Vanderleia Will já vivia a Dona Bilica em eventos e intervenções pela cidade quando um encontro casual ampliou o palco da personagem para toda Santa Catarina. Um diretor da então RBS TV (atual NSC), impressionado com a autenticidade da personagem manezinha, de presilhas no cabelo e roupa de ir à missa, ofereceu a gravação de uma chamada de TV.

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Ela e seu parceiro de cena na época, Geraldo Cunha, que vivia o Seu Maneca, toparam o convite na hora. Gravaram um vídeo bem-humorado em uma casa típica da Barra da Lagoa, chamando o público para assisti-los no teatro da UFSC. O resultado foi arrebatador — filas, sessões lotadas e a certeza de que Dona Bilica havia caído de vez no gosto da cidade.

— Eram duas sessões por noite. A gente lotava o teatro e ficava mais uma sessão inteira de espera querendo entrar. Ali começou o nosso sucesso — recorda Vanderleia, sobre as apresentações no atual Teatro Carmen Fossari.

Com o tempo, a dupla se desfez e Dona Bilica trilhou caminho próprio. Reproduzindo os hábitos dos manezinhos mais velhos — como as histórias de bruxa e a banha de porco que diz passar no cabelo — Vanderleia acionou o humor e a memória afetiva do público. Ao longo dos anos, estrelou espetáculos em todo o Brasil e fez mais aparições na TV.

Dona Bilica foi criada em 1991, quando Vanderleia ainda era aluna de Artes Cênicas na Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc), após Geraldo Cunha convidá-la para criar a parceira do Seu Maneca. Para dar uma cara e um jeito para a personagem, a jovem atriz fez um longo processo de pesquisa. Fez vários encontros com nativos da Ilha, em um exercício de mimese corpórea — técnica em que a atriz não apenas copia sotaques e trejeitos, mas incorpora histórias de vida e memórias da comunidade.

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— A personagem é inspirada em várias mulheres, suas histórias de vida, o que elas pensam. Uma mistura de muita coisa e também de mim, da minha mãe, da minha avó — explica a atriz, que é nascida e criada em Florianópolis.

Ao longo de mais de três décadas, a personagem passou por transformações, ganhando espetáculos próprios como “Dona Bilica Naquele Tempo” – que virou documentário premiado – e viajando por todo o Brasil.

Vanderleia, que é fundadora da companhia de teatro Pé de Vento, também idealizou o Festival Internacional Ri Catarina, que trouxe artistas de todo o mundo ao longo de sete edições e chegou a ter seu próprio espaço cultural, o Circo da Dona Bilica, que fechou durante a pandemia.

Veja fotos de Vanderleia Will

“Sou mais que a Dona Bilica”

O fechamento do Circo da Dona Bilica, o fim de seu casamento e o isolamento da pandemia formaram um turbilhão que, longe de paralisá-la, impulsionou uma virada artística. Ela mergulhou no feminismo.

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Em 2023, estreou Desajustada, uma comédia que questiona a falta de liberdade feminina e a sensação de inadequação.

— Comecei a me sentir muito oprimida por uma estrutura. Na verdade, eu já me sentia desde que eu nasci, só que acho que eu comecei a ficar mais consciente da estrutura de opressão que é o machismo, que é o patriarcado. Que é essa rede, essa teia que violenta as mulheres — ilustra.

Agora, a atriz se prepara para lançar outro projeto. O solo A Mulher Invisível, dirigido por Renato Turnes, conta a história de uma mulher madura que, no dia de uma entrevista de emprego, descobre que está invisível. A produção irá estrear na próxima terça-feira (7), no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC), com sessão também na quarta (8).

Segundo Vanderleia, que está com 55 anos, A Mulher Invisível surgiu a partir da experiência dela com o envelhecimento e a menopausa.

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— É um tabu falar sobre o envelhecimento da mulher. E o envelhecimento está alinhado à violência, porque a mulher não é aceita quando envelhece. Então, ela evita envelhecer. Porque, se aparenta ser velha, não consegue aquele emprego. Não encontra o príncipe encantado. Ninguém a vê. E daí nasceu o tema de A Mulher Invisível.

Ao colocar essas experiências em cena, Vanderleia passou a ocupar outro lugar no teatro catarinense: o de artista que provoca reflexões sobre o cotidiano, sem perder o humor ou a leveza que a caracterizam. Em paralelo, ela segue apresentando Bilica em eventos e espetáculos, sempre com plateias cheias. Mas a cada novo trabalho, a atriz reafirma que não está presa a uma única identidade.

— Eu quero sempre me provocar, estar nesse estado de provocação. Eu poderia estar acomodada fazendo a Bilica, que é um trabalho legal, bom e que tem essa potência. Mas eu não sou só a Dona Bilica. Eu sou muitas — diz Vanderleia.

O futuro já está em movimento. Após a estreia de A Mulher Invisível, Vanderleia visitará sete cidades do estado com os espetáculos Desajustada, Dona Bilica Naquele Tempo e Dona Bilica e o Boi de Mamão. A turnê começa no dia 21 de outubro, em Balneário Camboriú, e depois passará por Criciúma, Florianópolis, Joaçaba, Imbituba, Araranguá e Brusque.

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Seja como Dona Bilica ou como a protagonista de A Mulher Invisível, Vanderleia segue firme em seu propósito:

— Quando atuamos, temos o poder de modificar algo nas pessoas. O estado de ânimo, o pensamento. Algo tem que mudar, porque a vida é movimento.

Espetáculo “A Mulher Invisível”, com Vanderleia Will

  • Data: 7 e 8 de outubro de 2025 (terça e quarta), às 20h
  • Local: Teatro Álvaro de Carvalho (TAC) (Rua Marechal Guilherme, 26, Centro, Florianópolis/SC)
  • Ingressos: gratuitos, via Sympla
  • Classificação indicativa: 14 anos
  • Duração: 50 min

Antonietas

Antonietas é um projeto da NSC que tem como objetivo dar visibilidade a força da mulher catarinense, independente da área de atuação, por meio de conteúdos multiplataforma, em todos os veículos do grupo. Saiba mais acessando o link.

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