A perereca-rústica (Pithecopus rusticus), descoberta em 2008 no Sul do Brasil, pode ser pequena e discreta, mas sua importância para o ecossistema local é imensa. A espécie foi identificada durante uma avaliação de impacto ambiental para a instalação de parques eólicos entre os municípios de Água Doce, em Santa Catarina, e Palmas, no Paraná, região próxima à divisa entre os estados.
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A bióloga Elaine Maria Lucas Gonsales, doutora em Ecologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), esteve à frente da pesquisa que confirmou a descoberta.
— Durante o levantamento noturno de anfíbios, nos deparamos com uma espécie que não conhecíamos. Era diferente de todas as espécies da região, e isso chamou nossa atenção imediatamente — relata Elaine.
A pequena perereca, verde de pernas alaranjadas, foi descrita em 2014 como Phyllomedusa rustica e, logo depois, em 2016, seu nome foi redefinido para Pithecopus rusticus. Ela é conhecida pelo nome comum de perereca-rústica, sendo a única representante do gênero Pithecopus nos campos do Planalto das Araucárias, dentro do domínio da Mata Atlântica no Sul do Brasil.
A equipe registrou a perereca-rústica, analisou sua morfologia, seu canto e outras características, percebendo que se tratava de uma espécie ainda não descrita pela ciência. O trabalho incluiu análises genéticas em laboratório e foi submetido a uma revista científica internacional. Publicado oficialmente em 2014, o estudo marcou o reconhecimento formal da espécie.
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— O reconhecimento científico exige tempo, revisão por pares e validação rigorosa. Por isso, existe esse intervalo entre a descoberta e a publicação oficial — explica Elaine.
Singularidade no Sul do Brasil
A perereca-rústica é única na região Sul do país:
— As espécies mais próximas a ela ocorrem em outras regiões do Brasil, como Sudeste, Nordeste e Norte. Aqui, ela é a única representante do seu gênero — explica a bióloga. Apesar de expedições em busca de outros locais de ocorrência, a espécie só foi encontrada na região original, tornando-a extremamente sensível.
— Como ocorre em apenas um local, qualquer alteração ambiental representa um risco real de extinção — alerta a pesquisadora.
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Importância ecológica
Além de sua raridade, a perereca-rústica desempenha funções ecológicas fundamentais:
— Os anfíbios são indicadores de qualidade ambiental. Eles não sobrevivem em ambientes degradados ou com água poluída. Se eles estão presentes, o ecossistema ainda mantém equilíbrio — explica Elaine. A espécie também atua no controle de insetos, incluindo mosquitos vetores de doenças.
— Cada indivíduo consome centenas de insetos por noite, regulando populações que poderiam se tornar pragas ou transmitir doenças — detalha.
Habitat natural e ameaças
O habitat ideal da perereca-rústica são banhados bem preservados, sem poluição, queimadas ou alterações causadas por gado e escavações para criação de lagoas.
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— Os girinos são especialmente vulneráveis à contaminação da água e à degradação do ambiente. Queimadas e manejo inadequado comprometem diretamente a sobrevivência da espécie — explica Elaine.
As áreas de banhado na região já estão bastante alteradas, tanto pelo pisoteio do gado quanto pelo uso de agrotóxicos nas plantações, que acabam drenando produtos químicos para a água. Essas alterações tornam a espécie ainda mais vulnerável.
Conservação e reintrodução
Para garantir a sobrevivência da perereca-rústica, alguns indivíduos foram retirados do ambiente natural e reintroduzidos em áreas controladas, como o Parque das Aves.
— A ideia é reforçar a população natural, reduzir vulnerabilidades a doenças e alterações ambientais, e manter o equilíbrio do ecossistema. Cada animal e cada planta têm um papel, e a ausência de predadores naturais pode gerar desequilíbrios, como a superabundância de mosquitos — afirma a pesquisadora.
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Futuros projetos incluem a introdução da espécie em unidades de conservação ou locais com maior qualidade ambiental, ampliando suas chances de sobrevivência. Apesar de pequena e discreta, a perereca-rústica é um exemplo da importância de cada componente dos ecossistemas sul-brasileiros.
— Manter essa espécie significa manter a saúde do ecossistema, e isso, no fim das contas, também traz benefícios para nós, humanos — conclui Elaine.
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