ano que eu mais gosto é do Natal. Todos esperam os Pelznickels nas ruas, alguns pais pedem paro o Pelznickel cobrar mais o filho porque não se comportou durante o ano. Não é só uma cultura, mais sim uma tradição que traz amor, carinho, felicidades — conclui Alan.
O caminho da tradição
Quem chega na Pelznickelplatz, a Casa do Pelznickel em Guabiruba, tem a oportunidade de trilhar o chamado Caminho da Tradição. O passeio começa pela área de cartinhas. Ali, crianças e adultos podem escrever os pedidos para o Papai Noel do Mato. Mais à frente, tem varais onde é possível deixar os papéis. Se alguma alma bondosa ler e quiser adotar, isso pode ser feito.
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A próxima parada é diante do São Nicolau. Ele nasceu onde hoje é a Turquia, em 270 depois de Cristo, e ficou conhecido pela caridade, proteção às crianças e milagres. Não à toa, inspirou a figura que conhecemos hoje do Papai Noel de barba branca e roupa vermelha que ganha as ruas na celebração do nascimento de Jesus Cristo. O Dia de São Nicolau é celebrado em 6 de dezembro, data em que, segundo a tradição, ele ia às casas com os Pelznickels ver quem tinha se comportado durante o ano.
Alguns passos à frente, um presépio vivo representa o momento do nascimento de Jesus. Ali ao lado, as Christkindl. São jovens vestidas com roupas brancas que, pela tradição, representam o filho de Deus de forma angelical. Elas espalham esperança, ternura e doces. Depois, é hora de encarar o Sackmann, popularmente conhecido como Homem do Saco. É dentro da casa dele que estão as anotações com os nomes de quem desobedeceu os pais e vai levar puxão de orelha dos Pelznickels.
Superada essa etapa, é a acolhedora cozinha da Oma e do Opa. O espaço representa a simplicidade, a fartura e o espírito acolhedor do interior. E, claro, resgata os sabores e os valores da cultura germânica em Guabiruba.
Agora então é chegado o momento da verdade. Cara a cara com os assustadores Pelznickels. A cada dia de evento, cerca de 30 pessoas ocupam esse espaço representando a figura folclórica germânica. Eles fazem um certo barulho para receber os visitantes e o mais importante vem em formato de pergunta: “Você se comportou?”. Ali tem choro, tem risada, tem bronca e cativa muitas crianças como Yasmim dos Santos, de 7 anos.
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— Essa é a terceira vez que trazemos ela para ver o Pelznickel, e ela adora — conta a mãe Iara Bernardes.
Serviço
O que: Pelznickelplatz
Quando: 20 de dezembro, das 19h às 23h, e no dia 21, das 17h às 21
Onde: Parque Municipal de Guabiruba
Quanto: R$13,00 pelo aplicativo Pedidos10 ou R$15,00 na bilheteria. Crianças até 10 anos têm entrada gratuita mediante apresentação de documento. O ingresso dá acesso único ao Caminho da Tradição e acesso livre às demais áreas, como Praça de Alimentação, Mercado de Natal e Parque Infantil.





























