Maniçoba, vatapá e suco de cupuaçu. Os pratos típicos do Norte do Brasil são a principal fonte de renda de uma família paraense que vive no bairro Monte Verde, na região Norte de Florianópolis. O restaurante é recente, surgiu em fevereiro deste ano, mas tem ganhado destaque nas redes sociais.

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A dupla de irmãos Osmar Rodrigues de Jesus Junior, de 31 anos, e Ozinel Aires de Jesus, de 33, iniciou o empreendimento por conta de amigos que sentiam falta da culinária com “sabor de casa” e buscaram inspiração na tradição do Pará, estado onde nasceram. Em poucos meses, o negócio foi crescendo e a rede de amigos passou a divulgar o estabelecimento, o que atraiu ainda mais público. Agora, eles já contam com uma cartela fixa de clientes mensais e projetos de expansão.

No entanto, Osmar destaca que a realidade não é tão doce quanto as sobremesas comercializadas no local:

— A gente tem que trabalhar muito pra manter nosso próprio negócio, empreender pode ser bem complicado. São muitos detalhes, alvarás, contas e burocracias, mas estamos indo bem.

O restaurante Norte Marajoara é uma das 3.949 empresas de Santa Catarina com sócios majoritários originários da região Norte do país, de acordo com um levantamento do Observatório de Negócios do Sebrae/SC, com base em dados da Receita Federal. No setor de restaurantes e similares, são 101 empresas.

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Aumento na migração impulsiona novos negócios

A migração de nortistas vem crescendo em Santa Catarina desde 2000, como mostram dados dos Censos de 2000 e 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em 2000, o Estado registrava 5.534 residentes nascidos na Região Norte. Uma década depois, em 2010, esse número mais que dobrou, atingindo 12.988 pessoas, o que representa um crescimento de aproximadamente 135%.

O levantamento mais recente sobre migração ainda não foi divulgado pelo IBGE, mas dados do Registro Civil mostram que, em 2022, 3,3% das crianças nascidas no Estado tinham mães da região Norte, um crescimento de 37,5% em relação a 2021, quando eram 2,4%. Foi o maior crescimento de todas as regiões do país — também houve alta nas proporções de mães do Nordeste (4,7% para 5,3%) e Sudeste (4,2% para 4,4%).

A atração de Santa Catarina para essa população está diretamente ligada ao dinamismo econômico do Estado, que se destaca pelo crescimento em diversos setores, como a indústria, a construção civil e o setor de serviços, de acordo com o pesquisador Tafarel Cassaniga, integrante do Observatório das Migrações de Santa Catarina e professor no Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

— Muitos migrantes acompanham esse desenvolvimento econômico pela mídia, mas a principal forma de informação se dá através das redes sociais migratórias. Ou seja, um membro da família ou amigo chega, consegue emprego e compartilha essa informação com outros, criando uma rede social de migração — pontua o especialista.

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Essa rede de migração soma-se ao padrão de oportunidades presentes na região. Florianópolis, por exemplo, está entre as três cidades mais empreendedoras de Santa Catarina, de acordo com o Observatório de Negócios do Sebrae/SC.

Aos poucos, um amigo chama o outro

Para o casal Denise e Fauzi Jordy, que são naturais de Belém, no Pará, já são nove anos vivendo esse processo. Eles chegaram primeiro, depois criaram um ecossistema integrando o empreendedorismo e os amigos, sem deixar de lado os familiares e conhecidos que também tinham o desejo de descobrir novos horizontes com mais qualidade de vida.

Com fornecedores do Norte ao Sul, parceiros e uma equipe de mais de 20 funcionários, o restaurante já faz parte do cenário do Centro de Florianópolis e integra cerca do 10 empreendimentos especializados em comida típica do norte na Grande Florianópolis.

— Trazemos desde 2016 os sabores autênticos da Amazônia com pratos típicos e muito mais — destaca Denise.

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Entre as sobremesas tipicamente paraenses, os pratos repletos de tempero e até insumos para quem deseja testar em casa suas próprias receitas, o restaurante segue crescendo. Em 2018, chegou a abrir uma filial nos Estados Unidos e tem planos de melhorias constantes.

Comida típica do norte é uma forma de identificação cultural

Empreendimentos são pontos de encontro

Para a designer de interiores Jade Cantuária, de 26 anos, desfrutar da comida nortista é uma forma de se manter conectada à cultura de Macapá, capital do Amapá e sua cidade natal. Ela vive em São José, na Grande Florianópolis, há cerca de um ano, junto com o noivo.

— A culinária nortista é algo que sinto mais falta, no modo geral. Peixes, frutos, pimentas e hortaliças. Gosto muito da culinária do Sul, mas pra quem tem o costume de uma vida toda, é bem difícil deixar de comer um maravilhoso peixe frito com açaí — diz a jovem, que é frequentadora assídua de um restaurante amapaense que fica perto da casa dela.

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Segundo o pesquisador Tafarel Cassaniga, os restaurantes e outros estabelecimentos nortistas se tornaram pontos de encontro para migrantes, que buscam manter seus laços culturais através da gastronomia.

— Mas não são apenas os migrantes que frequentam esses locais. Muitos catarinenses também são atraídos pela oportunidade de experimentar a rica e saborosa culinária do Norte do Brasil. A demanda por esses produtos e sabores é tão grande que muitos ingredientes são trazidos por familiares ou amigos, enquanto outras receitas são adaptadas e desenvolvidas localmente — diz.

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