O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta segunda-feira (9) os interrogatórios dos oito réus do chamado “núcleo 1” da tentativa de golpe em 2022. O primeiro a ser ouvido foi Mauro Cid, cujo depoimento teve início por volta das 14h. Após mais de quatro horas de interrogatório, foi a vez do deputado federal (PL-RJ) Alexandre Ramagem responder as perguntas. Os outros réus serão interrogados em ordem alfabética, até sexta-feira (13), a depender do tempo necessário para ouvir cada um dos oito réus. Jair Bolsonaro (PL) é o sexto da lista.

Continua depois da publicidade

As falas serão transmitidas ao vivo pela TV Justiça e pelo canal do YouTube do STF. Caso os interrogatórios não sejam concluídos no primeiro dia, outras quatro sessões também foram marcadas para acontecerem nas seguintes datas: 10/6, às 9h; 11/6, às 8h; 12/6, às 9h e 13/6, às 9h.

Acompanhe a transmissão

Veja a ordem do interrogatório

  • Mauro Cid, delator e ex-ajudante de ordens da Presidência;
  • Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin);
  • Almir Garnier Santos, ex-comandante da Marinha;
  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança do Distrito Federal;
  • General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional;
  • Jair Bolsonaro, ex-presidente da Reública;
  • Paulo Sérgio Nogueira, ex-ministro da Defesa;
  • Walter Souza Braga Neto, ex-ministro da Casa Civil.

O que pesa contra os réus

Segundo a Procuradoria-Geral da República (PGR), Bolsonaro comandou o “núcleo crucial” da organização que agiu para romper a democracia. Ele é acusado de disseminar ataques ao sistema eleitoral, pressionar militares a apoiarem o golpe e editar um decreto para intervir no TSE. Há ainda indícios de que ele sabia do plano “Punhal Verde Amarelo”, que previa o assassinato de autoridades.

Continua depois da publicidade

Os outros sete réus são acusados de auxiliar na conspiração. Entre as condutas, estão fraudes eleitorais, bloqueios de estradas para prejudicar eleitores e elaboração de documentos golpistas. Os crimes atribuídos ao grupo incluem tentativa de golpe, organização criminosa e dano ao patrimônio público.

Mauro Cid foi o primeiro a ser interrogado

O delator e ex-ajudante de ordens da Presidência, Mauro Cid, foi o primeiro a ser interrogado pelo ministro Alexandre de Moraes. No interrogatório, ele confirmou que “presenciou grande parte dos fatos, mas não participou deles”, em relação à acusação da PGR contra os réus sobre a trama golpista em 2022.

Cid confirmou que fechou uma delação premiada com a Polícia Federal por vontade própria, e negou ter passado por qualquer tipo de coação que pudesse influenciar a delação premiada. Ele também confirmou os relatos de depoimentos já concedidos anteriores.

A existência de um documento que continha uma previsão sobre a prisão de autoridades do STF e do Legislativo também foi confirmada por Cid. O ex-presidente Jair Bolsonaro, segundo o delator, leu o documento, mas teria “enxugado” o texto, “retirando as autoridades das prisões”, deixando apenas a prisão de Alexandre de Moraes como alvo principal.

Continua depois da publicidade

Uma comissão eleitoral para “conduzir uma nova eleição” também estava como proposta no documento. Porém, Mauro Cid deixou claro que não se ateve “muito aos detalhes do documento”, mas que o documento, dividido em duas partes, foi apresentado em “no máximo três reuniões” a Jair Bolsonaro.

A primeira parte se referia às possíveis interferências do STF e do TSE no governo de Bolsonaro e nas eleições. A segunda parte se tratava de uma abordagem jurídica, sobre Estado de defesa, Estado de sítio, e prisão de autoridades.

Cid também confirmou que Bolsonaro pressionou o então ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira sobre relatório das urnas eletrônicas que já estava pronto após as eleições. Antes de Paulo Sérgio entregar o relatório ao Tribunal Superior Eleitoral, Bolsonaro o pressionou e ele acabou desmarcando a reunião, segundo Cid.

Outro ponto informado por CID foi que o general Walter Souza Braga Netto fazia um papel de “elo” entre Bolsonaro e os acampamentos montados em frente aos quartéis generais. No interrogatório, Mauro Cid também confirmou que recebeu do major Rafael de Oliveira, que participava dos chamados kids pretos — militares das Forças Especiais do Exército, um documento com planejamento para monitorar o ministro Alexandre de Moraes. 

Continua depois da publicidade

Ainda em relação ao grupo kids pretos, Cid confirmou que entregou à Rafael uma caixa de vinho com dinheiro, à mando de Braga Netto.

— Depois, o espaço temporal eu não me recordo, o general Braga Netto trouxe uma quantia em dinheiro, que eu não sei precisar quanto foi. Mas com certeza não foi R$ 100 mil, até pelo volume, não era tanto, que foi passado para o major de Oliveira, no próprio Alvorada — explicou.

O ministro Luiz Fux também interrogou Cid e pediu para que o delator dissesse se mantinha contato com manifestantes dos acampamentos. Ele respondeu que o “miolo” do Palácio do Planalto não tinha contato com os organizadores dos acampamentos. Quando perguntado pelo Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, Cid disse que havia uma pressão para que Bolsonaro assinasse um decreto para concretizar o golpe. Segundo Cid, o general Estevam Cals Theóphilo o informou que o “Exército iria cumprir” a ordem caso o ex-presidente assinasse a minuta do decreto golpista.

Cid afirmou que nunca tomou conhecimento do plano “Punhal Verde e Amarelo”, e que só soube depois, no dia da prisão dos militares suspeitos de envolvimento no plano que previa o assassinato do presidente Lula, do vice-presidente Geraldo Alckimin e do ministro Moraes.

Continua depois da publicidade

Em relação às conversas sobre uma possível intervenção militar, Cid disse que esse assunto começou a ser discutido após o segundo turno das eleições e que, antes disso, “as Forças Armadas nunca deram bola”. O delator também confirmou que o Bolsonaro e Braga Netto esperavam fraude nas urnas. Além disso, também confirmou um plano de fuga do ex-presidente pautado em um documento.

Depois de três horas de interrogatório, a sessão foi interrompida às 16h e retomada por volta das 17h15.

Na segunda parte da sessão, foi a vez das defesas dos demais interrogados questionarem Cid. A defesa de Bolsonaro, o advogado Celso Vilardi, questionou Cid sobre a função de ajudante de ordem. A resposta de Cid foi de que havia três outros ajudantes oficiais abaixo dele, “um da Marinha, um do Exército e um da Aeronáutica”, em que ele “era o chefe”.

A defesa de Bolsonaro também perguntou se Cid sabia dos acontecimentos do 8 de janeiro antes dos fatos, mas o delator disse que ele não teve “nenhuma informação antecipada”. Mauro Cid também detalhou o que foi dito sobre o ministro Moraes em uma reunião no salão de festas em Brasílias.

Continua depois da publicidade

— O senhor [Moraes] foi muito criticado. As mesmas críticas, xingamentos, passavam por ali, até porque era uma conversa de bar. Tinha xingamentos […] Tinha figurinhas, memes, com esse grau de informalidade — disse.

Outro ponto perguntado por Vilard foi sobre o que Bolsonaro falava em relação à mobilização ou desmobilização dos acampados. Cid disse que o ex-presidente dizia que “não fui eu quem chamou eles aqui, também não vou mandar ir embora”.

José Luis de Oliveira Lima, advogado de Braga Netto, perguntou o porquê Cid demorou tanto para contar que recebeu dinheiro do general em uma caixa de vinho. O delator disse que, para ele, o dinheiro estava “dentro de um contexto de uma manifestação dentro do que o Exército aceitava”.

— Naquele contexto, nas manifestações em frente aos quartéis, não vou dizer que não vi nada demais, mas como foi pedido ajuda, tentei conseguir de alguma forma. Não vi algo de hipótese criminal — explicou.

Continua depois da publicidade

O depoimento de Cid foi encerrado depois de pouco mais de 4h.

Alexandre Ramagem foi o segundo interrogado

O deputado federal Alexandre Ramagem e ex-diretor da Abin é acusado de ter usado a estrutura da Abin para monitorar de forma ilegal autoridades e produzir relatórios paralelos em apoio à estratégia golpista. 

Moraes questionou Ramagem sobre as críticas feitas ao sistema eleitoral encontradas em anotações. Ele disse que as anotações não são documentos oficiais, mas palavras elaboradas em discussões públicas no Congresso Nacional, como a PEC do voto impresso. Ele destacou, ainda, que o governo Bolsonaro trabalhou para que se fosse implementado o voto impresso auditável, mas que “foi uma derrota”.

— O governo Bolsonaro estava tentando, era um pleito do governo que se passasse o voto impresso auditável. Foi uma derrota. Depois dessa derrota, não há mais nenhuma anotação privada privada, discussão pública, não há nenhum momento em que eu tenha tocado no assunto das urnas eletrônicas — disse.

Sobre as eleições, Ramagem ainda disse que não há prova de fraudes nas urnas. O deputado também disse que não atuou para disseminar desinformação sobre as eleições, mas que um vídeo compartilhado com Bolsonaro mostrava peritos criminais fazendo testes de segurança sem edição.

Continua depois da publicidade

— É um vídeo de mais de dez minutos, que mostra a constante evolução dos testes de segurança. Não era algo contra as urnas, mas uma exposição técnica, feita em audiência pública no STF — explicou.

Um arquivo encontrado no computador de Ramagem, intitulado “Bom dia presidente”, sobre a criação de grupo com o objetivo de falar sobre a urna eletrônica, também foi alvo de perguntas de Moraes.

O ex-diretor da Abin falou que o grupo foi criado para “discutir a viabilidade da participação da Abin no Teste Público de Segurança (TPS)”, mas não foi à frente. Além disso, Ramagem também negou que tenha monitorado qualquer autoridade pela Abin.

O depoimento foi encerrado pouco antes das 20h. A sessão será retomada às 9h nesta terça-feira.

*Com informações de O Globo, g1 e UOL.

Leia também

Haddad anuncia aumento na arrecadação dos cofres públicos para “recalibrar” decreto do IOF

Continua depois da publicidade