Ainda Estou Aqui chegará à cerimônia do Oscar, na noite deste domingo (2), com as maiores chances de vitória do Brasil na história da premiação. O filme de Walter Salles é um sucesso de crítica, vem batendo recordes de bilheteria e trilhando uma bem-sucedida campanha nos Estados Unidos, que pode culminar na conquista de ao menos uma estatueta entre as três às quais concorre: Melhor Filme Internacional, Melhor Atriz, com Fernanda Torres, e Melhor Filme.

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O filme é um fenômeno. Jamais, na história do cinema brasileiro, um título conseguiu equilibrar sucesso de crítica e de público em proporções tão grandes. Ainda Estou Aqui estreou em setembro do ano passado levando o prêmio de Melhor Roteiro no Festival de Veneza. Depois, acumulou vitórias em premiações, como o Globo de Ouro, os Prêmios Goya e o Satellite Awards, além de indicações ao Critics Choice, ao Bafta e, claro, ao Oscar.

— As indicações ao Oscar, por si só, já são extraordinárias. O filme foi colocado para indicação a Melhor Filme Internacional, e o fato de ter sido indicado para Melhor Filme e Melhor Atriz, eu considero extremamente relevante. O Oscar é uma grande plataforma de visibilidade internacional — avalia o crítico de cinema Waldemar Dalenogare, membro do Critics Choice Association e especialista em Oscar.

Como Ainda Estou Aqui chegou tão longe?

Ainda Estou Aqui é o primeiro filme brasileiro indicado à categoria principal do Oscar, de Melhor Filme. Outras produções já haviam sido indicadas, mas nunca com tantas chances de vitória. Central do Brasil (2004), também dirigido por Walter Salles, foi indicado a Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz, com Fernanda Montenegro, mas amargou a derrota da veterana para Gwyneth Paltrow, por Shakespeare Apaixonado, vista até hoje como injusta pelos brasileiros.

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Em 2003, Cidade de Deus, de Fernando Meirelles, conquistou quatro indicações: Melhor Diretor, Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Fotografia e Melhor Edição. Nos anos seguintes, o Brasil foi representado no Oscar em categorias menores, como de Melhor Documentário, com Lixo Extraordinário (2010) e Democracia em Vertigem (2019), e Melhor Animação, com O Menino e o Mundo (2016).

De acordo com Waldemar Dalenogare, o diferencial de Ainda Estou Aqui em relação a outros filmes é a campanha internacional que Walter Salles e Fernanda Torres vêm fazendo.

— O Brasil teve vários problemas nos últimos 20 anos, especialmente quanto à forma de selecionar um filme para o Oscar. Deixava-se de lado, por exemplo, o peso e o impacto de uma campanha para o Oscar. A campanha precisa acontecer para que o votante nos Estados Unidos tenha acesso ao filme. E Ainda Estou Aqui fez todo um trabalho de base, de festivais e sessões comentadas que foi muito importante — diz.

Ainda Estou Aqui contou também com uma “forcinha” das redes sociais, onde os brasileiros tornaram Fernanda Torres em um fenômeno de engajamento.

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— É forte termos uma mulher como Fernanda Torres representando o filme nessa campanha. Carismática, divertida e muito sagaz, ela tem contribuído para o despertar do orgulho nacional aqui dentro e para fortalecer a imagem do país no exterior. É o que também chamam de “soft power”, essa influência cultural — pontua a cineasta Cíntia Domit Bittar, integrante da comissão da Academia Brasileira de Cinema que escolheu Ainda Estou Aqui para representar o Brasil no Oscar.

Saiba mais sobre a campanha de Ainda Estou Aqui no Oscar

Os números do sucesso

Tamanho sucesso internacional foi reverberando na bilheteria. Já são mais de R$ 100 milhões em arrecadação no Brasil, o melhor desempenho de um filme nacional desde a pandemia. Em muitos cinemas, Ainda Estou Aqui está há 16 semanas consecutivas em cartaz — batendo recorde de tempo em exibição em três estabelecimentos de Florianópolis.

Em Santa Catarina, o filme já arrecadou mais de R$ 3,7 milhões desde a estreia nacional, em 7 de novembro do ano passado, o que faz dele a terceira maior bilheteria de um filme nacional no Estado desde 2001. Enquanto filmes de comédia e temática religiosa dominam o top 20 das bilheterias nacionais, Ainda Estou Aqui se destaca como o único drama na lista.

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Diferentemente do que costuma acontecer com outros filmes, que têm um pico de espectadores na estreia e depois vão decaindo, o longa de Walter Salles vem conseguindo manter o interesse do público ao longo das semanas, com a vitória no Globo de Ouro e as indicações ao Oscar. Mais recentemente, a bilheteria do filme teve um impulso durante a promoção Semana do Cinema, que ofereceu ingressos a R$ 10 em todo o país.

Ainda Estou Aqui se tornou o assunto do dia. Quando você tem algo assim, pessoas que não iam ao cinema passam a frequentar as salas para não ficar de fora das conversas — explica Marcos Barros, presidente da Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas (Abraplex).

O segredo talvez esteja na forte identificação que o filme promove entre o espectador e a cultura brasileira. Ao abordar de forma sensível um tema latente para a sociedade brasileira — a ditadura militar — o longa consegue dialogar com um público diverso, gerando reconhecimento. A repercussão internacional é a “cereja do bolo”, ajudando a consolidar no filme uma representação da identidade brasileira.

Na opinião do cineasta catarinense Zeca Pires, o filme já é um marco para o cinema brasileiro:

— O principal de tudo é a história do filme. É uma história que precisa ser recontada e lembrada. Hoje em dia, muitas pessoas defendem a ditadura sem saber o que é uma ditadura. E o filme não deixa esquecer disso.

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Na trilha para o impacto duradouro

Com Ainda Estou Aqui, o cinema nacional e também catarinense vive um momento próspero, com reconhecimento internacional e muitas produções em andamento, de acordo com a cineasta Cíntia Bittar. 

— O sucesso mundial do filme gera um impacto enorme no país, cultural, social e econômico, além de fortalecer o senso de pertencimento do povo brasilerio, que voltou a torcer pelo nosso cinema. Esse resgate é importantíssimo, pois vivemos agora um processo de retomada após passarmos por anos difíceis — pontua ela, que também é sócia da produtora catarinense Novelo Filmes.

É importante, no entanto, que o filme não seja um caso isolado. Para o crítico Waldemar Dalenogare, a principal lição deixada por Ainda Estou Aqui é a campanha de divulgação. Mas, conforme ele, mesmo que não haja vitória no Oscar, a visibilidade atual já ajuda a criar mais projetos de coprodução envolvendo o cinema brasileiro, e maior interesse pelo cinema nacional mundo afora.

— Se Ainda Estou Aqui ganhar um Oscar, é histórico. Porque seria o primeiro prêmio do Brasil, seja Melhor Filme, Melhor Filme Internacional ou Melhor Atriz. Seria uma grande celebração ao nosso cinema, que é um cinema que merece essa repercussão — pontua o crítico.

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