Foi no período entre agosto de 1954 e janeiro de 1956 que o Brasil viveu um de seus períodos mais caóticos. Isto porque, devido a tentativas de golpe de estado, contragolpes e impedimentos de figuras políticas importantes da época, o país teve cinco presidentes. A reportagem do NSC Total foi atrás de documentos antigos do Congresso Nacional, que permitem a revisitação dessa época conturbada.
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No começo dos anos 1950, o presidente era Getúlio Vargas. O gaúcho, que liderava o antigo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), sofria forte oposição de outros grupos políticos do Brasil. Entre eles, a União Democrática Nacional (UDN), partido de oposição na época, que planejava derrubar Vargas com ajuda das Forças Armadas — ambos os grupos eram contra as políticas trabalhistas e nacionalistas do então presidente.
Vargas, que havia assumido o segundo mandato com apoio da população, agora se encontrava cercado por uma crise política insustentável. Com isso em mente, ele se suicidou com um tiro no peito em 24 de agosto de 1954, com o objetivo de frear o golpe iminente da UDN e das Forças Armadas.
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A princípio, o plano funcionou. Quem assumiu a liderança do país foi o vice-presidente Café Filho, que trocou todos os ministros de Vargas por representantes da UDN. As alterações adormeceram os impulsos golpistas, mas não por muito tempo.
Em outubro de 1955, o país elegeu Juscelino Kubitscheck, como presidente, e João Goulart, como vice-presidente. JK pertencia ao antigo Partido Social Democrático (PSD), e Jango ao PTB, de Vargas — ambos de ideologias aterrorizantes aos representantes da UDN e das Forças Armadas. Por isso, um novo golpe foi planejado.
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Golpe de estado
Logo após a eleição, boatos de suposta ilegalidade começaram. Os conspiradores afirmavam que JK não venceu com maioria absoluta, visto que obteve 36% dos votos, à frente dos 30% do general Juarez Távora, apoiado pela UDN. Entretanto, as leis da época eram claras: havendo qualquer maioria dos votos, não havia segundo turno.
Boatos e mais boatos corriam soltos pela antiga capital, o Rio de Janeiro. Um dos poucos generais que não apoiava o golpe de estado, Henrique Teixeira Lott, começou a perceber uma certa “insubordinação” de outros generais. Com isso em mente, foi até o Palácio do Catete, antiga sede do Poder Executivo, para comunicar o fenômeno ao então presidente Café Filho.
Chegando lá, o general é informado que o mesmo havia sofrido um “ligeiro distúrbio cardiovascular” e que ele precisará passar vários dias internado. No mesmo dia, em 8 de novembro de 1955, a presidência passa para o então presidente da Câmara dos Deputados: Carlos Luz.
Dias depois, o general Lott consegue conversar com o novo presidente, a fim de relatar os problemas que outros generais estariam causando em razão da suposta ilegalidade. A conversa não termina bem: Luz recusa os pedidos do general, e este se demite no mesmo momento. A tensão atingia novos níveis, com suspeitas do general Lott sobre o então presidente. Era imaginado que Carlos Luz apoiaria um golpe de estado.
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Contragolpe
Com isso em mente, o general Lott reuniu militares e quartéis de várias regiões do país. O militar cercou o Palácio do Catete e negociou com o Congresso Nacional a possível derrubada de Carlos Luz. Dessa forma, o então presidente foi derrubado no dia 11 de novembro de 1955 — apenas três dias após assumir o poder.
Com o presidente morto, o vice-presidente internado e o presidente da Câmara dos Deputados impedido, o catarinense Nereu Ramos, então representante do Senado Federal, assumiu a presidência — sendo o único presidente nascido em Santa Catarina até o momento.
— À frente do governo nesta hora grave da nacionalidade, o ilustre [Nereu Ramos] certamente agirá com espírito conciliador, equilíbrio e bom senso para debelar esta crise sem derramamento de sangue — afirmou o ex-senador Lima Teixeira, segundo a Agência Senado.
Apesar da ação bem-sucedida do general Lott, os golpistas não desistiram. Mais um golpe passou a ser planejado: desta vez, com os olhos no ex-presidente internado Café Filho. Anos antes, quando presidente, ele havia trocado todos os ministros de Vargas por representantes da UDN. A própria internação foi motivo de suspeita, na época, com parlamentares se questionando sobre uma possível “ajuda” aos militares.
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— O senhor Café Filho se encontrava às portas da morte e agora está curado. Recomendo a todos os afetados por enfarte as Vitaminas Lott, remédio que representa a última palavra da farmacopeia nacional e cura com rapidez surpreendente — ironizou o ex-senador Kerginaldo Cavalcanti, segundo a Agência Senado.
Impedimento
Entra em ação, novamente, o general Lott. Com receio de uma nova tentativa de golpe de estado, o militar acionou os soldados a cercarem o edifício de Café Filho. A suspeita era de que o ex-presidente internado, uma vez recuperado, voltaria ao poder e entregaria o Executivo aos golpistas.
— A chefia do Poder Executivo não pode ser exercida por quem está implicado, por ação e omissão, no processo de conspiração que há mais de um ano procura utilizar a Presidência para a implantação de uma ditadura — disse o senador Parsifal Barroso, segundo a Agência Senado.
Na nova operação de Lott, até tanques participaram. Café Filho foi impedido de deixar sua residência enquanto o general negociava com a Câmara dos Deputados e com o Senado Federal. As sessões avançaram pela madrugada, mas para felicidade de Lott, Café Filho foi impedido de voltar ao poder na manhã do dia 22 de novembro.
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Com a operação bem-sucedida, Nereu Ramos terminou o mandato e passou a faixa da presidência para Juscelino Kubitschek em 31 de janeiro de 1956. Apesar disso, as tentativas de golpe de estado continuaram nos anos seguintes, até a vitória dos golpistas em 1964.
*Sob supervisão de Luana Amorim
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