A tradição centenária de pesca colaborativa entre humanos e botos em Laguna, no Litoral Sul catarinense, pode se tornar um Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil. Pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) estão elaborando um dossiê para fazer com que a prática seja reconhecida pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

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A prática, já reconhecida como patrimônio imaterial do Estado de Santa Catarina desde 2018, é registrada em Laguna e também em Imbé, no Litoral Norte do Rio Grande do Sul, onde pescadores e botos-do-litoral (Tursiops) trabalham juntos. Trata-se de um tipo único de interação e comunicação entre humanos e cetáceos.

— Basicamente, a cooperação funciona com os golfinhos localizando os cardumes de tainhas por meio da sua ecolocalização e conduzindo-os até os pescadores. Estes, por sua vez, esperam que os botos sinalizem com movimentos corporais a presença dos peixes para lançarem as suas tarrafas — explica o antropólogo Caetano Sordi, coordenador do projeto.

A interação beneficia humanos e cetáceos: enquanto os pescadores garantem sua captura, os botos se aproveitam dos peixes que se dispersam após o lançamento das tarrafas.

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— O impacto das redes na água dispersa as tainhas que se tornam presas mais fáceis para os botos — destaca Sordi.

Veja imagens dos botos pescadores

Busca por reconhecimento

A proposta de reconhecimento da atividade como bem imaterial foi encaminhada ao Iphan em dois momentos: em 2017, pela Pastoral da Pesca de Laguna, vinculada à Diocese de Tubarão (SC); e em 2019, pela Associação Comunitária de Imbé – Braço Morto, sediada em Imbé (RS).

Agora, o projeto elaborado pela UFSC vai servir de base para o dossiê de registro que será encaminhado para votação do Conselho Nacional do Patrimônio Cultural. Esse dossiê é composto por pesquisas, documentos e material fotográfico e audiovisual etnográfico.

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— O registro implica o compromisso do Estado brasileiro com a sua ampla divulgação e promoção, ampliando o conhecimento e a valorização da sociedade a respeito das referências culturais que fazem parte da identidade, memória e história dos seus diferentes grupos formadores — destaca Sordi.

O trabalho, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Canoa (Coletivo de Estudos sobre Ambientes, Percepções e Práticas), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFSC, tem apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu) e deve ser submetido ao Conselho do Patrimônio Cultural nos próximos meses.

— O projeto atende a uma antiga demanda de reconhecimento, documentação, valorização e salvaguarda dos saberes, práticas e paisagens associadas a essa colaboração multiespécie — diz Caetano Sordi.

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