Apesar dos avanços da tecnologia, agora com a inteligência artificial, a participação de mulheres como empresárias, executivas, investidoras e técnicas nesse setor ainda está muito aquém do ideal. Um nome que tem se destacado no ecossistema de startups e de representação feminina no Brasil é da investidora-anjo, mentora e conselheira Cláudia Rosa, que foi palestrante no Startup Summit 2024, em Florianópolis.
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A empresária paulista é reconhecida como a maior investidora-anjo do Brasil porque já aportou recursos na modalidade venture capital (capital de risco) em mais de 150 negócios inovadores no país. Após atuar por 15 anos nas multinacionais PwC e IBM em consultoria estratégica, ela empreendeu na área de e-commerce e depois se aproximou do mundo das startups.
Atualmente, atua também como mentora, conselheira e tem o podcast Ela Investe. Recentemente, foi convidada a participar do Shark Tank Brasil, um programa da Sony que seleciona negócios para receber investimentos.
Quando esteve em Florianópolis para participar do Startup Summit, ela também participou do Investor Week, evento da Founder Haus que reuniu investidores em tecnologia em Jurerê Internacional. Em entrevista exclusiva à coluna, ela falou sobre a trajetória, investimentos e como incentiva mulheres e meninas escolherem o setor de tecnologia como carreira. Saiba mais a seguir:
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Como a senhora entrou no mundo da tecnologia?
– Eu venho do mercado corporativo. Trabalhei nas empresas PwC e IBM por 15 anos. Pedi demissão porque eu queria algo diferente para mim, algo com propósito, mas também não sabia o que queria. Aí comecei a empreender. Eu tive algumas empresas (um e-commerce para presentes e uma empresa digital no mercado imobiliário).
Nesse começo como empreendedora, por mais que você tenha experiência como executiva, quando você está empreendendo é óbvio que não sabe tudo. Você tem que buscar referências, metodologias e conceitos novos. Isso foi 2012 e 2013, quando a gente nem falava de startups e empoderamento feminino.
Mas fui buscar novas referências e aí entrando nesse mercado para me inspirar, saber como eu poderia me automotivar para liderar meus negócios, eu conheci sobre empoderamento feminino. A algumas redes que já estavam se formando para apoiar empreendedoras.
Aí já tínhamos algumas aceleradoras, já tínhamos a Rede Mulher Empreendedora focada em apoio a mulheres. E como eu já tinha experiência na área de consultoria, eu acabava agregando de alguma forma, passando alguns materiais, algumas planilhas e algumas lições aprendidas até nessa minha jornada como empreendedora.
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Fui convidada para ser embaixadora da rede mulher empreendedora. Eu conduzia muitas mentorias. Durante alguns anos, eu fiquei focada nessa atividade de mentoria, até que eu conheci as startups e comecei também a investir.
Como foi essa mudança para startups?
– A mentoria para startups é diferente porque tem essa pegada de tecnologia. Eu também percebi que poderia contribuir muito mais porque eu já tinha passado jornadas com vários clientes como Siemens, Carrefour, Unilever, Pão de Açúcar e algumas indústrias. A consultoria permite muita experiência na área de gestão.
Quando comecei, as startups estavam numa crescente no Brasil. Tínhamos também muitas aceleradoras. Era em 2015 e a faixa etária média dos founders de startups era de 25 a 27 anos. A maioria não tinha experiência no mundo corporativo, mas tinha uma excelente ideia e feeling de tecnologia. Então, comecei a fazer mentoria para essas startups e comecei a apoiar o ecossistema de tecnologia como um todo.
Sua palestra em Florianópolis, no Startup Summit 2024, foi voltada ao incentivo para participação de mais mulheres no setor de tecnologia. Por que é importante elas participarem mais?
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– Eu já estou há oito anos como investidora-anjo. Eventos como este agregam muito para o ecossistema como um todo, mas principalmente para mulheres. Nós motivamos mulheres para que elas participem do ecossistema empreendendo, mentorando integrando conselhos e investindo em startups. Hoje, nós temos vários grupos de investidores, alguns são específicos de mulheres que investem em startups.
Eventos como o Startup Summit não são somente inspiracionais. Eles transformam a vida de qualquer empreendedor. Esse evento é uma das maiores referências no Brasil. Então, trazer isso para uma pauta em que você trabalha inovação e transformação empreendedora traz muitos ganhos.
A participação de mulheres é extremamente importante. Hoje, não é uma questão de cota. Sabemos que em empresas lideradas por mulheres o faturamento é maior. Consultorias internacionais mostram isso. No Brasil a gente também tem essa representatividade muito grande. E quando a gente fala em tecnologia, não pode esquecer da humanização. Esse soft skills a gente encontra no feminino.
Qual é a sua mensagem para meninas e mulheres que estão decidindo o que fazer na carreira?
– Eu não só aconselho, mas também motivo e indico que mais mulheres optem pela carreira de tecnologia. É possível trabalhar em muitas áreas dentro da tecnologia, mas hoje a gente não consegue falar de processo de empresa alguma sem falar de tecnologia. Então, precisamos trazer mais mulheres, mais meninas para o setor de tecnologia. Isso faz total diferença. Hoje, nós temos um déficit. Temos empresas que buscam mulheres e não encontram.
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Então, para as próximas gerações a gente precisa estimular para que mais mulheres optem pela carreira de tecnologia. Elas podem e conseguem competir com qualquer homem, em qualquer organização. Basta querer. Temos muitas CTOs (Chief Technology Officer), isto é, diretoras de tecnologia. Quando você junta o conhecimento em tecnologia e a parte humana da mulher, a gente tem CTOs maravilhosas, executivas da área de tecnologia que fazem total diferença.

A senhora é considerada a maior investidora-anjo do Brasil. Tem gente que confunde o que é investidor-anjo?
– Darei um exemplo de como funciona para quem quer investir. Eu estou juntando aqui R$ 100 mil para investir em um negócio, eu darei R$ 50 mil e você R$ 50 mil, nós vamos investir juntas. Nós só teremos retorno deste dinheiro se a empresa na qual estamos apostando der certo. Não é empréstimo, se a empresa quebrar, nós perdemos o nosso dinheiro.
Por isso que venture capital é investimento de risco, é o mercado de capital de risco. E aí, com esse crescimento todo do investimento, eu comecei a ver investidores que falavam para o empreendedor: ‘olha, Claudia e eu vamos investir R$ 100 mil, só que no meu caso eu quero fazer umas cláusulas com você que, se por acaso você quebrar, você terá que me devolver o dinheiro de tal jeito ou, em vez de esperar a tua saída, você me devolve Selic mais 20%’. Isto não é investimento, é um empréstimo.
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O que precisamos fazer é somar a sua habilidade, somar a minha, e falar para o empreendedor o que nós podemos fazer por ele, abrir o mercado, montar uma plataforma, abrir portas em uma rádio, na TV, levar a empresas, a eventos, temos que ajudar a vender o produto. Este é o investimento anjo, é juntar o dinheiro com o nosso conhecimento com smart money para ajudar.
Por conta disso, eu vi que este mercado está crescendo e estamos tendo problemas. Além disso, percebi que não temos mulheres com lugar de fala. Quando eu entrei, por exemplo, éramos 2% de investidoras, já éramos poucas mulheres, eu era sozinha nos eventos, só eu de mulher, um monte de homens.
Quando eu comecei a vender as minhas empresas, pensei em começar a investir mais dinheiro, que eu quero conhecer as redes. Comecei a investir mesmo, investir, investir e investir, porque eu começava a fazer parte das redes, tinha voz.
Às vezes, o pessoal não quer você, quer o seu dinheiro, eles precisam do dinheiro, mas como eu era muito colaborativa, sou até hoje, as pessoas me adoram. Eu realmente contribuo, faço acontecer.
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Eu comecei a sentir falta demais da voz feminina, era algo visível para mim, e foi onde eu criei o meu podcast, o Ela Investe, onde eu fomento o empreendedorismo e a diversidade, eu falo com homens e com mulheres. Como tem um nome feminino, muitas pessoas pensam que eu falo só com mulheres, mas não é.
E posso garantir que é enorme a quantidade de mulheres e pessoas que se inspiram com o Ela Investe, um programa pelo qual eu não recebo nada, um projeto de apoio ao ecossistema. Inspira mulheres e muitos homens também.
Pode citar um exemplo?
– Entrevistei um executivo da KPMG e no dia seguinte ele me ligou e falou: ‘Cláudia, eu fiquei tão impactado de ter ido no teu programa que eu entrei numa reunião de uma das maiores usinas de açúcar da qual eu sou membro do conselho, olhei e vi que só tinha homens. Eu estou neste conselho há dois anos e eu nunca tinha percebido que é um conselho só de homens’.
Com esta consciência, quando entrou em pauta sugestões de melhorias para o próximo ciclo de conselho, este executivo colocou o tema diversidade para discussão, a necessidade de ter mulheres no conselho.
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Acharam que era piada dele, mas ele argumentou que não precisava ser uma mulher que falasse de açúcar, mas poderia ser uma mulher que entendesse de negócios, e que no Brasil eram muitas. Hoje, eles têm 30% de mulheres no conselho, e são gratos por terem participado do meu programa.
Conselhos mais diversos resultam em melhores desempenhos das empresas?
– É claro que melhora! Há 20 anos as mulheres lideram o mercado automobilístico. O cara vai comprar um carro, pergunta para a mulher, e isso acontece em várias indústrias, no varejo, as mulheres representam muito no varejo, quem vende e quem compra. No e-commerce no Brasil 85% a 90% quem compra são mulheres.
Os tickets médios dos homens são mais altos. O homem, por exemplo, quando vai comprar algo no mercado eletrônico, gasta mais. Se ele vai comprar uma camisa de um time, ou alguma coisa relevante, ele gasta mais, mas as mulheres compram, as mulheres movimentam os mercados, então hoje não dá para falar de montar uma empresa no varejo e não colocar uma mulher no conselho, entendeu?
Eu acredito muito que nós cresceremos em diversidade, não só falando de mulheres, e aí tem uma liderança feminina muito forte, mas eu trabalho diversidade como um todo.
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Ano passado, por exemplo, eu fui palestrar em Recife, em Salvador. Vale registrar que eu também não era palestrante. Imagina! Subir em um palco para mim era muito complicado, e eu tenho me desenvolvido muito sobre isto.
Mas só 5% dos investimentos-anjo está no nordeste, 85% estão nas regiões Sul e Sudeste. Pensei que estava complicado para mim. Criei um pacote que chama Café e Pitch, onde eu reúno de forma presencial 20 empreendedores, conheço o negócio deles, e indico eles para as redes que eu invisto. Não tenho dinheiro para investir em todo mundo, eu nem posso, eu coloquei um limite anual para investimentos.
Se eu vejo um negócio interessante em Salvador, ou em Recife, como eu vi, trago para as redes, para a Anjos. O que acontece é que se eu já validei, já conheci, gostei e até entrei junto. Nós precisamos trabalhar essa diversidade, o Brasil é gigante e é vergonhoso nós termos estes baixos percentuais de investimentos e de valorização dessas regiões.
O que a senhora prioriza nos investimentos que realiza?
– Eu coloquei como tese investir em negócios que tenham pelo menos uma mulher, até por conta do papel que eu faço de liderança feminina, mas a minha tese é que tenha pelo menos uma mulher como founder ou como acionista. A empresa precisa estar em operação, eu não invisto em ideias.
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Dentro do mercado de segmentos eu tenho alguns de agro, de techs e fintechs. Tenho investido também em travel techs, empresas do mercado de turismo.
Eu não tenho segmento específico, mas eu trago para dentro do meu portfólio algumas teses e alguns critérios que são mais voltados para o modelo de negócio. Se tiver uma boa ideia dentro de um segmento que tem a mulher na liderança eu particularmente gosto de investir e de apoiar.
Gostaria que falasse um pouco sobre a sua participação do programa Shark Tank, voltado a empreendedores?
– Eu fui convidada pela Sony para participar. O programa já está indo para a nona temporada, e nesta nona temporada eles resolveram trazer alguns convidados. Eu sou um deles. Participei de alguns episódios e de mais alguns para as próximas temporadas. O Shark Tank é um pouco diferente desse modelo de startups.
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Os modelos até entram em conflito, mas quando estamos falando do programa que analisando mundialmente tem maior audiência aqui no Brasil, e estamos falando que o brasileiro cria negócios o tempo todo, o programa é uma das maiores referências para a maior parte dos nossos empreendedores.
O Shark Tank fez o convite e eu aceitei, e acho que minha contribuição ali foi como investidora mesmo, entendendo dos negócios, do quanto que eu posso contribuir para o mercado Shark Tank, para o mercado de empreendedores como um todo.
O programa também dá visibilidade, sou uma mulher que conheça do mercado, empreendedorismo e que irá contribuir não é só como investidora, mas muito além disso.
Acho que a minha contribuição é para o mercado com todo e eu tenho visto isso pelos feedbacks que eu tenho recebido nas redes sociais. Tem muitos investidores que não assistiam Shark Tank e que agora dão audiência porque eu estou lá. Eles me dizem isso.
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Acho que eu trago uma nova referência ao programa e é isso que é importante. Quero apoiar, aproveitar esta fase do Shark Tank para que realmente eu possa trazer mais este tema de liderança feminina, para que as pessoas conheçam mais. Ter a visibilidade de um programa como este me traz também a oportunidade de mais pessoas conhecerem o meu trabalho.
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